Luanda - Integra do texto da Conferência de Imprensa apresentada pelo Presidente do Grupo Parlamentar da UNITA, nesta terça-feira , 4 de Setembro de 2018.

Fonte: Club-k.net

Enquanto não se fizer transparência sobre a Dívida Pública

Caros Jornalistas, Angolanas e Angolanos

Em nome do Grupo Parlamentar da UNITA, saúdo a todos e agradeço a presença dos Excelentíssimos jornalistas e não só.

 

O GPU convocou esta Conferência de imprensa, para partilhar através de Vossas Excelências, com todos os angolanos e também com o executivo e restantes instituições do nosso país, uma radiografia e algumas sugestões pertinentes da situação económica e social.

 

Decorridos cerca de oito meses após a aprovação do OGE, onde o governo e a maioria que o suporta assumiu um compromisso de alterar a metodologia do debate do OGE, invertendo o processo de auscultação, o que infelizmente não foi efectuado. Faltando cerca de 2 meses para a apresentação à AN deste estratégico documento de maior interesse nacional, dificilmente surgirá com as correcções aos tradicionais vícios, em especial pela não aplicação das recomendações, que permanentemente são recolhidas no período de discussão do OGE!

 

Um olhar atento ao país indica que continuamos a não apresentar indicadores de recuperação da grave crise social e económica. O país não apresenta crescimento económico; os trabalhadores e as famílias perdem diariamente poder de compra, pela permanente desvalorização do kwanza; e mais grave, os empresários nacionais debatem-se com a falta de incentivos ao investimento, prevalecendo conflitos e reclamações pelo não pagamento da dívida que lhes é devida e com a cobrança nesse mesmo período do pagamento dos impostos, levando-os ao desespero. São realmente muitas as empresas que têm fechado as portas e outras na iminência de o fazer. É de todo muito urgente o executivo direcionar aos empresários nacionais com vocação empresarial (e não aos governantes empresários) o essencial dos fundos adquiridos em empréstimos e do diferencial do petróleo.

 

A única saída para se resolver a grave crise que assola o país traduzido nas elevadas taxas de mortalidade, aumento da delinquência, aumento do desemprego e também um aumento da pobreza estará, sem duvidas, no crescimento da economia na base da sua diversificação, como forma de sustentar a produção nacional.

 

Angola tem hoje dos mais baixos salários reais entre os países do continente, que não estejam a viver conflitos internos.

Caros jornalistas, angolanas e angolanos,

Quando se discutiu e se aprovou o OGE em curso, o voto da UNITA foi público e ficou fundamentado na declaração de voto. Os 8 meses passados, vieram demonstrar por factos, os motivos que levaram a UNITA a votar contra e a dar-nos razão.

CPI’s

- O Grupo Parlamentar da UNITA formalizou à Assembleia Nacional a solicitação da constituição de duas Comissões Parlamentares de Inquérito:


. No início de Dezembro, solicitamos uma CPI sobre o Fundo Soberano. Continua em alguma gaveta da Assembleia Nacional, procurando impedir transparência e a responsabilização dos actores de roubos descarados a fundos públicos, extremamente necessários aos graves desafios sociais e económicos do nosso país. Este fundo é de 5,7 mil milhões de USD! Valor muito superior à expectativa da intervenção do FMI! Hoje continuamos a ver medidas paliativas por parte do governo e também por parte das estruturas judiciais, que não usam vias agilizadas para recuperação desses valores e trazê-los a uma gestão transparente e direccionada ao interesse nacional. É inaceitável a versão de que não se pode fazer nada, perante os contratos assinados! Nada mais falso! E vejamos aqui 2 dados: estamos a ler que se pagaram cerca de 500 milhões USD por prestação de serviços na gestão dos fundos! Mas como pagar 500 milhões USD a alguém sem encaixe de lucros correspondentes a estas comissões, podemos mesmo dizer “leoninas”! Em nenhum dos OGE houve qualquer encaixe de valores oriundos em lucros do fundo soberano! O governo angolano não pode esperar que sejam os tribunais no estrangeiro que devam cuidar da responsabilização aos desvios ao erário e aos fundos públicos. Urge recuperar também estas comissões “ilegalmente” distribuídas, sem os correspondentes lucros. A Assembleia deve servir o interesse dos angolanos e não continuar a proteger dilapidadores do interesse nacional;

. A CPI à dívida pública, foi formalizada em Março deste ano e também está esquecida. O volume da dívida pública pode ultrapassar os 50 mil milhões de USD! Este numero é assustador e sabemos que boa parte desta dívida é falsa. Denunciamos este facto em sede de debate do OGE e pouco tempo depois assistimos à declarações da Secretária de Estado do Tesouro, referindo que cerca de 25% da dívida pública era falsa! Que estranho! Estas declarações que vinculam o executivo também não ajudam a que se dê andamento à Comissão de Inquérito. Vamos poder confirmar que existe dívida referente a obras que nunca foram feitas; existe dívida de obras de 10, cujos números ascenderam a 100!; existem dívidas de garantias soberanas que não executaram qualquer obra!


