Luanda - Recentemente, durante minha estadia no Dubai, em Abril deste ano a caminho para os Estados Unidos, encontrei-me com um grupo de jovens provenientes do Senegal, e que como eu, fazia escala para China, para o inicio de uma jornada de formação numa bolsa governamental para Mestrados diversos. Na nossa conversa rotineira, fiz-lhes algumas perguntas, para as quais, recebi respostas, um tanto surpreendentes.

Fonte: Club-k.net

Minha questão para eles foi: hoje, já na segunda década do século 21, o que significa para vocês ser um africano, um africano genuíno? Além de nossa aparência, nomes, comida, línguas e vestimentas tradicionais, o que mais nos identifica hoje como Africanos? De suas exposições e sonhos, nasceu este artigo.

Assim, começo por dizer que não devia ser segredo para a classe intelectual do continente, que o sonho Pan-Africano é uma ideia fracassada e que ainda se recusa a morrer. Como o famoso mítico símbolo do pássaro Sankofa, os líderes africanos deviam olhar para o passado para criar um futuro melhor, reconhecendo nossos erros anteriores e aprendendo com eles. Mas importante ainda, comemorando nossos sucessos e construindo sobre eles, devia ser uma prioridade sublime de todo líder africano que ama seu povo.

O pan-africanismo, em seu início, foi mais do que apenas uma busca por identidade racial ou geográfica. Inicialmente liderado e popularizado por africanos na Diáspora, como Marcus Garvey e W.E.B. DuBois, foi uma clara rejeição da falácia de que os africanos não tinham uma história. Foi também uma forte refutação da mentalidade que definiu a África e os africanos, a partir da perspectiva da experiência histórica da escravidão, do colonialismo e da discriminação racial. Também pode ser considerada a afirmação da rica herança cultural das sociedades africanas e a importância de alcançar a liberdade e a unidade continental. Passados mais de um século, o que temos?

Desde então, o conceito de pan-africanismo continuou a evoluir, medido pelos desafios e aspirações do continente africano. Durante o período da independência, essa ideologia permitiu que os líderes africanos, superassem a dominação e a opressão, acabando com o colonialismo e o apartheid no continente. A possibilidade de rápida transformação socioeconômica do continente foi outra meta promovida desde os primeiros dias.

Como observou o Imperador Hailé Selassié durante o lançamento da OUA, “a menos que a liberdade política pela qual os africanos lutaram por muito tempo, seja complementada e sustentada por um crescimento econômico e social correspondente, o sopro de vida que sustenta nossa liberdade pode se dissipar”. Para mim, esta afirmação ainda soa verdadeira hoje por todas as partes do continente africano.

Nas capitais dos países do Ocidente, os debates sobre o desenvolvimento de África continuam inabaláveis. Lembro-me de um desses debates que assisti sob o tema “Why Angola Matters” na Universidade de Oxford e presentes estavam o Dr. Jorge Chikoti a representar o governo Angolano, e o Dr. Isaías Samakuva a representar a UNITA. Foi clássico.

Porém, há muitos hoje que argumentam que a África sofre de fracas ou falta de instituições credíveis. Que os Angolanos o digam. Alguns afirmam que o continente é limitado pela liderança fraca ou corrupta como é o caso da Nigéria e Angola.

Eu porém, argumentei sempre que a política e a restrição ao desenvolvimento do continente, - são vitimas de um caso claro que é das falhas políticas e paralisia política, daí o impasse de desenvolvimento que o continente vive. Um aspecto crítico da renovação do continente africano é a clara falta de unidade africana, que parece continuar a iludir a África. Por isso celebrar o dia da África, muitas vezes parece ser brincadeira de mau gosto.

Numa vista panorâmica, e talvez romântica, assistimos ventos de mudanças democráticas no século XXI no mundo, em África e em particular em Angola. Mas estes ventos, vêem sofrendo grandes revezes e desapontamentos. Os culpados - os Pan- Africanistas do século XX-.

Acrescesse a essa maldição, a visão neocolonialistas e imperialista engendrada pelo Ocidente, logo depois da crise do petróleo que começou em outubro de 1973, quando os membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo proclamaram o seu primeiro embargo ao petróleo. Muitas das actuais crises que o continente vive hoje, são resultantes das sequelas das instituições de Bretton Woods, e suas políticas tal como sempre recomendadas pelo Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional. Muitas delas nasceram depois desta crise que na verdade foi extremamente humilhante para o Ocidente.

