Luanda - No final da Guerra Mundial II, em 1945, com a entrada triunfal do Partido Comunista Chinês em Pequim, em 1949, a China fazia parte dos países subdesenvolvidos do Mundo, tipicamente agrário e com uma taxa de pobreza muito elevadíssima. Naquela época, a China tinha uma tecnologia muito rudimentar, sob uma economia planificada, assente nas Cooperativas Agrícolas, controladas pelo Partido Comunista Chinês e cuja produção era controlada e distribuída pelas autoridades competentes do Partido, que tinham o poder de decisão absoluto sobre as comunidades locais, em cada área de jurisdição. Na altura, a China era um Gigante Asiático bem adormecido, sem grande influência quer na Ásia quer na Comunidade Internacional. Apenas estava remetida à retórica socialista, enquanto internamente o povo estava amordaçado, fechado nas fábricas rudimentares e nas cooperativas agrícolas, sem acesso nenhum ao mundo exterior.

Fonte: Club-k.net

Entre 1966 e 1976 a China ficou mergulhada na Grande Revolução Cultural Proletária que visava principalmente à eliminação da «oposição interna» no seio do Partido Comunista Chinês, sob a cobertura de “agentes” do imperialismo ocidental. Por coincidência, em 1975 e 1978, tivemos a oportunidade de fazer duas visitas oficiais à China, visitando as cooperativas agrícolas, as fábricas e os campos de concentração onde as vítimas estavam submetidas ao trabalho forçado, à reeducação, à reabilitação e à retificação ideológica, feita no contexto da Revolução Cultural, que estava ainda em curso. Na primeira visita (em 1975), além da China, estivemos na Coreia do Norte onde tivemos a oportunidade de aproximar os dois sistemas socialistas, da mesma orientação ideológica.


Importa dizer que, durante o período de 1945-1989 a China não participou ativamente na guerra fria entre o Bloco do Leste, chefiado pela União Soviética, e o Bloco Ocidental, chefiado pelos Estados Unidos da América. Esta postura, de equidistância, deveu-se a três aspectos fundamentais: a) Existia um clima forte de rivalidades e de confrontos violentos (1957-1963) entre a China, do Mao Tsé-Tung, e a União Soviética, do Nikita Kruchtchev, que disputavam pela liderança do Movimento Comunista Internacional, dividido entre os Pro-Soviético e os Pro- Chinês. b) A China era menos avançada e tinha-se acabado de emergir da guerra de ocupação pelo Japão e da guerra civil prolongada contra Kuomintang, na qual se envolveram fortemente as potências ocidentais. c) Pelos vistos, a China aderira implicitamente aos dois Conceitos, da «coexistência pacífica», lançada por Nikita Kruchtchev, em 1956; e do «desanuviamento», promovido por Richard Nixon, em 1962.


No fundo, se analisar bem os dois Conceitos, acima referidos, chegarás à conclusão de que, ambos visavam o mesmo objetivo, que era de evitar (nuclear deterrent) a Guerra Fria degenerar- se na confrontação nuclear entre as duas (EUA/URSS) Superpotências Mundiais. Portanto, o posicionamento equidistante da China durante este período conturbado, a tivera permitida organizar-se melhor, poupar os seus recursos e investir judiciosamente nos sectores estratégicos da economia.


Com a morte do Presidente Mao Tsé-Tung, no dia 09 de Setembro de 1976, sucedido por Deng Xiaoping, a China entrará num novo ciclo político-ideológico que pendura até hoje, embora com algumas adaptações. O surgimento do Deng Xiaoping marcou uma viragem decisiva na visão política da China, adotando a política da liberalização da economia e da abertura ao ocidente. Tendo como objectivos estratégicos atrair os investimentos dos países industrializados, ascender às tecnologias avançadas, obter o know-how, e viabilizar o Programa da Industrialização e Modernização.


Nesta referência, adoção da política de «abertura ao ocidente» tinha implicações muito sérias em termos da capacidade das empresas chinesas em adaptar-se rapidamente e competir-se com as grandes empresas ocidentais. Além disso, era óbvio que, a introdução do sistema de produção capitalista haveria de alterar, em grande escala, a substância do socialismo científico que se instalou no país desde a proclamação da Independência Nacional em Outubro de 1949, por Presidente Mao Tsé-Tung. Porque, a presença das grandes empresas ocidentais e o contacto assíduo com a civilização ocidental isso teria impacto enorme sobre o sistema político e sobre a Cultura Chinesa, sobretudo nos grandes centros urbanos do litoral. Pois, existe uma diferença muito grande entre a Cultura Chinesa que é da origem da Filosofia de Confucius, e assenta no Marxismo-Maoismo. Ao passo que, a Cultura Ocidental tem origem na Filosofia Grega, do Sócrates, Plato e Aristotle, e assenta no Cristianismo.


Depois do estudo profundo, a China tinha elaborado uma Estratégia Global muito detalhada, com metas e objectivos bem definidos, e executados por cada etapa específica, fazendo constantes avaliações e balanços sistemáticos das metas e dos objectivos traçados, quer a curto e médio prazos, quer a longo prazo. A formulação das políticas públicas e a elaboração dos projectos tivera que passar por um trabalho de pesquisa profundo, e por um estudo minucioso do mercado, de acordo com a realidade concreta de cada localidade e do seu meio ambiente.


