Luanda - A Assembleia Nacional promoveu nesta quinta-feira de a manhã o debate , na generalidade, a proposta de OGE para 2019. O deputado Raúl Danda fez a sua intervenção cuja integra se segue.

Excelência senhor Presidente,
Ilustres auxiliares do Titular do Poder Executivo,
Caros colegas Deputados,

Mesmo que não se goste de me ouvir falar, falarei.


Há pouco fiquei a saber, por uma ilustre colega do MPLA, que não são os angolanos os interessados nesta proposta de OGE, mas o MPLA. Não sei como é que assim vão combater a corrupção. Mas, enfim...


Estamos aqui hoje para analisarmos os caminhos que vamos percorrer para fazermos face ao ano de 2019, que vai ser dificílimo para os angolanos, não apenas porque, a determinada altura, baixou o preço do barril de petróleo, mas, e sobretudo, por causa da corrupção que se decidiu institucionalizar no país.


Quando olhamos para o relatório de fundamentação que nos apresentam, constatamos, com muita pena, o abundar de evasivas e de conversa fiada, de indicadores pouco fiáveis e sem sustentabilidade, tudo feito num esforço titânico para procurar convencer os angolanos de que as incertezas são muitas, os riscos não são poucos, o preço do barril de petróleo é volátil – e o senhor Ministro das Finanças exprimiu essa preocupação há pouco – mas que as perspectivas de crescimento são boas e os angolanos podem confiar no Executivo. Como diria o Povo Binda, “Podi kwitu lala tolo t’ivoze”, ou seja, “podemos dormir descansados”. Só que de tantas vezes escaldados, ninguém mais tem falta de senso para confiar. Como dizia o meu pai “em casa do burro só se almoça; não se janta”.


Indicadores para apresentar ao Povo devem ser colhidos à porta dos hospitais, para ver quanta gente morre por dia por falta de medicamentos ou por negligência médica;


quantificando o volume de lixo que se amontoa na cidade de Luanda, apesar de nos estarem a cobrar uma taxa do lixo cemitério; nas cidades, vilas e aldeias do país, para ver quantos jovens se entregam às drogas, à delinquência, à prostituição e ao suicídio, por não ter o emprego que lhe é prometido em cada campanha eleitoral;


à porta das escolas que existem e as que não existem, para ver quantas crianças ainda se sentam no chão para aprender o “B-A-BÁ”, e aquelas que a ineficácia ainda não permite que tenham uma escola; à porta de cada mercado para ver a forma como a crescente debilidade do poder de compra dos cidadãos reduz a quantidade de mantimentos para alimentar as famílias, etc. Aí sim, encontraremos os verdadeiros indicadores.


Esta proposta de OGE, que a exemplo dos muitos anteriores retrata um “orçamento possível”, parte de uma premissa duvidosa: o Plano de Desenvolvimento Nacional (que já foi “Nacional de Desenvolvimento”). Trata-se de um documento que se espalha em generalidades, sem metas concretas, que busca atingir objectivos mil sem que haja qualquer forma de mensuração, tudo com a realização marcada para “até 2022”, sem que se diga o que é que se faz no semestre X de 2019, o que é que se concretiza em 2020, etc. Como diz o nosso povo, “tudo à toa”.


O nosso país precisa de um forte investimento na Educação e na Saúde, se quisermos atingir níveis satisfatórios de desenvolvimento humano. É verdade que o percentual subiu um pouco, mas nada ainda que se possa comparar com as metas traçadas e aconselhadas pela SADC.

Aliás, o aumento de dinheiro nem sempre significa aumento da capacidade, pois o valor do dinheiro hoje não é o mesmo de há 2 anos. Só uma educação forte, de qualidade, dá aos nossos jovens competitividade perante outros concorrentes, e capacidade de realização para fazer andar o país. Só uma Saúde de níveis aceitáveis há de conferir confiança aos angolanos e aos estrangeiros que cá vivem, travando os medos de irmos para um hospital à procura de saúde e sairmos de lá com doenças, muitas vezes irreparáveis, como aconteceu há escassos dias com a pequena Emília, de apenas 7 anos, que foi ao Hospital Josina Machel para se tratar, mas, ao se lhe fazer uma transfusão de sangue, o hospital usou sangue infectado com o vírus do HIV. E agora?


E a Dívida? Sobre a dívida, cada um diz o que lhe apetece, no tocante ao seu volume em percentual do PIB. Para não se dizer exactamente o que devemos, o Executivo diverte-nos com o número, cito, “acima dos 60% do PIB”, deixando a cada um que leia este documento decifrar se o termo “acima” significa 65%, 70%, 80%, etc. Neste país onde estamos a fazer dívidas para comer, dívidas para construir infraestruturas, dívidas para pagar outras dívidas e dívidas até para pagar salários, a incerteza é astronómica. De três coisas, no entanto, há alguma certeza. A primeira é que quase metade das receitas que vamos arrecadar servirão para pagar “kilapis”. A segunda é que há aí dívida falsa, mormente a doméstica, que já foi avaliada em 25%. A terceira é que o Executivo tem estado a desenvolver-se em esforços para esconder a dívida das empresas públicas, com o intuito de encolher a barriga da dívida e fazer crer que ela é magra, como é o caso da Sonangol e da TAAG, essa cabra que nunca dá leite.


O Executivo vem pedir autorização para utilizar recursos de todos nós, mas o Presidente da República não dá mostras de querer deixar que execução do orçamento seja fiscalizada. E isso é que potencia o dito popular segundo o qual “a ocasião faz o ladrão”. Assim vai combater a corrupção como?


O país está mal, razão por que foi chamado o FMI. Aliás, o próprio FMI faz questão de dizer que só é chamado quando as coisas estão mal paradas. É preciso reduzir as despesas. Deste modo, o Executivo do Presidente João Lourenço está a solicitar aos angolanos que apertem o cinto. Já foi assim para o OGE de 2018. Mas o apertar do cinto vai ser Apara todos, ou continuará a ser apenas para uns?


E já que o momento exige não gastar dinheiro com coisas fúteis, enquanto os angolanos morrem à fome, esperamos que os senhores não gastem mais o nosso dinheiro com ANGOSATs que levantam voo sem ir a lado nenhum, nem levem para a minha terra, Cabinda, refinarias podres, inoperantes, adquiridas num cambalacho suíço qualquer.


Muito obrigado.
Raúl M Danda
Deputado
Vice-Presidente da UNITA
Presidente da 10ª Comissão de Trabalho Especializada