Luanda - Pretende-se com o presente exercício trazer algumas reflexões em torno do fenómeno da corrupção, causas e consequências, contribuindo com ferramentas úteis para a resolução do problema. Conforme prometido na última edição, neste trabalho vamos dissertar sobre o combate à corrupção com recurso à políticas públicas e estratégias relevantes, analisando a questão numa perspectiva académica/política.

Fonte: Club-k.net

Sun Tzu, um dos maiores estrategistas de todos tempos, disse “todos podem ver as táticas das minhas conquistas, mas ninguém consegue discernir a estratégia que gerou as vitórias”. Não há vitórias sem boas estratégias.


Para melhor compreensão do aludido tema, mobilizaremos alguns conceitos para de seguida mergulharmos no oceano doutrinal.

Conceito de Políticas Públicas e sua Tipologia


O conceito de políticas públicas é bastante lato, para a doutrina ou literatura dominante em ciência política, a definição mais conhecida de políticas públicas continua sendo a de Laswell, ou seja, decisões e análises sobre políticas públicas implicam responder às seguintes questões: quem ganha o quê, por quê e que diferença faz.


Olhando brevemente para a tipologia de políticas públicas, na visão de Lowi, encontraremos quatro formatos tipológicos:

a) Políticas regulatórias – as que determinam os padrões de comportamento da sociedade e dos agentes públicos.


b) Políticas distributivas - as que direccionam recursos difusos da colectividade para grupos específicos de interesses.


c) Políticas redistributivas – as que concedem benefícios a um grupo social específico, retirando recursos de outros grupos também específicos.


d) Políticas constitutivas – as que definem as regras, os procedimentos que irão moldar o funcionamento do governo.


Chegados aqui, coloca-se a questão de saber com que políticas podemos contar para combater a corrupção em Angola?


Antes de respondermos a este quesito é importante a confirmação de que Angola não é o único pais que enferma deste mal. Todas as nações, na sua devida proporção, padecem desta enfermidade (corrupção). A diferença está na forma como lidam com o problema.

Situação da Corrupção em Angola e sua Avaliação


Este diagnóstico é fundamental para se achar a cura. A corrupção é um fenómeno perverso que impede o crescimento económico e o sucesso dos programas de desenvolvimento gizados pelos governos.


Segundo a Transparência Internacional (TI), numa escala de 0 (o mais corrupto) a 100 (menos corrupto), o critério de medição baseia-se na corrupção que é percebida entre funcionários públicos e políticos com base na experiência daqueles que trabalham directamente no e com o sector público, sendo políticos, empresários e a população em geral.


No ranking da TI de 2004, Angola ficou na 133o posição entre as 145 nações analisadas neste ano, ocupando a 13o posição dos mais corruptos. Em 2016, ocupou a 164o posição entre os 176 países analisados, sendo o 13o país mais corrupto do Mundo. Em 2018, Angola caiu para a 165o posição do ranking, tornando-se no 16o país mais corrupto do Mundo. Nota-se aqui uma evolução positiva do posicionamento de Angola no decorrer dos anos, o que poderá ser fruto da sua crescente preocupação política neste domínio. Porém, mais do que isso, é importante entendermos quais são as causas desta classificação e como as mesmas podem ser debeladas.

Causas da Corrupção em Angola

O substrato histórico dos factores que contribuiram para a corrupção em Angola remontam desde o conflito armado que delicerou o tecido industrial, empresarial e social levando a deterioração da situação sócio- económica do país e das famílias, o que deu lugar ao surgimento de certos vícios comportamentais e esquemas que distorceram o normal funcionamento das instituições e o relacionamento entre estas e os particulares. Podemos aqui apontar, resumidamente, algumas das causas:

 Excessiva burocracia nas instituições públicas;

 Centros de decisões centralizados;

 Fraca remuneração aos funcionários públicos;

 Inexistência da cultura de responsabilização e prestação de contas em instituições públicas e privadas;

 Debilidades no sistema de educação e formação da população;

 Ausência de consciência e cultura jurídica no seio das populações e instituições;

 Ausência da cultura de boa governação;

 Hábitos e costumes cultivados pelas populações;

 A cultura do imediatismo generalizado;

 Graves assimetrias sociais e regionais.


 Esquemas de sobrefacturação na contratação pública;

 Promoção do nepotismo e jogos de influência.

