Lisboa – A decisão do Presidente João Lourenço em afastar do seu governo, o cessante Ministro do Interior, Ângelo de Barros da Veiga Tavares, foi agravada com reclamações de recentes atropelos e excessos de zelo, que aquele, estaria a tomar no processo criminal envolvendo os antigos gestores do Instituto de Estradas de Angola (INEA), acusados pelo SIC, por actos lesivos ao Estado.
*António Gonçalves
Fonte: Club-k.net
PR quer combate a corrupção sem vinganças pessoais
Ângelo da Veiga Tavares, ligado ao general "Kopelipa", já era visado desde que João Lourenço assumiu o poder. Porém, a sua continuação no ministerio do Interior, foi levada em conta a uma imposição da equipa de José Eduardo dos Santos que ainda conservava influencia no regime. Durante estes dois anos de consideração, Tavares teve um consulado que comprometia a imagem do novo Executivo devido aos seus sucessivos erros e abusos de poder.
Em finais de 2018, Ângelo de Barros da Veiga Tavares convenceu o Presidente da República que recuperaria 10 milhões de dólares desmontando a teias de patrimónios em posse de antigos responsáveis do INEA que, no seu ponto de vista teriam resultado de actos lesivos ao Estado. A acusação do Ministro do Interior era baseada no teor de um relatório da Inspecção-Geral das Actividades do Estado (IGAE), levado a cabo em 2009, com referência a factos ocorridos entre 2007 e 2009.
Em finais de Janeiro do corrente ano, o então ministro movimentou o SIC, órgão sob sua tutela, para uma operação de desmantelamento dos antigos responsáveis do INEA, resultando na detenção do seu ex-Director Joaquim Sebastião, que fora acusado de suspeitas da prática dos crimes de peculato (artigo 313.º do Código Penal), subtracção de papéis e documentos por empregado público (artigo 311.º do Código Penal) e associação de malfeitores (artigo 263.º do Código Penal).
Durante os cerca de sete meses de detenção preventiva de Joaquim Sebastião, chegaram informações ao gabinete presidencial, de que o ministro Ângelo de Barros da Veiga Tavares, através dos seus efectivos do SIC, estaria a incorrer em excesso de zelo, movido por alegadas rivalidades pessoais que tinha contra o detido, desviando assim, o foco do governo no combate a corrupção e a impunidade.
A forma como Veiga Tavares estava a levar, este processo, para o campo pessoal, ganhou foco quando no dia 17 de Abril de 2019, exonerou a médica, Ivone Bragança de Vasconcelos Otuo do cargo de directora do Hospital Prisão de São Paulo, por esta, ter autorizado assistência médica a Joaquim Sebastião, na sequencia de uma crise da próstata.
“O detido estava em estado de choque, com dores intensas e tensão arterial bastante elevada. As minhas colegas ligaram-me a pedir orientação. Como o HPS não tem condições básicas para atender casos dessa natureza, autorizei que fosse levado a uma clínica privada, onde foi prontamente socorrido”, explicou a médica, que foi alvo de um inquérito a mando do então ministro.
As alegadas interferências de Veiga Tavares no processo, foram sentidas no vazamento de informações por parte de seus colaboradores, a 25 de Abril, ao enaltecerem não só o afastamento da médica, mas a decisão de prorrogação da prisão preventiva de Sebastião em finais de Março. Em Maio passado, Sebastião voltou ver negada o seu pedido de liberdade com a prisão preventiva vencida.
De acordo com informações que circulam em meios do regime, o agravamento que ditou o afastamento do ministro Ângelo de Barros da Veiga do governo, foram avolumadas com o conteúdo de uma exposição em que o apresentavam como a entidade interessada em ficar - por via de um confisco estatal - com um complexo (resort) detido por Joaquim Sebastião, nos arredores do Kikuxi, no município de Viana. O Estado confiscaria o complexo, e depois figuras aparentemente próximas ao ministro comprariam por via de um leilão.
Em finais de Junho passado, o Serviço Nacional de Recuperação de Activos (SNRA) da Procuradoria Geral da República (PGR), avançou com o processo de confisco de bens em posse dos antigos gestores do INEA.
Nas negociações com autoridades, o antigo DG do INEA, Joaquim Sebastião, terá cedido 25 imóveis particulares para que fossem confiscados pelo Estado. Os magistrados do SNRA, liderado por Eduarda Rodrigues consideraram que a proposta de devolução de ativos apresentada por Sebastião era insuficiente, e foi-lhe exigido o complexo (resort) e a residência familiar localizada no Talatona.
Sebastião rejeitou entregar o complexo (resort) do Kikuxi, dando lugar a um braço de ferro, entre as duas partes (SNRA e a defesa do antigo DG do INEA).
A PGR foi alertada sobre o excesso de zelo que estariam a cometer e no dia 23 de Julho de 2019, o magistrado junto do SNR, Simão Chaluca emitiu um mandado de apreensão de vários bens móveis e imóveis, pondo de parte o cobiçado “complexo (resort) do Kikuxi” que Sebastião recusava ceder. No dia seguinte, o Presidente João Lourenço “expulsou”, Ângelo de Barros da Veiga Tavares, do seu governo.
Com a exoneração de Ângelo Tavares, a soltura condicional de Joaquim Sebastião, que estava marcada para o dia 29 de Julho, deverá agora acontecer nas próximas semanas, caso a PGR tarde a formalizar a acusação e remeter o processo ao Tribunal. O Processo foi transferido do SIC para o DNIAP, órgão da PGR que tem estado a fazer correções das falhas cometidas pelos instrutores da Investigação Criminal.
De acordo com explicações, o interesse da luta contra corrupção declarada pelo Presidente João Lourenço é no sentido de que ela seja de forma transparente sem que os agentes do Estado usem-na para retaliação ou vinganças pessoais contra os visados.
A prisão de Joaquim Sebastião foi inicialmente aplaudida pela sociedade que tem-no como culpado pelo estado de algumas estradas tidas como descartáveis em Angola, feitas ao tempo que dirigiu o INEA. Porém, depois de algum tempo, alguns juristas passaram a chamar atenção de excesso que se estaria a incorrer com ameaças das autoridades em transferi-lo para cadeias fora de Luanda, para o desprover de assistência hospitalar. As advertências dos juristas foram tomadas em conta quando denunciaram que se estava a “prender para investigar”, contrariando o que manda a lei.
As chamadas de atenção de que o caso INEA, estava ser aproveitado para vinganças, foi também notado no tratamento em que o SIC deu aos outros arguidos do mesmo processo. Para além, de estarem a responder em liberdade, o Serviço Nacional de Recuperação de Activos (SNR), negociou com os outros gestores, no sentido de estes entregarem patrimónios em sua posse, em troca da retirada das acusações.
O jurista e académico português Rui Verde, chamou atenção esta semana sobre o fenómeno de combate a corrupção que aconteceu no Brasil, que ficou beliscado com a descoberta que os juízes estariam a usar a justiça para cometer arbitrariedades.
“Combater a corrupção utilizando o puro arbítrio, atropelando a lei ou baseando as acções em opiniões e não em regras acaba sempre por trazer maus resultados. Basta ver a polémica em que o ex-juiz Sérgio Moro está envolto no Brasil, pelo seu papel pouco claro na condução da operação Lava-Jato. Esta operação era necessária, fundamental para o Brasil, mas arrisca-se a cair no ridículo devido aos aparentes atropelos legais cometidos pelo juiz. O mesmo se pode passar em Angola”, lê-se na analise de Rui Verde, publicada no Maka Angola.
Resort cobiçado fora da lista de confisco