Luanda - Quando encontrei o Raul Indipwo em Angola, já o Milo Mac Mahon tinha falecido, em 1985, e se desfizera o "Duo Ouro Negro", conhecido em vários palcos mundialmente. Conversei com ele cerca de trinta minutos. Foi numa manhã, em Benguela. Raúl falou-me do projecto que tinha em carteira. Queria instala-lo na sua cidade do coração, terra das acácias rubras, dos sape-sapes e das pitangas.

Fonte: Club-k.net

Havia um edifício de arquitectura colonial, próximo ao que é hoje o Largo da Juventude e que ele, apesar de ter nascido na Chibia, já conhecia dos seus antigamentes. Cheguei a ir lá com ele.


O Raúl estava maravilhado com a acústica no interior da escadaria e nas galerias espaçosas, por causa da madeira de boa qualidade do qual era feito. Era madeira oriunda do Brasil nos tempos do negócio da cera, da borracha e até de escravos. Ele confiava que as autoridades o ajudariam porque o imóvel era do Estado que o tinha confiscado aos antigos proprietários que abandonaram Angola em 1975, na altura da independência.


Raúl estava maravilhado com o que via. Olhava sorridente e sonhador para todos os lados e enquanto passava as mãos pelo parapeito das escadas ia dando pancadas suaves obtendo um som de percussão. Falou-me que pretendia integrar várias artes ali, nomeadamente uma galeria para pintura e escultura, um auditório para música. Seria uma casa de cultura aberta para todos os artistas. Fiquei a saber que, como um desejo do fundo do seu coração, pretendia instalar ali, na sua Benguela dos matrindindes pernilongos, a "Fundação Ouro-Negro". Creio que, lamentavelmente, o seu projecto não foi bem entendido por quem, na altura, dirigia o ministério da Cultura.

Naquele tempo, sem um apoio institucional efectivo, era impossível implementar o que quer que fosse.


Assim, num dia triste, em 4 de Julho de 2006, o Raul "Ouro Negro" partiu para a última viagem e o seu sonho ficou adiado. Mas vimos antes o edifício ser cedido a um particular que ali instalou um colégio, fazendo obras que alteraram profunda e irremediavelmente a estrutura arquitectónica centenária do imóvel. Pronto, mas isso são contas de outros rosários. Creio que o sonho de Raúl Indipwo apenas ficou temporariamente adiado. Um dia ele se concretizará na sua terra querida, porque o legado do "Duo Ouro Negro" é imortal.