Luanda - João Gonçalves Lourenço, Presidente da República de Angola, efectua uma visita de 48 horas á Berlim, Alemanha. Durante a sua estadia, o estadista angolano será recebido pela Chanceler Federal Angela Merkel e participará do sétimo Fórum Económico-Empresarial entre os dois países. A este propósito, o Club-K, conversou com o politólogo e analista Orlando Ferraz, para ajudar-nos a entender as linhas de força desta visita de estado.

Fonte: Club-k.net

Club-K: Como cientista político formado e residente na Alemanha há quase três décadas, já testemunhou visitas anteriores de José Eduardo dos Santos á Alemanha, como vê e enquadra esta primeira visita oficial de João Lourenço á Berlim?
Orlando Ferraz: Ela realiza-se num momento particularmente histórico para o nosso país á luz de tudo quanto de novo e de bom está acontecer. Por outra ele é, desde 1975, o primeiro Presidente democráticamente eleito por sufrágio universal, ainda que indirecto. . .

CK: Democráticamente eleito. . . ?
OF: Repito democráticamente eleito sim, porque os resultados do pleito eleitoral, ainda que contestados pela oposição, perante a decisão do Constitucional nas vestes de Tribunal Eleitoral, acabaram por ser aceites e reconhecidos, tanto mais que toda a oposição, está aí representada em peso na Assembleia Nacional, trabalhando na diversidade de idéias e conceitos mas todos para um fim e bem comum: melhorar o modus vivendi social deste povo que bem merece uma vida mais condigna com razoável qualidade.

Voltando á questão que colocou no início, dizer que o Presidente João Lourenço e á semelhança do que já aconteceu na França, tem assim o privilégio e o prestígio de se sentar á mesa de conversações em pé de igualdade sem “complexos de estado”, ou seja sem ter que se sentir inseguro ou constrangido em estar ao lado de alguém democráticamente eleito, o que não acontecia com o seu antecessor que vinha de um sufrágio altamente viciado e inconclusivo de 1992, carregando sempre o pesado fardo de nunca ter viabilizado a realização da segunda volta das presidências, facto que manchou profundamente os mandatos subsequentes e sua reputação internacional.

CK: Mas ele não foi eleito directamente, mas sim o partido MPLA é quém o rebocou enquanto cabeça de lista...
OF: De facto, mas isso é resultado da tal constituìção atípica de 2010, não consensual á todos os títulos e que se deveu a constelação bastante desiquilibrada dos grupos parlamentares na Assembleia Nacional. Mas olhe, na Alemanha não é muito diferente, porque o ou a Chanceler Federal também vão até certa maneira á reboque, se assim quisermos dizer, porque também são cabeças de listas. Segundo o Artigo 63 da Constituíção alemã, o ou a Chanceler é indigitado ou proposto pelo Presidente Federal ao Parlamento (Bundestag), apois a victória evidentemente do seu partido nas eleições legislativas. Por sua vez cabe o recém constituído parlamento elegê-lo/a com uma maioria absoluta, ou seja com pelo menos metade +1 voto dos deputados. Essa é cláusula também chamada de “Maioria do/a Chanceler). A diferença é que o Grundgesetz(Constituíção) quando aprovada em 1949 em Bonn, isto é 4 anos apois o fim da devastadora Segunda Guerra Mundial, ela foi consensual, supra-partidária á todos os níveis, e isso evita atritos desnecessários bem como mexidas ou alterações constitucionais quando amanhã um outro partido venha a governar. Daí a importância a aprovação de leis consensuais e que sirvam para todos independentemente de se ser governo ou oposição.

 

CK: Segundo o programa de visita, o PR João Lourenço vai também participar de um Fórum Económico-empresarial entre Angola e Alemanha. Esses fóruns que propósito têm e que dividendos Angola poderia tirar dele?

OF: Exactamente, na verdade o Presidente não vai participar do fórum, como é lógico, ele deverá proceder a abertura do mesmo, o que será naturalmente prestigiante e de grande estímulo para os participantes, principalmente para os empresários alemães. O mesmo sucedeu em Fevereiro de 2009 também em Berlim, com a presença do então Presidente José Eduardo dos Santos. Por outra, devo lembrar que este será já o 7. Fórum, o que é muito bom para o fomento e intercâmbio bilaterais. Enquanto quadro e consultor do Ministério do Comércio lembro-me ter participado do primeiro fórum e depois seguiram-se outros que se realizaram alternadamente em Angola e na Alemanha, onde também fui participando já como funcinário sénior do Grupo alemão GAUFF, com sede em Nuremberga, na Baviera. O último fórum do qual participei foi o realizado em Munique e neste não participarei por motivos de agenda.

CK: Enquanto viveu na Alemanha dirigiu entre outras a Associação dos Angolanos e mais tarde a Associação dos Quadros Angolanos, quantos angolanos vivem exactamente na Alemanha?

OF: Lá vão uns bons anos e ainda bem que tocou nesses pontos, quero aproveitar o ensejo para expressar aqui neste espaço meus sentimentos de pesar pelo passamento físico do Senhor António Lussadisso, falecido em Paris (França) por motivos de doença, um pouco antes da minha partida para Luanda. O mais velho Lussadisso foi o primeiro Presidente da Associação dos Angolanos na Alemanha, enquanto eu era Secretário Geral. Apresento os meus sentimentos de pesar á família em particular ao seu filho e amigo meu Mayembe Ciryl.


Respondendo de imediato a pergunta que me coloca, devo dizer que é dificil dizer com precisão quantos somos na Alemanha. Enquanto líder associativo lembro-me em 1999 termos tido acesso á dados do Ministério do Interior alemão que na altura apontavam para 11 mil. Desde que me desliguei das actividades associativas em 2005, perdi as contas. Ontem no noticiário da TPA acompanhei dados aparentemente contraditórios á este propósito pois o embaixador em Berlim falava de 6000 registados pelo consulado, o que acho reflectir a realidade e outros entrevistados falavam em 11.000, ou seja mais 5.000 não registados ou inscritos consularmente. Tenho algumas dúvidas pois se em 1999 já eramos 11 mil passados quase 20 anos, só eu nesse espaço já aumentei mais 2 cidadãos (. . . risos) e que dizer dos outros? Acredito estarmos á rondar os 13.500 cidadãos, muitos deles com dupla nacionalidade.

Perfil

Orlando Ferraz, é formado em Ciência Política, Ciência de Religião Comparada e Filologia Ibero- Romana pelas Universidades Friedrich-Wilhelms de Bona e Albertus Magnus de Colónia e possui uma pois-Graduação em Gestão e Modernização Autárquica. Actualmente é Consultor Sénior de uma ONG Alemã, parceira da OIM-Organização Internacional de Migração com sede em Genebra/Suíça.