Luanda - Reza a história contemporânea, que a Igreja de Nossa Senhora do Carmo, pertenceu ao convento de Santa Teresa dos religiosos carmelitas descalços, ordem reformada em fins do século XVI, por Santa Teresa e S. João da Cruz, por superior desígnio da rainha D. Luísa de Gusmão, regente e governadora do Reino (656- 62). Na menor idade de D. Afonso VI, trouxeram os carmelitas o seu ministério apostólico à Angla, vindo acontecer precisamente a 28 de Setembro de 1650, no governo dum dos heróis de Ilíada da campanha libertadora pernambucana, João Fernando Viera (1658-61). Segundo rezam alguns documentos da época, estes vieram sob protecção das cartas régias de 07 de Janeiro daquele ano.

O fundador, o primeiro superior da comunidade, o Frei Gregório de Santa Teresa natural do Concelho de Montemor – o Velho, professor do convento de Lisboa, e os seus, vieram cá fundar o Convento de Luanda para quando pudessem sair das Missões pelo Sertão angolano, segundo as intenções régias da altura.  


O estudo sobre à igreja de Nossa Senhora do Carmo foi incluído no nº 716, de 29 de Outubro de 1947, oferece particular interesse pelo facto de reunir e condensar quanto se conhece sobre a historia daquele venerando monumento justamente classificado de património “ Nacional” por portaria nº 2:517, de 18 de Julho de 1945. Desta paróquia do resta de modesto, mas digamos que tão típico e carismático Convento de Santa Teresa a ela anexo, e que o então Gabinete de Urbanização Ultramarino, projectou e delineou um novo plano de urbanização desta antiga e que já foi nobre cidade de Luanda.


Consta que em Janeiro de 1660, teve inicio a feitura do convento e Igreja nos arrabaldes das Ingombotas, um vocábulo de fundo Kimbundu e terminação aportuguesada. O Governador, consoante recomendação da Rainha, fez um doação do material para construção do chão, por provisão de 03 de Julho do mesmo ano, ainda para construção da cerca conventual contou-se com ajuda das esmolas dos moradores e assistida pela Fazenda Real na execução das obras.


A igreja conventual do Carmo ou Nossa Senhora do Monte Carmelo, foi concluída em 1689, e a sua sacristia foi construída em 1691, foi naquele local onde começou a funcionar mesmo antes do termino da sua obra, a irmandade de Nossa Senhora do Monte do Carmo, e que fez uma grande festa para solenizar canonização de S. João da Cruz, carmelita reformador da Ordem, com a Teresa, com muitos gastos dos mordomos e fies devotos, segundo António Cadornega.


Em 1694, a construção do Carmo estava muito arruinada, a maior parte do convento foi destruída durante o governo do oficial da marinha José  Xavier Bressane Leite (1842 –43) quando este governador  tentou mudar a capital de Benguela para o porto do Lobito, considerando o edifício arruinado a fim de aproveitar a cantaria e madeiras para aquele empreendimento.

A Igreja, é a mesma da primitiva construção monástica, uma nave, altar da abside, capela transeptal, lado do evangelho, mais dois altares, tudo de traça coeva da fundação, com as colunas de torcidos, alvenaria de arquitectura religiosa seiscentista de Luanda, como se encontra na ermida da Nazaré e restos e da paroquia da Ilha do Cabo, construída na mesma época.


Algumas das singulares características visíveis, ainda na paróquia do Carmo são os azulejos azuis e branco, cores predominantes no século XVIII, formando um friso com festões e ramagens, ao fundo das paredes, que forra toda a frente do arco cruzeiro e os dois lados do presbítero, a protecção da Virgem à Ordem do Carmo, o sonho do profeta Elias, quando fugia e o Anjo lhe pão, Elias arrebatado do céu num turbilhão de chamas, sobre um carro de fogo, na capela – mor, a glorificação dos carmelitas Santa Teresa e S. João da Cruz, o socorro da Senhora às almas do purgatório.


No tecto apainelado, as pinturas recordam-nos o êxtase místico de S. João da Cruz, a transve-beração de Santa Teresa de Jesus, o triunfo do profeta Elias sobre os inimigos da Virgem Maria, uma alusão quase que imperceptível, a Nossa Senhora do Carmo na abobada da capela – mor.


Sobre uma porta lateral, ostenta-se uma tela de óleo, que representa à entrega das regras da ordem terceira por Francisco de Assis, fundador da Ordem dos franciscanos frades menores. Acima do trono, eleva-se a graciosa imagem da padroeira, Nossa Senhora do Monte Carmelo ou do Carmo, esta paróquia passou a ser filial da antiga Sé Catedral a Igreja dos Remédios em Novembro de 1834.


Aquando da reforma da divisão paroquial de Luanda, promovida por D. António José Gomes (1901-1904) executada pelo sucessor, D. António Barbosa Leão, a nova paroquia canonicamente erecta por provisão de 20 de Dezembro de 1906, não foi para a ermida da Nazaré, como havia sido em passados se pensara, mas instalou-se nesta Igreja conventual, de acordo com as sugestões e pedidos do povo, com a mesma inovação de Nossa Senhora do Carmo. A jurisdição paroquial ficou abrangida pelas áreas dos bairros onde principalmente se aglomerava a população africana, desmembrados para esse efeito dos Remédios e uma parte da Conceição, importa realçar que hoje o Carmo pertence a vigaria da Conceição.             