Esta é uma das gênesis do fracasso daquela que devia ter sido a Pax Africana, e a dos países em vias de desenvolvimento. Tudo que o Ocidente fez depois deste choque, foi abrir as linha de créditos para países que antes de 1973 não qualificariam para crédito nenhum do Clube de Paris. Mas triste ainda, os petro-dolares desta época, nunca pararam nos bancos dos países produtores de petróleo, mas sim nos bancos Suíços, em Londres, em Paris e New York.

À semelhança do que acontece hoje, notamos que com a entrada dos Chineses em cena com suas linhas de créditos, as economias moribundas do continente, vêem sofrendo mas uma centena de golpes mortais. E estes também, serão mas um caso para o subdesenvolvimento do continente, que só as gerações futuras, poderão saborear amargamente, e lamentar estes acontecimentos nefastos, mas históricos.

Enquanto serenamente escutava as suas resposta num inglês perfeito para quem vem de um país de expressão francesa, recordei-me da seguinte citação de Kofi Annan. “Eu ouvi um líder africano me dizendo isso: eu gosto de fazer negócios com os chineses porque eles vêm, eles discutem negócios, eles assinam e dão o seu cheque - sem uma palestra sobre democracia ou direitos humanos”.

Em suma, os jovens Senegaleses da minha introdução e como outros jovens do continente, sua preocupação básica era com a actual realidade da África Subsaariana. A África Subsaariana, como sabemos, é composta por 48 países, tem uma superfície de 24,2 milhões de km², como área total. As populações da África Subsaariana variam da Nigéria, com uma população de 185.8 milhões de habitantes, e as Seychelles, com uma população de quase 100.000 mil habitantes.

A esperança de vida entre homens e mulheres em nove países da África Subsaariana é de 55 anos em países como, Angola, República Centro-Africana, Chade, Costa do Marfim, República Democrática do Congo, Lesoto, Moçambique, Nigéria e Serra Leoa.

Assim, de Cabinda ou Cunene , com as nossas tribos Bantus de Ovimbundus, quando falamos de Angola ou dos Bugandas no Uganda, dos Zulu na África do Sul, dos Kikuyus no Quênia, dos Yorubas na Nigéria, ou ainda dos Shonas do Zimbábue e as milhares de outras tribos na África, um denominador comum existe: uma chamada continental que é sempre para a geração mais jovem para não esquecer sua cultura, mas sim atar-se sempre as nossas tradições. Já dizia o nosso poeta maior, ( “ao... havemos de voltar”),o que nunca ninguém questionou, é; porque?

Do ponto de vista geral, a realidade cultural africana, é quase que sempre definida por seu conservadorismo, sua manutenção no passado, que parece ser a manutenção de uma natureza imutável. Essa cultura, hoje é agredida de todos os lados, pela rápida disseminação da tecnologia e cultura ocidentais. Por isso, as culturas africanas parecem estar permanentemente na defensiva, e às vezes com razão. Exemplo, o estilo de dança kizomba que hoje é sempre associada a Angola é boa para o Ocidente, mas o nosso funge com peixe seco é alimentação para os cães.

Por causa desta dicotomia, ainda acho que duas coisas nos faltam: a primeira requererá uma profunda incorporação da filosofia das nossas tradições em nossas culturas e a segunda, tem a ver com a falta de uma mentalidade tecnológica nas nossas culturas.

Quem já visitou a sede da União African como eu, pode aqui confirmar- existem ali diplomatas Seniores que até a alguns anos não aceitava questão correspondências fossem preparados usando o MicrosoftWorld, mas sim uma daquelas máquina de datilografia dos anos 70. Fiquei triste quando constatei este facto em 1997. Espero que hoje o cenário seja diferente.

Essa constatação devia levar os líderes do nosso continente a reflectirem no segredo do sucesso do Ocidente. Segredo este, que ajudou as culturas mais avançadas, particularmente as da Europa, e qual era o grau em que elas foram sustentadas pela filosofia imbuída e norteia por suas tradições.

Por exemplo se observarmos o período da renascença europeia ( sec. XIV a XVII), considerado por muitos como a extensão do período da idade média, foi sem duvidas, a base da formulação do sistema de educação, das lei, dos sistemas de governos, das normas, da moda, da arquitetura e outras expressões da cultura que ainda hoje domina a Europa. As bases, foram cuidadosamente pensadas, e definidas antes de sua implementação nas suas culturas.

Diga-se que a Europa que conheci, durante os meus 15 anos de diáspora no Reino Unido, brindou-me de certa forma com uma compreensão e explicação completas e clara de como chegaram às coisas que fazem - a separação entre a igreja e o estado, a base das sua leis, a justificativa para a democracia parlamentar, a lógica por de trás de suas arquiteturas, e o propósito de seus sistemas industriais.

