Luanda - O investimento de 24 milhões de dólares realizado com fundos públicos para recuperação das fazendas de Camaiangala (Moxico), Cuimba (Zaire), Sanza Pombo (Uíge), Camacupa (Bié) e Longa (Cuando Cubango) que custaram ao Estado angolano cerca de 750 milhões de dólares, naquele que está considerado como um dos maiores erros do ciclo catastrófico de gestão do sector da agricultura no pós- independência, corre o risco de também ir para o ‘lixo’. Do mesmo modo que, cerca de 7 000 toneladas de milho semeado na presente campanha agrícola que estão ainda por colher, para além de 10 000 toneladas de grãos que já estão armazenados, representando um prejuízo de cerca de 1 250 milhões de Kz.

Fonte: Club-k.net

FUNDO SOBERANO DE ANGOLA

O risco da paralisação das fazendas, integradas no projecto FazAngola, está a agravar-se, na sequência do congelamento de contas do Fundo Soberano geridos ao abrigo de contratos de gestão de projectos que foi solicitado pelo Governo angolano há cerca de três meses as autoridades das Ilhas Maurícias, e de falta de sensibilidade técnica e política para perceber que essa decisão ou pessoalização na interpretação dos factos, está a causar prejuízos de valor incalculável à projectos que estão a avançar agora em bom ritmo de recuperação, depois de cerca de dois anos de completo abandono e falência. É difícil entender, quando o país tem necessidade de avançar de forma célere com o desenvolvimento agroindustrial, porque vive de importações e está demasiado longe de atingir a autossuficiência alimentar e não dispõe de recursos cambiais para injectar no processo de diversificação da economia.

 

Esta situação de crise das fazendas, resulta da impossibilidade da nova entidade gestora, a Cofergepo, continuar a injectar recursos para dar prosseguimento do processo de recuperação e do funcionamento dessas unidades agroindustriais, iniciado desde Setembro de 2017. Assim, uma vez mais, nuvens negras voltam a ensombrar o futuro destas cinco fazendas, cuja gestão, por incapacidade técnica e financeira atribuída a Gesterra, foi, ao abrigo de decreto Presidencial 91/16, transferida para o Fundo Soberano, a quem se atribuiu, igualmente, a totalidade do capital social das sociedades concessionárias dos projectos, de forma directa ou por intermédio de sociedades por si detidas.

 

De acordo com fontes ligadas a Cofergepo, a nova entidade gestora ao abrigo de acordo com o FSDEA, as fazendas, depois de um arranque promissor, voltam a viver profundas dificuldades, como resultado da asfixia provocada pelos pedidos do Governo angolano endereçadas as autoridades financeiras das Ilhas Maurícias para congelamento de contas que alimentam investimentos realizados pelo FSDEA, até mesmo em território nacional, como é o caso da recuperação destas cinco fazendas. Há, de igual modo, como referem fontes por nós contactadas afectas ao processo, “relutância incompreensível do novo Concelho de Administração do FSDEA e eventualmente de de outras entidades conectadas, em perceber que, independentemente de outros aspectos negociais, é fundamental a protecção do investimento realizado, porque trata-se de dinheiro de Angola e não de qualquer outra entidade, que é importante continuar a proteger e valorizar”.

 

De acordo com as fontes por nós contactadas, os gestores das referidas unidades agroindustriais estão a viver momentos de grande aperto e sufoco, porque veem que se está a comprometer todo o esforço realizado, que permitiu, em tempo relactivamente curto, apesar do elevado nível de degradação encontrado em quase todas as fazendas, a recuperação dos meios e equipamentos que estavam danificados, que foram fundamentais para o arranque da preparação dos solos e para dar sequência ao primeiro ensaio agrícola, que conduziram à resultados extremamente positivos, mesmo apesar de se ter começado a sementeira um pouco tarde, já em finais de Dezembro do ano transacto.

 

Para além da parte mecânica, a nova entidade gestora teve necessidade de drenar solos, não só para alargar áreas de cultivo ou assegurar o funcionamento regular dos sistemas de rega, mas também, assegurar toda a logística de químicos e acessórios, o que obrigou a investimentos altos. Em Camaiangala (Moxico), fazenda entregue a Cofergepo aos 12 de Setembro de 2017, foram preparados 1000 hectares e semeados 750 hectares de milho e 250 de soja, exactamente como consequência do atraso no inicio dos trabalhos. Já em Cuimba (Zaire), também devido ao atraso na entrega da unidade e por falta de sementes, apenas se plantaram 1300 hectares de milho e 300 de soja.

