Luanda - Ana Paula Godinho Marques da Conceição nasceu em 1965, na cidade de Benguela, numa família da classe média. A mãe, Ricardina, desde cedo lhe incutiu valores solidários e de independência.

*Rui Ramos
Fonte: Jornal de Angola

Ana Paula Godinho, assim é conhecida, gosta de recordar: “Aprendi a situar-me e, tal como Rudyard Kiplling, ‘a privar com reis’, continuando simples.”

Com cinco anos, Paula vai para Luanda onde faz os estudos primários no Colégio Boa Nova, na Vila Alice, hoje Bairro Nelito Soares, e os estudos posteriores no liceu Augusto Ngangula, no Mutu ya Kevela e no Instituto Politécnico Karl Marx Makarenko, onde frequentou o curso de Química.

Naquele tempo, o sistema de ensino funcionava com base no encaminhamento, o Ministério da Educação distribuía os alunos pelas áreas de ensino e de formação de que o país tivesse maior necessidade. A escolha do aluno era irrelevante e Ana Paula Godinho foi encaminhada para o curso médio de Química, que lhe permitia seguir Engenharia, quando a sua vocação sempre foram as Letras.


Após a 9.ª classe, Paula foi estudar para Portugal, onde viviam os seus avós, e lá terminou o 12.º ano, na área de Humanísticas, que dava acesso a Direito e a Jornalismo.


Mas Ana Paula Godinho não fica muito tempo no estrangeiro e regressa ao país para ingressar na Faculdade de Direito. À data, existia somente a universidade pública e era exigido, a quem se habilitasse ao curso de Direito, que tivesse o aval do MPLA, na altura “partido único.”


Todos os estudantes universitários trabalhavam e ela não era excepção. “Foram tempos de culto ao trabalho, às letras, de combate ao analfabetismo, de solidariedade, de humildade, valores que, infelizmente, vi esfumarem-se.”


Antes de entrar para a faculdade de Direito, Ana Paula Godinho deu aulas de Língua Portuguesa no Instituto Médio Karl Marx Makarenko, onde encontrou a professora Bernardina Borges, que sedimentou nela a ideia de que as mulheres tinham de ter conhecimentos, de trabalhar, de fazer mais para serem reconhecidas: “Tive sorte, porque encontrei sempre mulheres inspiradoras que, apesar de serem fisicamente bonitas, nunca relevaram a beleza para conseguir algo que o seu mérito não conseguia alcançar.”


Ana Paula Godinho ingressou na Faculdade de Direito onde encontrou, diz, abrindo o seu sorriso límpido, muitas mulheres inspiradoras, como Luzia Sebastião, Josefa Weba, Maria do Carmo Medina, Teresinha Lopes e Paulete Lopes.


Ana Paula Godinho fez o curso de Direito em seis anos, pois a faculdade encerrou um ano, por falta de instalações.


No segundo ano de Direito, transfere-se para o gabinete do Ministro da Educação, onde trabalhou durante três anos como directora-adjunta, com Maria de Fátima Guerra Neto, outra mulher que a inspirou. Mais tarde, em 1987, pela mão de Rui Ferreira, Ana Paula Godinho tornou-se monitora na Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto, até hoje, a par da advocacia, e nesta qualidade é membro de uma sociedade de advogados com doze estagiários, jovens que ela patrocina profissionalmente.


A advogada leccionou durante sete anos no Instituto de Formação de Magistrados - INEJ, onde ajudou a desenvolver o espirítio prático em jovens que já tinham feito a licenciatura em Direito e que pretendem seguir a magistratura: “Foi uma experiência muito positiva, de que me lembro com saudade.”


Nas horas de lazer, Ana Paula Godinho faz voluntariado no Hospital Pediátrico de Luanda. O grupo das Musas - Mães Unidas e Solidárias de Angola, que faz todas as refeições para os doentes do Hospital Pediátrico, é composto por sessenta e cinco pessoas, todas trabalhadoras, mas que dedicam um pouco do seu tempo àquela causa, indo pessoalmente servir as refeições ao hospital.


“Nenhuma de nós tem muito para dar e financeiramente contribuímos com uma pequena quota. Conseguimos captar doações e fazer um trabalho sério, fazendo as instituições acreditarem em nós.


Com estas pessoas, descobri que afinal era muito pobre. Conheci pessoas que têm tão pouco e dão tanto”, diz Ana Paula Godinho, para emocionada, explicar: “É uma experiência única que aconselho todas as pessoas a abraçarem. É um oásis para mim ter a possibilidade de ser mais um entre tantos, de fazer bem sem esperar nada em troca…”


A vida da advogada Ana Paula Godinho, desde a juventude, é de trabalho e esforço, valores transmitidos pela sua mãe, que dedicou toda a sua energia à educação dos filhos.


“Peço a todos os angolanos que trabalhem desinteressadamente e que tenham como foco desenvolver o país, criar um país melhor para deixar aos nossos filhos. Deixar filhos cuja divisa seja o trabalho honesto, o estudo, a competência e a verticalidade.”


A mãe de Ana Paula Godinho é a sua grande referência e ela lembra muitas vezes os seus conselhos: “Minha filha, a tua ambição não pode ser superior àquilo que podes produzir” e “Nunca ganhes amor às coisas, o amor, dedica-o às pessoas.”