Durante os os meus anos de estudante no Reino Unido, e numa destas vezes em visita ao País de Gaulês, em companhia do Dinho Chigunji, na altura também estudante, ou das visitas a Escócia como funcionário da BP Angola ou as vistas a cidades como Bath com suas piscinas quentes que remontam dos tempos dos Romanos ou ainda a Catedral de Canterbury, prenhe de história da Igreja Anglicana, e admirei de tudo um pouco. E o que dizer do Parlamento Britânico, que ainda hoje é símbolo imortal da democracia mundial, dentro do qual a 200 anos atrás, também era lugar por onde cortavam-se cabeças de opositores?

Voltando para a nossa Africa Subsariana, notamos e todos concordamos naquela mesa redonda, que apesar dos retrocessos, as economias desta área do continente, estão a crescer e que os padrões de vida para muitos, vêem melhorado substancialmente.

Diz-se na gíria econômica, que os números não mentem. Assim dizem os economistas, que até 2025, se o crescimento económico continuar, com os actuais números, estima-se que 3 em cada 5 países africanos, poderão ser de renda média.

Quando aos recursos naturais, sabe-se que a África, possui reservas de petróleo, e ouro ainda inexploradas. Na mesma senda, a África também tem aumentado o seu comércio e as exportações, particularmente com a China e a Índia. O continente ainda tem simultaneamente procurado melhorar a sua produção agrícola e para muitos países como Angola, está tem sido a prioridade central na suas políticas de desenvolvimento e crescimento económico.

No entanto, seria preguiça intelectual da minha parte negar que a África ainda enfrenta enormes problemas tais como:

Pobreza: a África Subsaariana abriga 43% dos pobres do mundo (Relatório de Monitoramento Global de 2016 do Banco Mundial). Nada indica que estes números vão melhorar em médio prazo. Nada.
Infra-estruturas: Sobre os transporte só em Angola, esqueçamos as promessas do agora desempregado compadre do Presidente, o ex ministro dos transportes Dr. Augusto da Silva Tomas. Foi a meu ver o pior tecnocrata, gestor e demagogo que Angola já teve.
Energia, irrigação, e armazenamento: são subdesenvolvidos em todo continente, estima-se que precisem de mas US $ 50 bilhões adicionais por ano para que haja progresso nesses sectores.
Saúde: mas de 80 milhões de pessoas na África podem estar em risco de contrair Malária até 2080, enquanto isso em Angola até as ajudas vindas de fora para combater esse mal não chegam ao destino.
Emprego: O crescimento económico recentemente vivido em África, não criou bons empregos e em números suficientes. Na última década, a força de trabalho da África cresceu em 91 milhões de pessoas, mas apenas 37 milhões delas estavam em empregos que pagavam salários justos. No caso de Angola, muitos empregos foram criados sim, graças as linhas de crédito da China, mas isto não evitou que até os motoristas e jardineiros viessem da China para trabalhos que não qualificam para um visto de trabalho em país nenhum do mundo. Como resultado, hoje a Avenida Fidel de Castro é 95% uma autêntica China, todo negócio é dos chineses.

A agricultura ainda é o principal meio de subsistência para mais de 80% das camada extremamente pobres da África. Para Angola os líderes iluminados do MPLA, só receberam visão de diversificação econômica durante a tal dita crise dos preços das commodities quando viram o preço do barril a bater $20.00. Todo verdadeiro economista angolano que tem seguido as receitas petrolíferas e dos diamantes que entraram nos cofres do estado na ultima década, sabe que está desculpa não passa de “ fake news”.

Mudanças climáticas: Os peritos e cientistas identificam a África como um dos continentes mais vulneráveis à variabilidade e mudanças do clima. A África enfrenta já hoje, uma ameaça crescente de eventos extremos como tempestades, inundações em suas regiões costeiras, enfrenta a mobilização de dunas de areia e ainda assolado por secas sustentadas que afetam a segurança alimentar. A água, ecossistemas, saúde, infraestrutura e migração são já problemas recorrentes.

Com toda a franqueza possível, podemos dizer aqui, que a base de todos os argumentos expostos neste artigo, e sobre os sistemas apresentados, estão todos em detalhes em milhares de livros, documentos acadêmicos e políticas que todos os intelectuais Angolanos e nossos ministros africanos têm tido ou podem ter acesso.

