Luanda - No dia 15, do corrente mês e ano, lemos um artigo escrito pelo Dr. Lazarino Poulson no Club-K, no qual questiona: Deverá ser juiz de carreira o presidente do Tribunal Supremo? Alegramo-nos imenso pelas, se nos permitem, brilhantes ideias nele vertidas, pelo que, aconselhamos a sua leitura.

Fonte: Club-k.net


Vale reproduzir algumas das ideias deste insigne jurista:


“A combinação entre magistrados e profissionais de direito (...), também chamados de “juízes de mérito”, tem sido um binómio profissional mais usual para preencher as cortes supremas (tribunais supremos e tribunais constitucionais) nos países de Direito democráticos”.


“(...) sob o ponto de vista da presidência, há duas correntes de opinião em Angola: a “corrente da magistratura de carreira” – segundo esta tese só pode ser Presidente (e Vice-Presidente) do Tribunal Supremo um juiz de carreira; e a corrente da “magistratura alargada” – segundo esta tese pode presidir e coadjuvar o Tribunal Supremo qualquer magistrado (juiz de carreira ou juiz de mérito) deste órgão superior do nosso sistema judicial”.


“Em nossa opinião, a corrente da exclusividade da magistratura de carreira não é sustentável. Não faz sentido impedir que um jurista de mérito que ascende ao Supremo não possa presidi- lo, uma vez que todos juízes daquela instância devem estar em pé de igualdade, gozando dos mesmos direitos e obrigados aos mesmos deveres”. (negrito nosso) “Por isso, não é boa a ideia de colocar no mesmo tribunal “magistrados de primeira” (juízes de carreira) e “magistrados de segunda” (juízes de mérito)”.


“A pretensão de corrigir e prevenir eventuais males no provimento do cargo de Presidente do Tribunal Supremo deve ser guiada pelo bom senso, equidade e igualdade”.

É realmente preciso bom senso, equidade e igualdade, bem como reconhecer que ao Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Supremos colocam-se mais problemas de administração ou gestão, pois ele raras vezes julga, e quando o faz, fá-lo em Plenário. O Presidente gere uma instituição pública e, acima de tudo, pessoas. É preciso não confundirmos a função do Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Supremo com o de um Juiz Conselheiro integrado neste mesmo órgão numa das suas Câmaras.


Pensemos então: será mesmo justo que o Presidente do Tribunal Supremo seja necessariamente um juiz de carreira? Será que deve ser este o requisito chave para o provimento ao cargo? Ou devemos lançar mão a outros critérios realmente decisivos e desapaixonados, como a qualidade técnica e a probidade na gestão da coisa pública?


Ora, ser juiz de carreira não torna um juiz conselheiro automaticamente bom gestor, nem é a conditio sine qua non para que ele seja imparcial e independente. Deixemo-nos disto. É preciso ter experiência/aprendizado na administração de instituições públicas (e se possível privadas), ter outras experiências profissionais, e é necessário que essas experiências sejam positivas. Há juízes de carreira que nunca geriram “nada”, nem mesmo um tribunal inferior. Afinal, “quem só direito sabe, nem direito sabe”.


Parece-nos, salvo melhor opinião, que a tese da magistratura de carreira visa afastar infundadamente, mas com classe, os juristas de mérito. Desculpem-nos a indelicadeza. Doutro modo não se entende este tratamento, pois o que está em jogo é apenas a realização da justiça e a boa gestão do Tribunal Supremo e do Conselho Superior da Magistratura Judicial, logo o critério deve ser o da qualidade, do mérito, da respeitabilidade, da responsabilidade, da probidade e da confiança.


Temos de colocar de lado os links e/ou as famosas “influências”; precisamos de pessoas competentes! Por isso, chega de fazer discursos inflamados de “pretensa legalidade” e “cientificidade”, quando o que muitos querem é confundir a opinião pública, subvertendo a ordem normal das coisas, ofuscando o mérito, para que o presidente seja alguém com índole duvidosa e apto a satisfazer os interesses de alguns e não já da justiça. Temos de lançar um olhar inquiridor a esses “iluminados” que criticam “tudo e parecem ter sempre razão”. É preciso não provocarmos essa luta entre juízes e pensar no bem da justiça e do Tribunal Supremo. É legal que um Juiz Conselheiro de mérito presida este órgão. Então que vença o melhor!


Ora, para o provimento de um cargo tão importante como este, num órgão que é actualmente o “centro das atenções” no combate à corrupção, onde se lida com dinheiro público e milhares de pessoas (todo o país), é necessário encontrar-se um Juiz (de carreira ou jurista de mérito) que seja alguém ponderado, idóneo, com notável inteligência técnica e emocional, ecléctico, que seja bom líder (e não “chefe”), que tenha o seu nome imaculado, com experiência bastante na boa gestão de pessoas e instituições públicas, que seja comprometido com a justiça e não com o poder, que quer servir e não já ser servido, que tem um projecto sério para a instituição, uma conduta social irrepreensível, não tenha ligações políticas, que seja imparcial e independente.


Uma das grandes valências dos juízes de mérito é o de carregarem uma experiência multifacética que permite o estabelecimento de relações internas e externas mais profícuas, de uma gestão participativa e a realização de julgamentos mais justos e conformes (é por isso que foram providos a juízes conselheiros – pela qualidade ou mérito, pela abnegação e compromisso com a justiça). Em regra, estes conhecem os dois lados da moeda.


Com a saída do Dr. Rui Ferreira, ficamos curiosos e fomos visitar à página do Tribunal Supremo (www.tribunalsupremo.ao) para apreciarmos o curriculum de cada um dos juízes conselheiros em efectividade de funções. Ficamos felizes por saber que há Conselheiros que têm uma vasta experiência quer no âmbito da magistratura (anterior à sua nomeação no Supremo), quer na gestão de instituições públicas e no exercício de outras profissões (têm bagagem de sobra), para além de constatarmos que os mesmos não têm os seus nomes na “lista negra” (corrupção), gozando de uma “ficha limpa”. Pensamos que estes, uma vez que já presidiram, como magistrados e de modo notável, determinados tribunais, já exerceram outras profissões e dirigiram outras instituições

públicas e têm uma conduta socialmente irrepreensível, respondem melhor as necessidades do Tribunal Supremo.


É tempo de se dar tempo ao mérito, à transparência e à boa governação, e não mais às “influências” e ao “jogo de interesses políticos” vestido de cientificidade. É preciso colocar nesse lugar pessoas humildes, humanas, inteligentes, íntegras, bons juristas e bons gestores.

Chegados a este ponto, voltamos a perguntar: será mesmo justo e conforme o direito instituído que o Presidente do Tribunal Supremo seja um juiz de carreira?


É uma reflexão simples! Prestemos bastante atenção aos ditos “iluminados”.

FIGUEIREDO FRANCISCO DALA