Luanda - A República Democrática do Congo (RDC) vive um momento de apreensão e suspense. No dia 23 de Dezembro de 2018, realizar-se-ão as eleições presidenciais, legislativas e provinciais. Esse suspense é partilhado pela comunidade internacional, visto que desde a sua independência, nunca houve uma transição política pacífica no país.

Fonte: visão-global.blogspot.com.

A RDC, tem na sua maior bênção a sua maior maldição. É o segundo maior país de África em extensão e um dos mais abençoados a nível internacional em recursos naturais. Por essas razões, as lutas internas pelo poder e a cobiça pelos seus recursos por parte das potências estrangeiras são frequentes. Essa cobiça vetusta, foi inclusive um dos motivos que levou a realização da conferência de Berlim (1884- 1885), onde a grande questão em disputa era o controle do Congo, que passou a mão de um dos maiores assassinos da história (Rei Leopoldo II).


As disputas internas, alimentadas pelas potências estrangeiras continuamente ao longo da história se revelaram fatal para os desígnios daqueles que sempre sonharam e lutaram para verem um Congo (RDC) em paz e rumo ao desenvolvimento.


Ao contrário do que ocorreu em outras paragens de África, tal como em Angola por exemplo, no Congo, os dois líderes dos maiores movimentos independentistas – Patrice Lumumba do Movimento Nacional do Congo e Joseph Kasavubu da Associação do Baixo Congo (ABAKO) – chegaram a um acordo após as primeiras eleições do país e o primeiro foi empossado como Primeiro-Ministro e o segundo como Presidente da República. Rapidamente, Lumumba, que é um ícone do pan- africanismo, enveredou por reformas económicas no país, o que não agradou aos belgas que juntamente com a CIA, maquinaram um plano maquiavélico, culminando com o seu rapto e assassinato bárbaro.


 O país viu-se mergulhado no caos, alimentado ainda mais com Moise Tshombé proclamando a independência de Katanga, a província mais rica do país em recursos minerais. Vários acontecimentos marcaram essa fase, com muitas alternâncias de curta duração no poder, culminando com a ascensão ao poder de Mobutu Sesse-Seko, depondo por golpe de Estado o Presidente Kasavubu em 1965. Durante 3 décadas Mobutu governou com mão de ferro, fazendo do país sua propriedade privada com o apoio dos abutres ocidentais, sendo deposto por Laurent Kabila numa guerra civil que terminou em 1996. Novamente, a transição foi feita por meio a violência. O Consulado de Laurent Kabila ficou marcado pela segunda guerra do Congo de 1997 ou também como é chamada 1a guerra mundial africana ou ainda grande guerra de África, onde as questões étnicas, geopolítico-estratégicas e gananciosas foram as causas principais. Kabila acabou sendo assassinado por um dos elementos da guarda presidencial em 2001, sendo substituído por seu filho Joseph Kabila de forma interina.


Somente em 2006, o país voltou a ter eleições gerais, passados quatro décadas, tendo Joseph Kabila vencido e se tornando assim oficialmente Presidente da República. Tendo o seu segundo mandato terminado em 2016, Kabila Jr. como também é chamado, tentou uma fazer uma revisão constitucional para poder partir para o um terceiro mandado consecutivo, o que despoletou uma onda de contestações violentas, causando centenas de mortos e milhares de feridos. Depois de tanta pressão e após a mudança na estrutura do poder em Angola, onde Kabila sempre contou com o apoio de José Eduardo dos Santos, o novo líder angolano João Lourenço mostrou-se indisposto em apoiar Kabila na sua tentativa de se manter no poder. Portanto, Kabila escolheu Emmanuel Shadary como candidato da Plataforma Política que dirige para concorrer a sua sucessão.


Com as eleições marcadas para 23 de Dezembro de 2018, os dois maiores pesos pesados que sempre fizeram oposição a Kabila - Moïse Katumbi e Jean-Pierre Bemba – fora da corrida, os resultados das eleições tornam-se cada vez mais incertos. Sendo assim, os dois grandes candidatos da oposição, são Félix Tshisekedi e Vital Kamerhe. Em vésperas das eleições, as denúncias de irregularidades crescem, com a oposição se mostrando reticente em aceitar o uso das urnas eletrônicas. Dois incêndios em armazéns destruíram milhares de urnas eletrônicas, e como sempre todas as partes apontam o dedo a outrem.


Essas eleições, serão históricas, porque pela primeira vez na história do país, a transição política será feita por meio de sufrágio direito e universal. Mas também espera-se que se torne ainda mais histórica com uma transição pacífica.


A paz é um bem precioso para qualquer nação e infelizmente o povo da RDC há muito que não sabe o que é viver em paz. Não está em jogo apenas a transição política na RDC, mas também a estabilidade da região dos grandes lagos em particular e de todo o continente em geral. Como afirmou o filósofo Frantz Fanon: ‟África tem a forma de um revolver, cujo gatilho é o Congo”. Uma expressão repleta de simbolismo que espelha a realidade do continente.

 A segunda guerra do Congo (1997), é um exemplo disso, tendo arrastado 9 Estados africanos para o campo de batalha – o conflito africano com a envolvência de maior número de Estados do continente – causando instabilidade na região dos grandes lagos.


Porque não se pautar pela transparência e os principais candidatos às eleições assinarem um acordo pré-eleitoral onde todos se comprometem a respeitar os resultados das eleições, a exemplo do acordo assinado entre Goodluck Jonathan e Muhammadu Buhari nas vésperas das eleições nigerianas de 2015?


A paz deve ser do interesse de todos os intervenientes no processo eleitoral e mais importante ainda, o povo congolês está cansado de guerras. Que a democracia se faça sentir e que os congoleses passem uma mensagem positiva para o mundo.
Que a história seja feita...

ULISSES LUFUNDISSO, LICENCIADO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS.