Luanda - A Constituição da República de Angola ("CRA") garante o respeito pela dignidade da pessoa humana e reconhece a inviolabilidade (artigos 30.° e 31.° da CRA), como fundamento da soberania e da independência, da paz, da justiça, da liberdade, democracia, solidariedade igualdade e progresso social (artigo 1.° da CRA). Cumpre, neste sentido, destacar que o legislador constituinte, pretendeu, sem sombra de dúvidas, outorgar à categoria dignidade humana o carácter de Princípio Basilar de toda ordem constitucional do nosso Estado Democrático de Direito (artigo 2.° da CRA), marcando desta feita uma marca distintiva na ordem constitucional angolana, que realça a primazia da pessoa humana sobre o Estado, ou seja, o poder estatal existe em função da pessoa e não o contrário. Segundo ensinamento de Bacelar Gouveia, a dignidade da pessoa humana não é conferida pelo ordenamento jurídico. Ele limita-se a reconhecer e respeitar, visto que é uma qualidade intrínseca à pessoa humana.

Fonte: Club-k.net

Edson Bettencourt ensina que a dignidade da pessoa humana enquanto princípio e valor fundamental, não pode ser estabelecida e concedida normativamente, mas deve ser pressuposta antologicamente.


Ante esta condição antológica, convém sublinhar que a dignidade da pessoa humana está enraizada na estrutura essencial do homem e fundamenta-se no seu ser. Dito de outro modo, a pessoa, só pelo facto de o ser tem dignidade, tal como diz o texto magno "é inviolável".


Inviolabilidade e protecção da dignidade da pessoa humana, entende-se que o Estado se constitui na obrigação de além de repelir qualquer acção ou intenção de a violar, criar condições para que as pessoas vivam e o façam com dignidade. Por ser uma condição própria e inerente à pessoa, a dignidade humana constitui um valor absoluto.


Decorrente da interpretação conjunta dos artigos 1.°, 2.° e 226.° da Constituição da República de Angola, a violação do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, constitui:


■ violação do Estado Democrático de Direito;
■ violação da Soberania Popular;
■ violação do Princípio Democrático e;
■ violação da Constituição da República de Angola.


Ademais, violar o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, sobre o qual se funda o Estado, representa ofensa grave a todo ordenamento jurídico angolano.


Faz alguns anos que de forma cíclica se vem assistindo ao agravamento dos efeitos das alterações climáticas, sobre as regiões Centro e Sul de Angola, agravado por acções de expropriações de terra aos cidadãos autóctones, além de políticas segregacionistas na gestão fundiária, que tem afastado das fontes de água as populações nos períodos de seca, sem adicionarmos a fórmula a ausência absoluta de políticas públicas viradas a solução sustentável do problema. Uma gritante e brutal violação do Princípio dos Princípios - a vida como derivação do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.


Não é demais reavivar que, o expresso reconhecimento da dignidade da pessoa humana como núcleo da Constituição da República de Angola, significa sobretudo que o legislador constituinte pretendeu defini-la como princípio estrutural que confere unidade de sentido e de valor à ordem constitucional angolana. Deste modo, a dignidade da pessoa humana é um valor superior e fundamental, que fundamenta e legítima o poder e toda actividade estatal angolana, uma vez que a Constituição criou uma ordem de valores centrada na pessoa humana.


No âmbito das tarefas fundamentais do Estado (artigo 21.° da CRA) a Constituição impôs um rol acções que implica sua protecção, promoção do desenvolvimento, melhoria dos índices de desenvolvimento humano, protecção as minorias, com o objectivo de criar as condições necessárias para que as pessoas vivam de acordo com a sua dignidade inerente.


O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana enquanto fundamento do Estado, não pode ser definido como um direito fundamental autónomo, mas sim como um pressuposto comum a todos os direitos fundamentais considerados invioláveis e inalienáveis.


Na mesma linha Jorge Miranda entende que, "de modo directo e evidente, os direitos, liberdades e garantias pessoais e os direitos económicos sociais e culturais comuns têm a sua fonte ética na dignidade da pessoa, de todas pessoas".


De acordo com o disposto no artigo 115.° do Texto Magno, no acto de posse, o Presidente da República eleito, com a mão sobre a Constituição da República de Angola, presta juramento, em que entre outras promessas, a defender a paz, defender a independência, a soberania (...). Este juramento tem seu fundamento no Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, por ser o monumento sobre o qual todos valores do Estado repousam. Portanto, a violação deste Princípio pressupõe violação do juramento.


Dada a escalada da catástrofe humanitária que se vive no Centro e Sul de Angola, a Constituição da República de Angola, impõe ao Chefe de Estado, ouvida a Assembleia Nacional, declarar, nos termos da alínea p) do artigo 119.°, o estado de emergência, dada a incapacidade de resposta do Estado, por limitação de recursos. Esta acção justifica-se pela necessidade de preservação da vida humana, derivação maior do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e maior bem jurídico digno da máxima tutela da Constituição. A Constituição que o Presidente da República jurou cumprir e fazer cumprir.


Violar o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana corresponde a violação do Estado Democrático e de Direito? Que consequências políticas advêm de tal lesão?


Se partirmos da premissa de que a soberania e a independência da República de Angola, o objectivo fundamental da construção de uma sociedade livre, justa, democrática, solidária, de paz, igualdade social e o Estado Democrático de Direito se baseiam na Dignidade da Pessoa Humana, a resposta a indagação é afirmativa. Taxativamente, violar o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana é a mais grave forma de inconstitucionalidade, porque pressupõe violação de toda ordem constitucional, incluindo o Estado Democrático e de Direito.


Em situações de normalidade institucional, nos termos do artigo 129.° da Constituição da República de Angola, um terço dos Deputados em efectividade de funções teria tomado a iniciativa do processo de destituição do Presidente da República, com fundamento na violação e atentado grave ao Estado Democrático e de Direito, por via da violação do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.