Luanda - 1. GENERALIDADES: Dia 27 de Janeiro fez um mês desde que entrou em vigor o Decreto 227/18, de 27 de Setembro, que vem apefeiçoar o Regime Jurídico de Vinculação e de Contribuição da Protecção Social Obrigatória, que entre outras medidas veio alterar a base de incidência subjectiva (sujeitos passivos da contribuição) e alargar a base de incidência objectiva (rendimentos), passando para o efeito a ser considerada a "remuneração ilíquida" do trabalhador, nomeadamente todas as prestações pecuniárias que, nos termos da relação jurídico-laboral, são devidas pelas Entidades Empregadoras aos trabalhadores (n.º 1 do artigo 13.º).

Fonte: Club-k.net


Em relação aos trabalhadores já reformados, mas que continuam em efectivo trabalho por conta de outrem, a taxa é fixada em 8%.


Convindo tentar esclarecer na óptica legal, o que constitui remunerações para efeitos de contribuição social (Salário e Remunerações adicionais), o Decreto n.º 8-C/91, de 16 de Março, pretendendo não deixar ao arbítrio do aplicador da Lei a definição de remunerações, definiu no seu artigo 2.° as prestações remuneratórias, que correspondem o Salário e Remunerações adicionais, para efeitos contributivos e no 3.º as excepções, cuja validade se estendem até a actualidade e que estão fora do âmbito de abrangência do Decreto 227/18, de 27 de Setembro.


Assim sendo, não são consideradas remunerações, portanto isentas da contribuição para Segurança Social, o seguinte:


a) os subsídios de transporte, quando existam;
b) as ajudas de custo;
c) a idemnização paga pela não concessão de férias ou período de descanso;
d) os complementos de prestações regulamentares da segurança social pagos pela empresa;
e) os subsídios pagos pelas empresas aos trabalhadores para estudos dos seus filhos;
f) os subsídios destinados ao pagamento de despesas com assistência médica ou hospitalização do trabalhador;
g) subsídio de natal.
Em relação ao subsídio de natal, que ao abrigo do n.º 3 do artigo 13.º do Decreto 227/18, de 27 de Setembro, foi tácitamete incluído na base de incidência, mas que nos termos da alínea g) do artigo 3 de Decreto 8-C/91, de 16 de Março, para efeitos de contribuição para segurança social está excluído, em nosso entender, este deverá merecer o tratamento definido pelo decreto 8-C/91, de 16 de Março, em homenagem ao Princípio da Protecção.

2. PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO

2. 1. CONCEITO DE PRINCÍPIOS


Actualmente, já se vai tornando desnecessário motivar o estudo dos princípios no Direito, depois que as grandes mudanças pós-modernas no pensamento filosófico, político e jurídico, desenvolvidas nas últimas décadas do século XX, recuperaram os valores substantivos da conduta humana, repondo os valores formais na função instrumental, que lhes cabe.


O positivismo jurídico, que havia levado o formalismo e o dogmatismo jurídico a uma excessiva preeminência, minimizando a necessidade e a importância da axiologia e do conteúdo substantivo na aplicação do Direito, havia abastardado a Ciência do Direito, ao desvinculá-la dos valores que haviam orientado a sua formação e desenvolvimento desde as suas remotas origens.


Foram as suas próprias contradições e seus erros históricos que, após mais de um século de catástrofes e de abusos do ser humano, acabaram despertando a consciência dos povos para a necessidade de reinfundir os valores perdidos pelo Direito, esvaziado pela fria lógica dominadora do Estado-potência, possibilitando o auspicioso ressurgimento dos princípios, já não apenas como meros elementos informativos dos legisladores e dos intérpretes, apenas tolerados no fastígio da dogmática positivista, mas como portadores de eficácia própria, por expressar valores, finalidades e interesses capitais e indisponíveis da natureza humana, assim entendidos como as próprias vigas mestras da convivência social e, por isso, do Direito, passando a se refetir nos textos legislativos e, de modo especial, nas Constituições pós-modernas.


Com efeito, o Direito, tanto como qualquer outra Ciência, que não fosse apenas por sê-lo, não prescinde de princípios, como proposições que lhe conferem coerência epistemológica e unidade sistemática, qualidades imprescindíveis para que qualquer conjunto de conhecimentos integrado adquira o status científico.


Com efeito, apreciados sob o ponto de vista gnosiológico, os princípios são proposições abstratas de segundo grau, por constituírem abstrações inferidas de leis, que, por sua vez, são proposições abstratas de primeiro grau, com o objectivo de pôr em evidência alguma invariância que especificamente os distinga e caracterize.


Assim, princípios e leis, guardando, ainda, para estas, o sentido epistemológico com que se as vêm tratando, são, ambos, normas, inferidas, respectivamente, uma, da realidade e outra, da idealidade, ou, dito de outro modo: são normas do ser ou normas do dever ser.


Como os princípios são, em síntese, normas portadoras dos valores e dos fins genéricos do Direito, na sua expressão mais pura, explica-se porque a sua violação apresenta repercussão genérica muito mais ampla e grave, sobre a ordem jurídica, do que uma transgressão de regras, que restritamente os aplicam às espécies fácticas definidas pelos legisladores.


Por fim, ainda que os princípios não venham explicitados na ordem jurídica positivada – pois basta que nela se encontrem implícitos – é fora de dúvida que a positivação de um princípio é sempre benéfica e desejável, sobretudo pela eficácia irradiante que causa, com uma abertura sistêmica de elevadíssimo cunho didático-pedagógico, ao conferir maior relevo e nitidez aos valores e aos fins que portam e ao sentido de optimização a que apontam.

