O sistema colonial português introduzira na economia formal uma percentagem altamente significativa da economia informal africana, com estruturas, familiares a maior parte delas, dirigidas por mestiços e negros Angolanos, recuperando, na década de 60 do século XX a inserção das elites negras, mestiças e brancas africanas, no modelo económico e social dominante, o que tinha sido anulado pelo modelo corporativista de Salazar que tudo fizera para anular a influencia, dominante quase, dos Angolenses na economia e na sociedade Angolana até aos anos 20 do século XX.

O conflito americano – soviético de controlo do mundo, entretanto, conduziu à erradicação não só dos portugueses de Angola, como também dos Angolenses de elite, negros, mestiços e brancos africanos.

E, neste processo, a economia Angolana destruiu-se

Angola era uma economia Sustentada, mas com uma elite que, em parte importante, não o era por não ser Angolana, o que originou uma economia sustentada no seio de uma sociedade erradamente estruturada.

Assim, a posse, na economia, ao não ser Angolana, foi a razão da falência do Modelo Angolano de origem portuguesa, sendo no entanto certo que este Modelo esteve prestes a ser adequado a um Desenvolvimento Sustentado, não fora a anulação das elites Angolenses imposta pelo regime de Salazar.

O processo que conduziu à Independência, estruturado de fora, pelos conflitos soviéticos e americanos, que erradicaram de Angola os interesses portugueses, (aí totalmente inexistentes entre 1975 e 1985, a não ser enquanto intermediário, via PCP, da União Soviética), não anulou a base social Angolana, ainda que centrada em um bloco sociopolítico, o MPLA, no Poder, e um outro fora do Poder, a UNITA.

Foram estas bases sociais Angolanas que, conflituando, estruturaram a Angola de hoje, com dois exércitos, as FAPLA/FAA e as FALA, (e note-se que o exercito é sempre uma estrutura que tradicionalmente agrega as nações), que ao comporem-se das múltiplas etnias angolanas, recompuseram o tecido social e cultural de Angola.

A economia Angolana hoje não é uma economia sustentada – entre outras razões porque vive quase que somente, ainda, de 2 produtos, o petróleo e os diamantes. No entanto a sociedade Angolana é já uma sociedade estruturada e portanto com potencial para gerar uma economia sustentada. Alteraram-se portanto as premissas.

E como as Pessoas são a base da economia, hoje, Angola tem um potencial maior que na década de sessenta do século XX para gerar um Desenvolvimento Sustentável para si e para os seus.

Neste contexto, Geldof não tem, portanto, razão. E quem não lhe dá razão são os 6 anos de Paz, gerados pelo Memorando de Entendimento de 2002, pois nestes 6 anos a economia Angolana não se tem limitado ao estrito aproveitamento dos dois produtos atrás mencionados, ainda que os tenha aproveitado para se recompor da Guerra Civil, ainda que continuem a predominar estruturações erradas da elite dominante, por onde passa também a corrupção.

No entanto, na verdade, perante impasses impostos pelo FMI e pelo Banco Mundial, perante o esquecer, pelos EUA mas também pela União Europeia, da Conferência de Doadores, elemento central dos Acordos de Lusaka e do Memorando de Entendimento, o Governo de Angola procurou, e encontrou, alternativas para um crescimento com sustentabilidade – a aliança com a República Popular da China e o essencial empréstimo por esta feita para a recuperação das infraestruturas de Angola.

Não foi portanto por ignorância, bem pelo contrário, que Geldof acentuou a potencial capacidade de influencia das elites Angolanas na Republica Popular da China, imediatamente antes de, na sua intervenção, atacar estas mesmas elites de Angola.

As elites Angolanas têm tido uma significativa capacidade de gestão dos seus interesses, e inclusivamente no contexto do interesse nacional.

No entanto, têm cometido sistematicamente  um mesmo erro  - o de não gerarem processos de Redistribuição eficaz da Riqueza.

No plano da economia formal, já que no contexto da economia informal a situação ser um pouco diferente.

Erro que se sustenta no controlo, pré democrático, do Estado Angolano.

Geldof foi, assumidamente ou não, não interessa, o porta voz dos interesses da aliança anglosaxónica, americana e inglesa, que se sente lesada pela “via chinesa” das elites angolanas e a Conferencia do BES serviu somente de palco, mais um, para um arreganhar dos dentes destes interesses, que não se vêem reflectidos suficientemente naquela Região de África, (a questão do Zimbabwe é somente mais um exemplo).

No meio, mais uma vez, por inequívoca ingenuidade, de novo foram atacados os interesses portugueses. (Mas quem se lembra, sem estudar os impactos possíveis, de convidar um anglófono, para uma Conferencia sobre o Desenvolvimento Sustentado?)

Enfim e para sintetizar Angola nada perdeu com esta Conferência, (nem sequer as elites angolanas), pois a critica ao Modelo que se constrói em Angola, não só tem de ser feita, como, sobretudo, só essa critica fará recordar às elites de Angola, e, a prazo, elas só ganharão com esta critica, a importância da Redistribuição da Riqueza e da necessidade da Democracia em Angola.

E, nesta matéria, Geldof e a Conferência do BES, foram úteis, mesmo que o tenham sido, diversamente, feitos por más razões.


* Joffre Justino
Fonte:
www.epar.pt