As opções estratégicas tiveram que ser tomadas criteriosamente, baseando-se nos recursos disponíveis, nas prioridades e nas necessidades prementes, contidas no Plano Geral Estratégico. Este Plano Estratégico era concebido através do levantamento geral, com a participação efectiva das comunidades, dos diversos sectores, das administrações locais e dos governos provinciais, que fazem parte de um corpo integrado que tem a responsabilidade da execução dos projectos aprovados. As empresas especializadas velam pela fiscalização directa e sistemática das obras em execução.


Em função disso, na abertura aos investimentos ocidentais tinha sido feito o trabalho prévio. Por um lado, para a definição clara dos objectivos estratégicos por alcançar. Por outro lado, para a análise minuciosa das vantagens e das desvantagens, de modo a estabelecer um quadro de procedimentos de cada processo específico, em termos da localização geográfica dos projectos; da seleção e da capacitação dos quadros; da criação do bom ambiente de negócios; da redução da burocracia excessiva; da elaboração das tarefas de cada sector; da contabilização dos resultados concretos; da fiscalização dos projectos; da maximização dos benefícios; da mitigação dos prejuízos; e, sobretudo, das medidas preventivas contra os desperdícios dos recursos.


Na base disso, a China logrou grandes êxitos nos domínios da liberalização da economia, da industrialização, da modernização, do avanço tecnológico, da mecanização da agricultura e do fomento rural. Porque, tudo isso fez parte da estratégia global, que é implementado, avaliado, corrigido e fiscalizado de modo consistente, sistemático e com rigor, sem desvios e sem esbanjamentos dos activos. Os governantes, os gestores públicos, os técnicos e os operários são controlados e responsabilizados severamente por seus actos, sem excepção. Os dirigentes de escalões superiores recebem penas mais gravosas quando estiver em falta no cumprimento cabal das suas responsabilidades.


Nesta lógica, a China foi capaz, em poucas décadas, de libertar da pobreza extrema mais de 75% da população, tendo em vista atingir 100% em 2032, com fim de ampliar a Classe Média e torná- la mais extensa, estável e confortável. O mais impressionante de tudo isso é a rapidez com que a economia chinesa agigantou-se, tornando a segunda maior economia do mundo, com a inspiração de suplantar os Estados Unidos da América. Vale enfatizar o facto de que, o avanço espetacular da China, dentre outros factores, resultou-se do seguinte: do fomento rural; da promoção da agricultura familiar mecanizada; do empoderamento das comunidades rurais e urbanas; da qualidade dos recursos humanos; da educação e da formação técnico-científica qualitativa; do acesso à tecnologia avançada e ao know-how; da capacidade de previsão, de planeamento e da execução dos projectos; da boa governação; da responsabilização dos governantes e gestores públicos; sobretudo, do patriotismo e da honestidade da Classe Política.


Em síntese, muita coisa que se pode aprender com a experiência acumulada da China, conforme ela tem estado a progredir com muito sucesso desde que iniciou a política da liberalização da economia. Visto que, ela aproveitou-se bem da abertura aos países industrializados. A viragem do sistema socialista para uma economia híbrida (socialista/capitalista) foi feita com profunda subtileza, perícia, astúcia e dedicação. Sem dúvida nenhuma, a China que extravasou os seus benefícios em prol do seu povo, manobrando toda gente, inclusive os Estado Unidos da América, que agora se refugiou no protecionismo austero. Neste caso específico, muitos países africanos, como Angola, ficaram vítimas da sua ignorância e ingenuidade. Neste momento se encontram altamente endividados, tornando-se reféns da China, com que celebraram contratos mal- negociados e mal-aplicados.


No caso específico de Angola, foi com os capitais provenientes da China que se fez acelerar o processo do enriquecimento (acumulação primitiva) ilícito dos governantes, dos dirigentes do MPLA e das pessoas mais próximas do Poder. Neste momento, Angola se encontra no pântano, sem encontrar os caminhos certos e eficazes para sair da crise económica profunda, combater a corrupção, reaver o capital desviado e lidar corretamente com os ditos, “marimbondos.” Enquanto, na verdade, a corrupção é o fenómeno institucionalizado e generalizado, afetando toda gente, quer os governantes de ontem, quer os governantes actuais. Como dizem na gíria, todos é farinha do mesmo saco, tendo os mesmos vícios, hábitos, costumes e práticas.


Aí está o imbróglio, sem ética e sem autoridade moral para combater a corrupção e moralizar a sociedade. Saibas que, o problema crucial de Angola neste momento reside na «consciência humana», que está no estado avançado de degradação, sem ética, sem escrúpulo, sem sensibilidade humana, sem patriotismo e sem o amor ao próximo. O egocentrismo, a corrupção, a ganância, a arrogância, a mediocridade e a barbaridade tomaram conta do país, instalando-se firmemente na classe governativa, nas instituições públicas, na justiça e na classe política.


Deste modo, perdendo absolutamente a confiança da opinião pública, a credibilidade, a legitimidade política, a autoridade moral, o sentido de Estado e a responsabilidade de governar bem e de velar pelo o bem-estar do Povo. Este é o grande desafio da época, por parte da juventude, do género, da sociedade civil e de todos os patriotas angolanos: mulheres e homens. Sem perder a vista de que, o sentido humano leva-o agir com racionabilidade e dignidade humana, como sendo valores básicos da liberdade, da justiça, da igualdade e da cidadania. Sabendo bem que, vive-se no mundo globalizado, no qual cada Estado defende os interesses estratégicos do seu país e do seu povo, como sendo o fundamento mais pragmático da era contemporânea, que orienta as relações internacionais, regula a política externa e conduz a diplomacia económica.

Luanda, 20 de Agosto de 2019.