Lisboa – Uma autêntica vergonha para a justiça angolana, o que se passou em plena sala de audiências do Tribunal Provincial de Luanda – TPL, no passado dia 04 de Março de 2016, em mais uma audiência do caso Jorge Valério. Depois de 3 adiamentos, a audiência deveria servir para serem lidas as respostas aos quesitos, seguida da leitura da sentença final sobre este caso. Aconteceu porém, que dois dos réus deste processo (Manuel Mayala e Manuel Bravo) se encontravam doentes e internados em hospital, e como tal, não poderiam estar presentes na referida audiência. Nestes casos, a lei proíbe expressamente que se realize a sessão. O que aconteceu a seguir, foi uma autêntica cena de malabarismos da parte dos Juízes e Procuradora, tentando forçar a leitura de uma sentença, que se presume encomendada.

Fonte: Club-k.net

CASO JORGE VALÉRIO: VERGONHA DA JUSTIÇA

Eis a história: Marcada para as 10 horas da manhã, o colectivo de juízes (Milekamena João, Adelino Yange e Eduardo Samuco) só entrou para a sala de audiências quando eram 15 horas da tarde. Segundo justificação apresentada pelo Juiz Milekamena, o atraso deveu­se ao facto de inicialmente dois dos réus estarem doentes e não poderem comparecer, sendo que quando eram 14 horas chegou ao tribunal, debilitado e visivelmente perturbado o réu Mayala. Mas o réu Manuel Bravo não poderia mesmo comparecer porque estava internado e sob soro. Mesmo assim, Milekamena declarou aberta a audiência, e pretendia prosseguir com o julgamento. Imediatamente os advogados presentes protestaram, alertando o meritíssimo juiz de que estaria ele a violar a lei, pois que o n.o 8. do art.o 98o e ainda o art.o 419.o do código de processo penal proíbem que se realize a audiência sem a presença de algum dos réus, pelo que solicitaram que a mesma fosse adiada. Pretendendo forçar a realização da sessão, Milekamena enviou a sua viatura particular até ao hospital onde se encontrava o réu, com o objectivo de traze­lo até ao tribunal, o que só não se efectivou porque o hospital não autorizou a saída do réu nas condições em que se encontrava. De volta ao tribunal, a equipa enviada pelo juiz Milekamena apresentou o relatório médico que atestava a impossibilidade de retirada do réu, e este juiz ainda assim ordenou que a sessão continuasse, e socorrendo­se da ajuda da procuradora Yemanjá Videira, pretendiam escudar­se no art.o 567o do mesmo código. Mais uma vez a equipa de advogados interveio, lembrando ao juiz de que a violação que o mesmo pretendia efectuar constituía uma nulidade absoluta e que iria originar uma anulação de todo o processo, lembrando que o art.o 567o regula o julgamento de réus à revelia, isto é, ausentes, que nunca se fizeram presentes em tribunal, o que não era o caso, pois o réu sempre esteve presente em todas as sessões, apenas naquela não podia comparecer por estar hospitalizado, e lembrando ainda que tal comportamento dos juízes constituía uma clara violação dos direitos humanos protegidos pela Constituição.

 

De imediato o juiz Samuco (nome que na língua nacional umbundu significa “Rato Grande”), vendo contrariada a sua vontade, passou para o insulto aos advogados e chamando­os de “burros”, dizendo que “vocês pensam que sabem tudo, mas não sabem nada de direito”. Tiveram de passar 9 horas depois da hora marcada, para que o colectivo de juízes reconhecesse a ilegalidade em que se iriam meter, para finalmente, quando eram cerca das 20 horas da noite, decidirem­se pelo adiamento da sessão, marcando uma outra para a próxima quarta­feira, dia 09. Ora, aí é que reside o problema: E se o réu nessa data ainda continuar em doença? O que fará o juiz? Vai acatar a lei e adiar novamente, ou irá usar de “trungungo” e mandar a lei às urtigas?