A última obra importante feita naquela paróquia foi em 1931, a 19 de Julho por ocasião da festa da padroeira, deu-se o deplorável desabamento do coro superior, no meio de grande pânico da assistência, providencialmente sem lamentáveis desastres pessoais. Por baixo estava pintado um quadro extraordinário do transito de Santa Teresa de Jesus – muito bem conservado, das pinturas mais perfeitas do templo, parecia acabado de fresco, voltada para a porta onde estava gravada a data de 1742, mais que infelizmente desapareceu tamanha preciosidade.


EPIGRÁFIA RELIGIOSA DO CARMO


Há  no santuário do Carmo duas lapides sepulcrais brasonicas, em mármore, no corpo da igreja junto do arco cruzeiro, foi sepultado o bispo da diocese D. Frei António do Espírito Santo (1672 -74), carmelita descalço, o primeiro bispo que veio para Angola depois da restauração e da grande vacância episcopal que se seguiu ao falecimento do bispo Soveral, na vila de Massangano, em 05 de Janeiro de 1642, de resto foi um varão muito ilustrado, digno de piedosa memoria.


A lapide está encimada pelo brasão do prelado, bipartido, mostrando dum lado o escudo carmelitano e do outro uma representação simbólica com uma capela e duas estrelas ao alto, o bispo eleito pelo poder temporal, o Frei Francisco de Santo Tomás, repousa sob a mesma tampa sepulcral, consoante a afirmação do citado catalogo do cónego Manuel Patrício: “ foi sepultado na Igreja do Carmo na mesma sepultura onde há 88 anos se havia enterrado o bispo D. Frei António do Espírito Santo”. 


Este prelado era um religioso dominicano, grande letrado na sua ordem, e foi baptizado em Lisboa em 1695, onde tinha nascido no mesmo ano, teve provisão em 1749, de qualificador da inquisição em Portugal e de deputado em 1749.
 


Existe ainda nesta Igreja, outra lapide brasonada, do lado de fora da porta de comunicação do deambulatório claustral para o templo, nada se pode ler hoje, da inscrição que a mesma continha e que se gastou completamente em razão do uso do local onde a pedra foi colocada, apenas se divisam a encimar a campa tumular, uns restos de armas com escudo, cujos emblemas hieráticos já mal se percebem (um castelo, pinheiros ou outras árvores). Por timbre, sobre o elmo, parece ver-se a figura do dragão. Assim sendo, não se sabe de que ilustre personagem pertenceu o sarcófago.
 


   CURIOSIDADES 


Existe na Biblioteca Pública de Évora uma tela com a seguinte legenda ao fundo:

“O EX. mo  e RV. mo Sr. D. Frei António do Espírito Santo, Carmelita descalço lente de teologia, prior no colégio de Viana e no convento dos Remédios, definidor geral e havendo dado à luz várias obras de moral. Foi eleito bispo de Angola em 1672, sagrado em Lisboa em 1673. jaz na capela – mor do convento de Angola”.             


Consta que em 1968, um dos muitos rapazes que frequentemente costumava brincar na  Igreja, e depois foi viver para Portugal levou o menino que sempre esteve no colo da sua santa mãe, no caso concreto, a padroeira  de Nossa Senhora do Carmo, facto curioso é que depois de quarenta anos isto em 2008, o menino filho da Nossa Senhora, retornou ao seu pouso, tudo porque o rapazito da época, hoje um senhor que sempre se recusou em fazer a devolução do menino a sua mãe, por vias de circunstancias, o mesmo,  encontrava-se adoentado e a sua irmã conseguiu, trazer de volta o menino no seio de Nossa Senhora do Carmo, não podemos negar que apesar do condão egoístico por parte daquele menino, este tinha um valor simbólico e afectivo para o rapaz de ontem e hoje um senhor, aquele menino era seguramente, uma das marcas mais perenes da sua meninice. Mais perguntamos nós, será que nossa senhora de tanto lamentar a ausência do seu filho operou um milagre?


Hoje graças a Deus, foi reposta a normalidade, foi dado a César o que é de facto de César, aquele menino, que ao fim de quarenta anos, esteve fora da protecção da sua Santa mãe, hoje está de volta, numa clara demonstração do filho pródigo dos nossos tempos.        

Os manos Joaquim e Mário Pinto de Andrade, tinham muita estima pelo Carmo, o primeiro na longa entrevista dada ao saudoso Michel Laban dizia que a imagem fotográfica que ele mais retinha na sua folha do cérebro de Luanda eram a Igreja do Carmo e a Biblioteca Municipal de Luanda, por essa via, o Michel Laban, sempre que viesse Angola não se coibia em visitar, quanto ao Joaquim, a sua ligação afectiva ao Carmo era tão forte que entre 1988 a 1992, terá sido a par do Frei João Domingos os impulsionadores da criação da Associação dos Amigos do Carmo.                       


No passado mês de Maio, havia um concurso em Portugal, em que classificavam as obras de referência da arquitectura portuguesa no mundo, onde a Igreja do Carmo esteve presente e de resto foi a única de Angola naquele concurso.  

                             

O valor que o conjunto arquitectónico da Igreja e do que subsiste do convento que representa para o património histórico e artístico de Angola, pelo que julgamos impor – se a necessidade de o preservar e sobretudo defende-los, em nome e a bem da cultura angolana, de forma a assegurar-lhe a conservação da antiga cerca. Pelo seu valor patrimonial, afectivo e simbólico, que hoje, é digamos que pacifico unânime dizer-se vir a Luanda e não visitar o Carmo, não passou por Luanda, em nome todos paroquianos e dos seus amigos gostaríamos de desejar um bem haja a nossa Igreja de sempre!           

      
Cláudio Ramos Fortuna


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Fonte: Club-k.net