Crescimento económico versus crescimento da população

- O Executivo apresentou uma previsão de crescimento para 2018 de 4,9%! A UNITA pediu esclarecimentos sobre qual tinha sido a base daquela estimativa de crescimento, quando não só a previsão da subida do barril de petróleo no mercado mundial e os investimentos no sector produtivo e na diversificação da economia, não justificavam tal crescimento. O FMI na mesma altura apresentou uma previsão inicial de 1,6%, revista posteriormente para 2,2% com base no PBP, principal eixo estruturante da economia do país;

- Ao contrário, o executivo um mês depois reviu em baixa de 4,9% para 2,3%, sem explicar aos angolanos o porquê desta súbita e estranha redução, quando o lógico seria em alta, visto o aumento do preço do barril de petróleo, tal como fez o FMI!

- A taxa de crescimento da população de cerca de 3,6%, portanto superior ao crescimento do PIB(2,3%), significa que o país continua a registar um aumento da pobreza. E um país cuja riqueza cresce menos do que a população não tem como reduzir a pobreza e aumentar o bem-estar.

- É importante notar que desde a divulgação do IBEP ((Inquérito de Bem Estar e da Pobreza) em 2014, nos 3 anos subsequentes, isto é, em 2015, 2016 e 2017, o rendimento médio por habitante reduziu em -1,8%, -6,4% e -5,2%, respectivamente. Portanto, a pobreza em Angola vem aumentando ano após ano.

- No recém-divulgado Plano de Desenvolvimento Nacional 2018-2022, o governo adoptou nova formula para o cálculo da pobreza, o ‘‘Plano Integrado de Desenvolvimento Local e Combate à Pobreza” onde continua a ter como referência o mesmo índice de pobreza do IBEP (2014) como se de lá para cá não tivesse ocorrido nada com este indicador; com a alteração do método de cálculo o executivo passou de um índice de cerca de 49% de pobreza para cerca de 36%! Ora ao alterar a metodologia, deveria indicar que estamos num ano zero, com um início de contagem, em vez de induzir em erro, como se tivéssemos efectuado alguma recuperação dos 49% para os 36%, aliás absolutamente irreais, perante a inexistência de crescimento económico! Portanto não há realmente qualquer redução da pobreza!

- O problema de fundo é que qualquer plano de combate à pobreza só funcionará se soubermos o índice real de pobreza e na sequência existir um crescimento económico sustentável a longo prazo.

Relativamente ao desempenho orçamental, os indicadores apontam para o agravamento da dívida no próximo OGE tendo em conta os acordos com o FMI e a intenção de se obter mais empréstimos (China, Alemanha, e outros). Enquanto não se fizer transparência sobre a Dívida Pública, o cenário poderá ser um verdadeiro desastre para o país, pois existe o risco real da manutenção de vícios. Acreditamos que se o Executivo aprovasse a proposta da UNITA sobre o Regime Extraordinário de Regulação Patrimonial, os capitais a repatriar cobririam em grande parte as necessidades para as quais se recorre agora ao estrangeiro. O certo é que mesmo a Lei aprovada pelo MPLA não garante o retorno de fundos para os cofres do Estado.

Quanto ao acordo com o FMI, encorajamos uma negociação que permita um acordo sem prejudicar nem o emprego nem o salário dos funcionários e trabalhadores angolanos.

É já do domínio dos angolanos que boa parte da dívida pública é de curto prazo e está ligada a prestação de serviços ao Estado e o principal recurso de endividamento é a emissão de títulos de tesouro com taxas altíssimas de que os principais credores são a banca comercial privada, cuja estrutura accionista é detida maioritáriamente pelos mesmos decisores públicos e com altas taxas de juros.