Mas às vezes, amarrados na base filosófica de nossas culturas, a mentalidade tecnológica que se espera, fica sempre procrastinada. Enquanto isso, a Europa que foi o primeiro continente, e o seu povo o primeiro a colocar na frente e no centro da sua sociedade, a aplicação da sua cultura material, à resolução de desafios práticos, não dorme, continua nesta senda. E a minha África, o que faz? Sempre a procura de bodes expiatórios em insistir em culpar a colonização portuguesa, francesa, britânica, e amanhã Chinesa, etc, pelos nossos problemas.

Hoje, sem circunlóquios, observamos mas disparidade tecnológica entre a Europa e a África, do que um mero know-how como muitos apregoam por aí. Um dos recursos que a Europa desfrutou no início de sua era, não foi apenas o conhecimento novo, mas uma atitude em relação ao conhecimento diferente de outras culturas. A verdade é que havia uma prontidão dos go
Ver-nos europeus para lidar com problemas práticos, e uma abordagem tecnológica que beneficiasse o presente e o futuro de seus povos.

Para quem conhece, e estudou a Europa de 1928, depois da primeira grande guerra mundial, concordará comigo que antes da descoberta da penicillin, primeiro verdadeiro antibiotic, por Alexander Fleming o sector de saída não era o mesmo. Foi preciso visão, e revolução de pensamento para esta dimensão de progresso.

Em síntese, está revolução era de razão, plantou as raízes do que no século XVIII iluminou os alicerces de todas as característica das elites européias durante o Iluminismo. Daí a sua crescente confiança no poder de mudar as coisas. Isso é crucial para entender as razoes do porque é que no auge do império britânico, o sol nunca se punha neste império já global naquele tempo em relação ao domínio do mundo de então pela civilização ocidental.

O caminho seguro para nós Africanos, dentro da nossa cultura, deverá ser incentivarmos prontamente o que funciona e o que deve ser usado. Só assim certamente estaremos a trilhar a senda do progresso e sermos quem sabe dentro de uma década um pouco mas avançados. Vejamos o caso do Socialismo Científico - fazer do angolano um homem novo- não funcionou, e como esperamos que a democracia a medida britânica, venha a funcionar?

O papiro funcionou para os os escribas dos Faraós, e se calhar para Pitágoras, isso é o que funcionou, para a publicação de livros ou notícias daquela época. Mas tão logo o papel foi descoberto, e provou ser muito melhor que o papiro, então o papel começou a ser usado até hoje. Quando, milhares de anos depois, meios eletrônicos foram desenvolvidos para escrever mensagens, notícias e idéias na nova forma de programas e e-mails do Microsoft Word, então é isso que se tornou o novo formato para a mente europeia.

Nas minhas observações sobre os Europeus, noto sempre, que eles não têm escrúpulos em incorporar elementos de outras culturas de outras terras se esses elementos contribuírem para uma melhor produção e vida útil mais eficientes.

Recomendo aqui vivamente para a África e em particular nossa Angola, a adotar amplamente essa perspectiva européia de trabalhar. Para muitos intelectuais africanos e pan-africanistas que conheço no continente, estes, são do pensamento de que, para permanecermos autenticamente africanos, devemos resistir, tanto quanto possível, ao ataque da civilização ocidental por conta própria. Não vejo muita diferença com a filosofia do Boka Haran na Nigéria. Com este tipo de mentalidade, a renascença Africana será sempre uma utopia.

Assim se notarmos, as culturas não só a africana, mas também a árabe e asiática, são geralmente culturas na defensiva. É por isso que africanos, árabes e asiáticos ocidentalizados, são frequentemente acusados de terem sofrido “lavagem cerebral". Fui acusado de ter sofrido lavagem cerebral durante os 500 anos da colonização portuguesa em Angola recentemente quando recusei-me em comer saza ou ( funge) no Zimbabwe com as mãos. Isto porque as nossas culturas, ainda olham para o passado e acreditam em manter esse passado da forma mais fiel possível.

Esta é uma das crises que a meu ver, ameaçam a existência e o progresso económico das economias Africanas e um dos maiores desafios que o continente enfrenta hoje. A África está cada vez mais a deparar-se com o mundo ocidental e tecnologicamente dominado no final do século 20 e início do século 21. Temos como casos em ponto, os casos dos e-commerce, cryptocurrencies, sociedade sem dinheiro, e não vejo evidências de um continente que está se preparando para esses desafios.

Somente sérias mudanças de visão, comportamento e políticas, evitarão um apocalipse comum do continente. Concluo assim dizendo que a liderança Africana de hoje deve entender que as futuras gerações do continente, merecem uma vida melhor do que os naufrágios actuais no mar mediterrâneo em busca de melhor vida por causa de um pan-africanismo ilusório.

*Economista

Florida 1 de Julho, 2018.