 

No Longa (Cuando Cubango), para além dos 200 hectares de arroz de regadio que foi possível semear, existem também mais 50 hectares de soja em regime experimental, fora do regadio, perfazendo já a utilização de 250 hectares dos 1.050 que podem ser cultivados, do total de cerca de 6.500 hectares que constituem propriedade da fazenda.

 

Resultados mais animadores foram obtidos em Camacupa (Bié). No primeiro ensaio realizado, segundo informação prestada pela Cofergepo, foram semeados 2 mil hectares, sendo 1.500 destinados ao cultivo de milho e 500 para a soja. Ainda assim, os resultados deste primeiro ano de intervenção apontam para um aumento dos níveis de produção por hectare de até cinco vezes, se comparados com os dados da gestão anterior, esperando-se ainda a melhoria desse desempenho nas próximas épocas agrícolas.

 

De acordo com a direcção da Cofergepo, mais do que as dificuldades encontradas e que obrigam a um redobrar de esforços e a realização de despesas que não estavam programadas, que no conjunto das cinco fazendas já rondam os 24 milhões de dólares, o mais difícil tem sido ultrapassar os obstáculos criados pela indefinição criada nos últimos meses, que já pôs em causa investimentos fundamentais e anulou a possibilidade de se produzir durante o período do cacimbo, estando neste momento também já bastante comprometida a época das chuvas em Setembro.

 

Tal situação, de acordo com as fontes a que temos vindo a fazer referência, não beneficia o país, retirando-lhe capacidade de resposta aos desafios da produção agrícola interna, beneficiando objectivos escusos que nada têm a ver com os do actual Executivo. E recorda, que não fosse a decisão tomada pelo então Chefe do Executivo, hoje seria mais difícil a recuperação dessas unidades agroindustriais, face o estado de abandono e de delapidação de meios e equipamentos, que ainda é visível, contrastando com o ambiente saudável de empreendimentos privados, mesmo num contexto de crise, decorridos apenas quatro anos depois da sua implantação. Na generalidade, porque foram sobredimensionadas para os níveis de produção das localidades onde se encontram, correm o risco de se tornar autênticos ‘elefantes brancos’, o que é incompreensível num país com tanto potencial.

 

O congelamento de recursos financeiros que se destinavam à gestão das fazendas, está a ser visto pelos gestores e pelos trabalhadores, como um grande retrocesso, porque para além de levar à paralisação dessas unidades agroindustriais e de se estar a criar dificuldades à centenas de famílias angolanas que se veem privadas das suas compensações salariais, há milho, arroz e soja em grandes quantidades que não foi colhido, que pode estragar-se se permanecer nos campos. “É como deitar para o lixo 24 milhões de dólares e não respeitar o empenho, a dedicação, os sacrifícios consentidos por todos nós, para injectar benefícios e mais-valias à economia do país. A nossa unidade consume, por exemplo, milhares de litros de combustível para metermos toda essa maquinaria, equipamentos e meios a funcionar mas, já começa a faltar” – desabafou-nos Fernando Lito, o jovem engenheiro agrónomo angolano que dirige a fazenda agroindustrial de Camacupa.

 

Recordamos que, a gestão destas fazendas insere-se em contratos estabelecidos pelo FSDEA, que deu lugar a criação de sete sociedades em comandita (parcerias) vocacionadas cada uma para uma determinada área de impacto económico e social em Angola, designadamente, infraestruturas, hotelaria, mezanino, mineira, madeira, agricultura e cuidados de saúde, em que foi atribuído a cada uma um montante de capital de investimento.

 

Assim, o FSDEA, através da sociedade especializada em agricultura, investiu no projecto FazAngola que se encontra a recuperar fazendas agrícolas por todo o país, cujo objectivo é o de contribuir para o aumento da produção agrícola nacional. Ainda neste domínio, decorre também a intervenção num projecto florestal que visa recuperar a produção de madeira, através do qual foram já replantados 250 hectares de floresta e que se encontra já a produzir para exportação, trazendo divisas para o país, para além de vários outros investimentos noutras áreas que se encontram em curso, confirmando deste modo que o dinheiro do FSDEA está também a ser investido em Angola, para benefício dos angolanos, em sectores essenciais para a economia e melhoria de vida dos seus cidadãos.

 

Dados disponibilizados pelas nossas fontes referem ainda que as sociedades em comandita foram criadas nas Ilhas Maurícias, “por que é o território que oferece mais vantagens fiscais e permite a limitação da responsabilidade e risco de perdas do FSDEA, no caso de algum investimento não correr bem”.