Luanda - A partir desta edição, inauguramos uma série de artigos sobre Ciências da Educação, área na qual tenho um Curso Superior e, consequentemente, capacidade científica para discorrer sobre questões atinentes. A “escola opressora” que Angola sustenta e continuará a sustentar, caso permaneçamos indiferentes, é a razão que me levou a optar pelo tema “educação”. Este fundo sustentador da escola angolana tem a sua fonte na perpetuação do poder para favorecer o grupo opressor.


Fonte: Club-k.net


O problema em abordagem coloca-nos nos modelos pedagógicos que marcaram a história do pensamento educativo. De acordo com a história da educação, o professor era, inicialmente, o cerne do processo de ensino-aprendizagem, e o aluno, concebido como um meio e não o princípio e fim da educação.

 

Na idade moderna, deu-se uma espécie de giro de 360 graus que revolucionou a educação, tendo por consequência o puerocentrismo – criança∕aluno como centro e fim da actividade educativa – um giro que se estende até aos nossos dias. É neste paradigma onde colocamos a importância da relação professor∕aluno e aluno/professor.
 

A relação professor/aluno é de grande importância pelas seguintes razões:
 
1) As teorias educativas actuais demonstram, claramente, que a afectividade, o amor e o carinho que cada um manifesta pelo outro e, sobretudo pelo professor, é determinante na construção do conhecimento e no ensino-aprendizagem para o aluno;


2) Tendo em conta as exigências axiológicas – de valores – que a educação actual recomenda, mais do que dar o arcabouço epistemológico ao estudante para a sua integração profissional e social, o(a) mestre(a) é chamado(a) a dar exemplos de valores ao(s) instruendos, o que só é possível numa relação sadia, em última instância mais humana que sirva de referencial ético.


A relação saudável que contribui para a boa educação não é algo mágico que acontece por acaso. Ela decorre da prática de uma arte tão antiga quanto à humanidade: o diálogo. Este (o diálogo) é imprescindível, porque ninguém pode manifestar afecto e atenção ao seu educando sem o qual, que tem de ter como fonte o professor.


Este diálogo professor/aluno deve ser sincero, cordial, confiante, amigável, mas sem retirar a diferença entre ambos, ou seja, a autoridade do educador prevalece, mas a dignidade do educando, enquanto pessoa livre e digna, também deve ser reconhecida.
A relação professor/aluno remete-nos, necessariamente, ao problema da autoridade e do autoritarismo, ao qual demos uma pincelada nas linhas acima expressas. O autoritarismo é perpassado por ausência total do diálogo; o professor é dogma de fé e critério de verdade indiscutível, submissão, conformismo e individualismo.


No plano político e social, o autoritarismo na educação influi negativamente na vida societal. Um indivíduo formado por professores autoritários tende a ser ditador, autoritário e a-dialógico, porque não teve esta cultura interactiva na resolução de conflitos inter-subjectivos ou sociais.


Para o caso angolano, podemos inferir que o comportamento de indiferença total dos cidadãos em relação aos problemas do país se pode, em parte, atribuir causa à educação bancária e autoritária que recebemos, fortalecida a cada dia que passa.

 

Esta educação, associada ao fundo cultural africano que apresenta sempre o mais velho e o líder como inquestionáveis e quem se atreve à ruptura é visto como mal educado, faz da nossa sociedade estática, por não haver diversidade no pensamento, na sociedade nem na escola onde se deviam formar mulheres e homens livres.


A relação sadia professor/aluno é condição sine qua non para o processo de ensino-aprendizagem, mas isto nunca vai acontecer caso não promovamos uma escola democrática e sociedade abertas – espaços públicos – como diria Habermas.


Para os professores autoritários, apresentamos o seguinte ralhete de K. Popper: “Numa sociedade aberta e tolerante, não podemos ser tolerantes com os [professores] autoritários e intolerantes”.


Outra consequência sociopolítica da relação autoritária professor/aluno é a consolidação da convicção segundo a qual uns sabem para sempre e outros não. Por outro lado, cristaliza a ideia de que uns poucos podem liderar; o resto pode submeter-se, em virtude de existirem pessoas iluminadas e dotadas para nos conduzir; e, por isso, só podemos obedecer.


Outra não menos grave tem a ver com a inviabilização do desabrochar de lideranças diversas. O que torna os países importantes são as pessoas, mas não podemos esquecer que muitas nações são recordadas e valorizadas pelos feitos de lideranças individuais na ciência, na cultura, no desporto, na política, na tecnologia, na religião e nas outras áreas.
Cada uma dessas pessoas constitui uma liderança numa área concreta, o que eleva os povos e nações fazer delas respeitadas e respeitáveis.


 As provas que as lideranças não podem ficar confinadas no terreno político. Na maior parte dos casos más lideranças, que fazem uma pobreza nacional. A África do Sul é reconhecida, não só pela política, mas por ser um país que avança na ciência, economia e cultura. No campo espiritual, tem uma figura de peso mundial, Desmond Tutu. Uma figura, quando se pronuncia nalguns casos, muda a opinião nacional para a outra direcção nunca antes visionadas. É uma liderança que não só tem influência no campo que lhe é conatural, mas estende o seu influxo para os outros cantos que constituem a sociedade.

 

Hoje, não se pode falar da Itália sem Miguel Ângelo, um dos pintores mais influentes da renascença. É uma liderança no campo cultural que tem o seu campo de influência e dá vida à sociedade. No caso da Alemanha, não se pode falar dela sem nos referirmos a uma autoridade de tamanho valor quanto Gutemberg, o inventor da Imprensa, uma revolução no mundo da escrita.


A índia não se esqueceu do contributo que M. Ghandi deu àquele país. Ghandi não foi político (como alguns o rotulam) no estrito senso, mas líder espiritual que arrastou gente com a sua influência, para se manifestar pacificamente contra a opressão inglesa da época. Brasil, um país de qual se fala hoje como um dos mais importantes no futebol pelas estrelas que tomam conta das grande ligas, tem outra grandiosa liderança científica no campo da Pedagogia, Paulo Freire, o autor de “A Pedagogia do Oprimido”.


Podíamos continuar a citar um número infindável de lideranças em vários campos. Não é possível construir lideranças múltiplas, numa educação de opressão, em que o professor se apresenta como o omnisciente, omnipotente, omnipresente, e o mais grave, embriagado com a ideologia partidocrata escravista.