Luanda - Feita uma leitura contemplativa do meu último Artigo de 13 de Dezembro de 2018 (A Reflexão do Natal de Ano de 2018), notei que, na sua síntese, continha uma análise muito profunda sobre a problemática da corrupção. Portanto, achei ser importante voltar à carga, extrair o essencial do texto, fazer algumas adendas, e partilhá-la novamente com a opinião pública.

Fonte: Club-k.net

Nesta lógica, é fundamental saber que, o poderio económico-financeiro, erguido pelo Presidente José Eduardo dos Santos (sustentáculo da economia angolana) tornou-se um instrumento politico poderoso, com uma influência extraordinária na sociedade angolana. Criando, desta forma, uma condição de dependência e de subserviência no seio da classe média e da intelectualidade urbana. Por sua vez, os dois estratos sociais, donos do saber, servem de veículos principais da alienação cultural, do obscurantismo, da cultura totalitária e do partidarismo sectário no seio da população local, que vivem em condições extremas de pobreza, do subdesenvolvimento e da iliteracia.

 

Nesta base, o «partido-estado» e o «poder financeiro» são dois factores principais que asseguram o poder politico do MPLA, que perdura desde 1975. Este é o cerne do problema, que deixa uma dúvida, se de facto a liderança actual do MPLA estará mesmo determinada, em desmantelar a superestrutura centralizada do partido-estado, como tivera feito o Mikhail Gorbachev, na década 80, que teve a ousadia de proceder às reformas profundas do sistema politico, económico e social da União Soviética.

 

Repare que, o poder financeiro da nomenclatura do MPLA foi erguido formalmente através da política da «acumulação primitiva do capital», aprovada (por unanimidade)pelo Bureau Político do Comité Central do Partido, em que o actual Presidente do MPLA, João Lourenço, era o Secretário Geral do Partido. Nesta senda, se verificar bem a lista dos ricaços do MPLA (marimbondos), que circula nas redes sociais constata-se nitidamente a sua abrangência. Nela estão incorporados quase todos os quadros dirigentes afectem ao partido no poder. O que, de grosso modo, dificulta o combate efectivo e global à corrupção. Pois, este combate exigirá uma maquina potente do Estado, sustentado por um partido idôneo, assente no racionalismo científico, na integridade moral, na competência técnica e na igualdade jurídica.

 

No contexto actual, o MPLA está desprovido de condições objetivas para cumprir com zelo esta tarefa ingente, bastante complexa. A não ser que o inquilino actual da Cidade Alta tenha ousadia de alterar o quadro legal, institucional e doutrinário que prevalecem no país, erguido e implantado durante três décadas de má-governação.

 

A meu entender, a questão fulcral que se impõe, não consiste apenas na luta contra a corrupção, como tal. Mas sim, na criação da legislação, de mecanismos e de instituições eficazes e sólidas, capazes de conter a corrupção; disciplinar civil e criminalmente os corruptos e corruptores; aprofundar a democracia plural; equilibrar o poder legislativo; moralizar e despartidarizar o poder judicial; e regulamentar o poder financeiro.


Noutras palavras, o essencial é não deixar o «poder financeiro» transformar-se na«hegemonia política», em que só uma casta de indivíduos, de uma família política, tenha acesso ao mercado de capitais, e abuse o poder financeiro para manter-se no poder e dominar eternamente a sociedade. Por este motivo, se torna premente a «revisão constitucional» no sentido de estabelecer as novas balizas e os novos freios, que garantam o equilíbrio politico; a separação efectiva dos três poderes de soberania; a redistribuição equitativa de funções e competências; a despartidarização da administração pública; a reestruturação e despolitização do poder judicial; a clareza, precisão e transparência do sistema eleitoral; e a distribuição equitativa da riqueza. Como dizia o filósofo alemão, Georg Wilhelm Friedrich Hegel: «A reforma constitucional deve ressaltar a igualdade jurídica e o bem-estar público». Fim de citação.

 

Em suma, é importante ter em conta o facto de que, a corrupção em Angola está intrinsecamente associada ao poder politico como sendo instrumento da manutenção da hegemonia política e do monopólio econômico-financeiro. Ela está centralizada, hierarquizada, estruturada e institucionalizada, com sustentáculos profundos em todos os sectores do aparelho do Estado.

 

Em função disso, o combate contra este fenómeno corrosivo deve ser legal, institucional, sistemático e abrangente. Por isso, o Estado deve combatê-la saído do circulo vicioso do poder exclusivista, e buscar outros factores de luta que estejam fora do tradicional circulo interno partidário. Ou seja, se tornará imperativo a integração na maquina do Estado da sociedade civil e de outras personalidades honestas e com capacidades técnicas para fazer face à este fenómeno colossal. É óbvio que se deve desmantelar a maquina pesada burocrática do partido-estado, que permitirá o funcionamento pleno das instituições democráticas. O equilíbrio politico no parlamento constitui o factor determinante para que haja a legislação qualitativa, a boa governação, a fiscalização competente e a representatividade leal e efectiva do povo no órgão legislativo.

 

Tudo isso, exposto acima, passará necessariamente pela revisão constitucional, sendo o objetivo primário a mudança da direcção doutrinária, que prevalece no país desde 1975. Se existir o patriotismo e a vontade política, o Presidente João Lourenço poderia ter a felicidade de seguir o rumo histórico do Mikhail Gorbachev, que trouxe a democracia plural à Rússia e libertou os Povos da Europa do Leste do Sovietismo Russo.

Munique, 02 de Janeiro de 2019.