Consequências Sociais e Económicas da Corrupção

Não será possível neste breve exercício computar numericamente as consequências económicas resultante das causas acima enumeradas, todavia, é possível indicarmos algumas das consequências visíveis aos olhos de todos que vinham degradando sistematicamente a economia do país e a vida das famílias:

 Aumento da taxa de desemprego;

 Falência crescente de empresas (pequenas, médias e grandes);

 Aumento das taxas de inflação;

 Fuga ao fisco;

 Empobrecimento das famílias;

 Má qualidade dos serviços públicos (mormente a saúde e educação);

 Redução da esperança de vida;

 Aumento da delinquência (pondo em risco património e vida das famílias);

 Fraco investimento no sector social.

 Aumento da taxa de mortalidade resultante da má qualidade dos serviços de assistência médica e medicamentosa.

Vistas do problema.

as causas e consequências, rumemos agora para as possíveis soluções Políticas

Públicas para o Combate à Corrupção


Para Leonardo Sechi (2012), uma política pública é uma directriz elaborada para enfrentar um problema público. É importante entendermos que as políticas públicas são normalmente traduzidas em programas e projectos que visam resolver um determinado problema, para que tal problema se torne público e seja convertido em política pública é preciso que um governo instituído assim o determine e o coloque como tal na sua agenda política.


Nesta perspectiva, na visão de Faria (2003:55), o nível de complexidade no qual se encaixa a política pública, pode ser estratégico, táctico ou operacional.


Seja qual for a estratégia de actuação do governo na busca e construção de soluções eficazes, práticas e imediatas para os problemas, como os que atrás referenciamos, tal actuação não deve prescindir da preocupação para com o contexto real do país, sobretudo, a situação sócio-económica, cultural, o ambiente político e incertezas.


A acção do governo deve também estar alinhada às tendências locais e internacionais que afectam a sua população e soberania, bem como o seu futuro, diz Campo (2000:66). Neste sentido, o agir do governo deve preocupar- se também com as gerações futuras, construindo soluções perenes que vão além de um ou dois cíclos de governo, monitorando as tendências e incertezas construindo e analisando cenários perspectivos de forma a modelar o futuro a partir de acções presentes.

Conclusões e Recomendações


Concluindo, conforme referido em outro lugar, as políticas públicas desenhadas para atacar um determinado problema, são, na prática, traduzidas em programas ou planos. Para efeitos deste exercício, tais programas procurarão visar as causas da corrupção acima citadas. Atentos às causas da corrupção e à tipologia de políticas supramencionadas, é de se recomendar as seguintes políticas/programas:

 Reanimação do programa de desconcentração, e descentralização dos centros decisores a nível central e local através da urgente implementação das autarquias locais.

 Conceber e implementar políticas (constitutivas e regulatórias) que visem a institucionalização da cultura de responsabilização e prestação de contas a todos os níveis da função pública;


 Conceber políticas claras e transparentes, com carácter obrigatório (constitutivas e regulatórias) que visem a institucionalização da cultura e sistemas de meritocracia (competência, honestidade e integridade) para o acesso à função pública, à cargos de chefia e liderança e mobilidade nas carreiras dentro da função pública;

 Instituir pacotes remuneratórios mais atractivos para a função de forma a estimular o bom desempenho e desincentivar a corrupção (activa&passiva). Medidas de repressão são mais eficazes para combater os efeitos e não as causas;


 Instituir e implementar políticas (constitutivas e regulatórias) tendentes a eliminar práticas de nepotismo, clientelismos e jogos de influência a todos os níveis da função pública;


 Conceber e implementar sistemas e programas (políticas constitutivas) que visem a simplificação dos processos burocráticos na função pública;


 Conceber e implementar estratégias que visem a adopção de princípios e práticas de gestão do sector empresarial privado aplicando-os no sector empresarial público e, com as devidas adaptações, em certas actividades da função pública para conferir- lhes maior eficiência;


 Desenhar e implementar estratégias que visem assegurar maior investimento e financiamento aos sectores sociais (saúde, educação e cultura), pois são a chave para o progresso de qualquer nação.


Simão Pedro, Me

Advogado, Gestor e Consultor Jurídico
Mestre em Gestão e Administração de Empresas Públicas e Privadas
Mestrando em Ciência Política e Administração Pública pela Faculdade de Ciências Soiciais da Universidade Agostinho Neto.
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