2.2. EFICÁCIA DOS PRINCÍPIOS


Quanto às várias eficácias possíveis, ou funções que podem desempenhar os princípios, entre as inúmeras classificações já existentes, convém distinguir, basicamente, dois tipos de eficácia dos princípios: uma eficácia imediata, impeditiva de conduta, que prescindirá da existência de preceitos deles derivados, e uma eficácia mediata, indicativa de conduta, porque induzirá a necessidade de preceitos deles derivados.

2.2.1 Eficácia imediata


Eficácia imediata, todos os princípios a têm e no mesmo grau, para obstar a produção de efeito de quaisquer preceitos ou actos aplicativos concretos com eles antagônicos, no contexto da mesma ordem jurídica. Assim, no conflito entre um princípio e um preceito com ele incompatível, o preceito é afastado, para desaplicá-lo, no todo ou, se possível, apenas na parte incompatível, e para invalidar os efeitos que vulnerarem a norma principiológica, destacando-se, portanto, dois modos de produção de eficácia: i) a eficácia dirimente e, ii) eficácia impediente.

2.2.1.1. A eficácia dirimente consiste em suprimir a produção de efeitos de quaisquer normas ou actos concretos que sejam incompatíveis com o conteúdo do valor contido no princípio.


2.2.1.2. A eficácia impediente ou redutora consiste em impedir em parte ou em condicionar a produção de efeitos de quaisquer normas ou actos concretos que sejam parcialmente incompatíveis com o conteúdo de valor contido no princípio.

2.2.2. Eficácia mediata


A eficácia mediata é a repassada pelo princípio à integralidade da ordem jurídica, através dos preceitos e dos actos aplicativos concretos que neles se informem, destacando-se, entre outras modalidades, a i) eficácia axiológica, ii) eficácia nomogenética, iii) eficácia optimizadora, iv) eficácia sistêmica e, v) eficácia integrativa.

2.2.2.1. A eficácia axiológica consiste em afirmar na ordem jurídica, os valores que a informam.


2.2.2.2. A eficácia nomogenética consiste em contribuir com fundamentos finalístico-valorativos germinais para a edição de novos princípios e de novos preceitos que neles se reproduzam.


2.2.2.3. A eficácia optimizadora consiste em orientar a interpretação dos preceitos e dos actos concretos, que conformam uma ordem jurídica, no sentido de conferir-lhes a mais ampla, profunda e completa aplicação possível ao seu conteúdo de valor.


2.2.2.4. A eficácia sistêmica consiste em interconectar o conteúdo de todos os preceitos e actos concretos informados pelo mesmo princípio, para que conformem uma superestutura abstrata que lhes infunde unidade e coerência.


2.2.2.5. A eficácia integrativa, que consiste em suprir lacunas quanto a valores e a fins da ordem jurídica.

2.3. PRINCÍPIO DA PROTECÇÃO


O Princípio da Protecção é considerado o princípio do princípios do Direito Laboral, de onde deriva o Sistema de Protecção Social.
Com o advento da revolução industrial e o surgimento da questão social, sentiu-se a necessidade de estabelecer uma protecção jurídica em face dos actos do empregador, enquanto estivesse sob o seu poder de comando e direcção. Daí o aparecimento do Princípio da Protecção, também denominado de Princípio Tuitivo ou Tutelar, que representa a própria essência do Direito Laboral.


Assim, o Direito Laboral, repito - de onde deriva o Sistema de Segurança Social - por intermédio do Princípio da Protecção, estabelece uma desigualidade no plano jurídico, para compensar a desigualidade no plano fáctico que existe entre o empregador (público e privado) e o empregado (funcionários e trabalhadores).


Este Princípio de desdobra em outros três que lhe conferem efectividade:

i) Princípio "in dubio pro operario";
ii) Princípio da norma mais favorável; e
iii) Princípio da condição mais benéfica.

2.3.1. PRINCÍPIO "IN DUBIO PRO OPERARIO"

Para este princípio, quando surgir interpretações divergentes em relação à mesma norma jurídica a ser aplicada a um determinado caso concreto, será dada preferência àquela interpretação que mais favoreça ao empregado.

2.3.2. PRINCÍPIO DA NORMA MAIS FAVORÁVEL


Para o princípio da norma mais favorável, será utilizada, no caso concreto, a norma que atribua melhores condições para o trabalhador.


Desse modo, se uma norma infraconstitucional contiver dispositivo que atribua direitos em maior intensidade para o empregado (público ou privado), terá preferência sobre aquela que não tenha oferecido maiores vantagens ao trabalhador.

2.3.3. PRINCÍPIO DA CONDIÇÃO MAIS BENÉFICA

Como regra da aplicação da condição mais benéfica, entende que prevalece aquela condição mais vantajosa para o empregado, desde que decorra da lei ou esteja prevista no próprio contrato de trabalho, de forma explícita ou implícita, ou decorrente da sua execução.

3. CONCLUSÃO


Portanto, as disposições do Decreto 227/18, de 27 de Setembro, que violem tanto o Decreto 8-C/91, de 16 de Março, bem como a principiologia jurídica, em bom rigor devem ser consideradas ineptas, por ferirem os direitos dos trabalhadores.

Como foi dito, no Direito Laboral, aplica-se ao caso concreto a norma que seja mais favorável ao empregado, não importando a sua posição hierárquica no ordenamento jurídico.


Não se concebe que as remunerações adicionais, protegidas pelo Decreto 8-C/91, de 16 de Março, devam ser também onerados com as contribuições para a Segurança Social. É claramente desfavorável ao trabalhador. E escusado é falar dos princípios que o Decreto 227/18, de 27 de Setembro, fere.