Por exemplo, no quadro do PIP, a proporção de crescimento das infraestruturas sociais e económicas não está alinhada com as necessidades dos cidadãos. Porém, um crescimento à longo prazo resume-se na necessidade de mais investimentos em infraestruturas, assegurar rigor na qualidade dos Recursos Humanos(educação e saúde), nas instituições e nos projectos durante sua implementação. Por isso, neste domínio o Grupo Parlamentar da UNITA alerta a Assembleia Nacional para solicitar ao Tribunal Constitucional a revogação do acordão que limita o seu papel fiscalizador às acções do executivo. A falta dessa capacidade traz como uma das consequências o quadro assustador que os PIP ́s de 2016, 2017 e 2018 apresentam, pois não deveria ser normal que uma análise feita sobre mais de 1000 projectos nos PIP dos anos referidos, metade represente reabilitações. O quadro torna-se mais preocupante, na medida em que enquanto os investimentos nas reabilitações aumentam de 710 milhões para 838 milhões, já os investimentos em novos projectos diminuem de 2,8Bilhões para 1,1Bilhão.

Excelências,

A população cresce o que implica que as necessidades também aumentem.


Se há reabilitação, significa que está-se diante do mesmo número de infraestruturas para uma população crescente. Por isso a exemplo, enquanto o Ministério da Educação em 2016 falava em 166 mil crianças fora do sistema escolar, este ano fala-se em mais de 500 mil.


Se há mais reabilitações do que obras novas, significa que o que tem sido edificado como novo, se deteriora com facilidade e celeridade. Ou é problema de qualidade ou é problema de falta de manutenção.

Sr Jornalistas,


A transparência é fundamental para o país, com os vícios que Angola apresenta. Segundo o histórico de produção da Sonangol, disponível no seu site, as previsões de produção diária para 2018, são de 1.650.059 barris de petróleo por dia. O relatório da OPEP referente ao mês de Março do corrente, citado pela agência lusa, durante o primeiro trimestre do ano em curso, o país produziu em baixa, 1.496.000 BPD. A amostra dos relatórios de gestão e conta da Sonangol referentes à 3 anos, também disponíveis no seu site, indicam que só em direitos de concecionária sobre a produção, o país fica em média com 36% do total da produção de petróleo bruto. Neste sentido, estimando que a produção se manteve em média no mínimo em 1.496.000, significa que o país terá beneficiado igualmente no mínimo, de 97.479.360 de barris de petróleo, nos últimos 6 meses, na razão de 538.560 barris por dia.

Neste período, o preço médio do BP no mercado internacional segundo dados da OPEP, esteve cifrado em 67 USD enquanto o preço de referência no OGE é de 50 USD o que dá um diferencial positivo de 17 USD. Isso permite estimar que o país acumulou com o diferencial do preço do BP no mínimo um total de 1.657.149.120 USD. Esta informação permite questionar que destino o executivo está a dar ao fundo do diferencial do BP?

Perguntamos: para onde vai o excedente do petróleo? Os angolanos precisam saber, pois este valor deveria ir para reserva estratégica do Estado. De recordar que por falta de transparência mais de 600 mil milhões de USD, que desapareceram das múltiplas reservas estratégicas e que os angolanos ficaram sem saber o destino. Por isso, depois de termos vivido tantos anos sem prestações adequadas das contas, urge ter respostas claras e evitar acções discricionárias do Titular do Poder Executivo. Reparem também senhores Jornalistas que o valor do diferencial é equivalente ao valor do empréstimo requerido ao FMI!


Estes valores são fundos de garantia de futuro para o nosso país! Corresponderiam a investimentos em educação, saúde, melhoria de condições de vida das populações, recuperação ou construção de novas vias rodoviárias e de infraestruturas, que hoje não temos, porque estas verbas não são declaradas e ainda por cima estamos a pedir mais empréstimos e a agravar o serviço da dívida!

O país não deve continuar a ser arrastado para contratos de novos empréstimos, sem que haja real prática transparente nas contas públicas.

Prezados concidadãos!

O tecido empresarial é o motor de qualquer economia. Para o vigor que a Economia Nacional requer, são necessárias medidas reais para a implantação no país, da verdadeira economia de mercado que altere o actual quadro, potenciando a iniciativa privada com investimentos racionais em infraestruturas com impacto directo e imediato no sector produtivo de bens e serviços de primeira necessidade. A exemplo de estradas principais, secundárias e terceárias que liguem os pontos de produção e de consumo, acesso a factores de produção como a energia e água e formação de recursos humanos qualificados para o mercado de trabalho.

É urgente à adequação e adaptação dos organismos públicos e privados ao modelo e contesto económico que a realidade exige. É importante uma forte capacitação pedagógica da polícia e da Administração Geral Tributária, para que no âmbito da fiscalização, sejam factores propiciadores da produtividade dos agentes económicos ao contrário do que acontece hoje. É importante a banca comercial estar ao serviço da diversificação da economia.

Aos 4 de Setembro de 2018
O Presidente do Grupo Parlamentar da UNITA