A OUTRA HISTÓRIA POR DETRÁS DA HISTÓRIA

Fontes bem credenciadas, informam que a leitura forçada do acórdão que os juízes pretenderam fazer na passada sexta­feira, nada é senão o cumprimento de orientações do “Sr. Ordens Superiores”, dando a conhecer que o destino dos réus deste processo, poderá ter sido traçado, não a partir das provas produzidas durante 5 meses de julgamento, mas a partir de manobras de bastidores que infelizmente ainda imperam na nossa justiça. De acordo com uma fonte bem posicionada no TPL, que por temer retaliações preferiu manter o anonimato, durante a produção da prova, isto é, durante todo o julgamento, a procuradora Yemanjá viu cair cada uma das acusações que proferiu contra os réus, pois que não se conseguiu nenhuma prova que teriam sido aqueles réus os executores do jovem Jorge Valério, nem de que teria sido a sua ex­namorada a mandante do crime. As defesas apresentaram uma sólida base de evidências que demonstraram em tribunal que o processo apresentado pela DNIC e Ministério Público era uma autêntica farsa. Foi apresentado pelas defesas um vídeo no qual se vê nitidamente que os referidos réus não conheciam os pormenores de como o crime teria ocorrido e onde estavam a ser instruídos por oficiais da DNIC do que teriam de dizer, e ainda o pai de Jorge Valério fazia uma acusação frontal ao General Ngongo. Foi também apresentado um relatório do Laboratório Nacional de Criminalística da Polícia Nacional, que comprova que foram encontradas impressões digitais no local do crime, algumas ensanguentadas com sangue, e que não correspondiam com as impressões dos réus que estão a ser julgados, muito menos com as impressões digitais da vítima. Assim se pergunta: De quem seriam então as ditas impressões? Quem esteve no local a cometer o crime e que não foi presente ao tribunal? A defesa provou ainda que um suposto encontro ocorrido um dia antes do crime no colégio Elizangela Filomena entre a ex­namorada de Jorge Valério e os réus apresentados, não passou de uma pura invenção da acusação, pois nesse dia e nessa hora o motorista daquela estava noutro ponto da cidade.

“Rato” escondido com a cauda de fora

Perante todas estas evidências, o juiz da causa Dr. Milekamena, concluiu que aqueles réus seriam todos inocentes e decidiu pela sua absolvição. Após a elaboração do acórdão que absolvia os réus, foi marcada a data de 17 de Fevereiro para a leitura da sentença. Um dia antes, isto é a 16/02/2016, o mesmo chamou os seus juízes assessores (Yange e Samuco), dando­lhes a conhecer a sua decisão. Numa atitude nunca antes vista e que o mesmo juiz considerou de golpe palaciano, os assessores, recusando­se a assinar o referido acórdão, apresentaram­lhe um outro acórdão elaborado por eles em que se condenavam os réus que o juiz da causa considerava inocentes. Imediatamente, o juiz da causa lembrou a Samuco e Yange que tal comportamento constituía uma grave infracção e violação do código deontológico da magistratura judicial, passível de procedimento disciplinar, pois sendo eles meros assessores, não tinham competência para tomar a decisão da causa e elaborar o acórdão, função exclusivamente reservada a si, pelo que se despoletou uma acesa discussão entre o Juiz Milekamena e o seu assessor Yange, que só não terminou em pugilato porque houve a pronta intervenção dos funcionários do cartório, que apercebendo­se do tumulto acorreram à sala do juiz, impedindo assim que os dois chegassem a vias de facto. Samuco e Yange tentavam forçar o juiz Milekamena que aceitasse um acórdão a condenar os réus, porque eles precisavam dessa decisão para receberem uma promoção que esperam para o Tribunal da Relação, que nos próximos dias será instituído.

Segundo a nossa fonte, com a recusa de Milekamena em ceder aos intentos dos seus assessores, a partir dessa data, começaram a chover sobre o mesmo diversas pressões, no sentido de rectificar a sua decisão no sentido condenatório. Até que por último, para quebrar a posição de Milekamena, lhe foi oferecido o cargo de Presidente do Tribunal Provincial de Luanda, que se encontra vago há cerca de 12 dias, por nomeação do anterior presidente como juiz conselheiro do Tribunal Supremo. Foi a gota de água. Milekamena cedeu, e aceitou assinar o acórdão elaborado pelos seus assessores.

Afinal, parece que Raúl Araújo estava cheio de razão, quando há alguns anos afirmou que no TPL as sentenças eram encomendadas. E será esta a justiça de que o país precisa? Condenarem­se inocentes e mandá­los por anos e anos para a cadeia, porque alguns indivíduos, investidos nas funções de juízes, têm ambições desmedidas de subirem na vida a qualquer custo? A custo da injustiça? Até quando?

Esta matéria será ainda desenvolvida nos próximos dias, com a publicação de documentos e áudios que comprometem os referidos juízes.