Luanda - O réu Jorge Gaudens Sebastião confirmou esta terça-feira, em tribunal, que a transferência de USD 500 milhões do BNA para o Crédit Suisse de Londres (Reino Unido) serviria de garantia para o sindicato de bancos estrangeiros financiar um pretenso fundo de investimento a Angola de 30 mil milhões de Euros.

Fonte: Angop

O director da empresa Mais Financial Service (MFS) prestou esta declaração durante a 2ª sessão de julgamento do caso que envolve, também, José Filomeno dos Santos “Zenu” e Valter Filipe, que na altura eram presidente do Fundo Soberano e Governador do Banco Nacional de Angola, respectivamente.


O aludido sindicato de bancos estrangeiros, que nunca apareceu durante as negociações, segundo Jorge Gaudens Sebastião, é constituído pelos bancos BNP Paribas, um dos maiores da Europa, Boucle, Bankinter (espanhol), Royal Bank do Canadá e HSBC Bank do Brasil.

O empresário Jorge Gaudens, de 41 anos, é tido como intermediário do suposto “embuste”, fazendo a ligação entre o Estado angolano e o aludido sindicato de bancos estrangeiros, que tinha à testa Hugo Wonda Weter, um cidadão estrangeiro.


O alegado financiamento de 30 mil milhões de euros serviria para, presumivelmente, ajudar a financiar o programa do governo, pós eleições de 2017, de diversificação da economia e estabilização macroeconómica.

Jorge Gaudens Sebastião explicou que, como garantia, o Estado angolano enviou 24 milhões de euros, por via da empresa MFS, de sua propriedade (intermediário), para suportar “vários serviços urgentes”.


Considerou que esse dinheiro era apenas a “ponta do iceberg” dos USD 500 milhões que o governo angolano transferiu do BNA para uma conta no Crédit Suisse de Londres, Inglaterra.

No depoimento, Jorge Gaudens Sebastião, afirmou que desconhecia que se tratasse de uma fraude contra o governo angolano.

A novela do suposto embuste

Jorge Gaudens é proprietário de sete empresas, entre elas a Brumangol, Mais Financial Service e o extinto banco Mais (ex-Pungu-a-Ndongo), que lhe rendiam AKZ 12 milhões/mês.

Descreveu que, no primeiro contacto com os bancos estrangeiros, pretendia obter um financiamento para as suas empresas desenvolverem o trabalho de assistência e montagem da rede nacional de controlo de qualidade, porém foi remetido ao sindicato dos bancos estrangeiros, liderado por Hugo Wonda Weter.

Ao invés de financiar os seus projectos, alegou, responderam-lhe que a instituição sindical possuía uma proposta de financiamento para um fundo de garantia ao Estado Angolano.

À instância do júri, informou que numa reunião de concertação em Portugal, orientou Hugo Wonda Weter a enviar uma carta/proposta do aludido fundo ao Presidente da República, à data dos factos, José Eduardo dos Santos.

Confirmou ter sido ele a levar a carta ao seu amigo de três décadas e colega de escola, o ex-presidente do Conselho de Administração do Fundo Soberano de Angola, José Filomeno dos Santos “Zenu”.

Este, por sua vez, levou a carta ao seu pai, o ex-presidente da República, que depois de analisar o dossier, orientou o então ministro das Finanças, Archer Mangueira, o governador do BNA, Valter Filipe, e o presidente do Fundo Soberano a representarem o governo de Angola nas negociações com o sindicato dos bancos estrangeiros, em Lisboa, Portugal.

Contrariamente ao que se esperava, disse, o sindicato dos bancos nunca se fez presente, surgindo apenas o suposto intermediário dessa instituição, Hugo Wonda Weter, actualmente em parte incerta, que justificou a ausência dos bancários com o facto de a reunião ter sido “muito rápida”.

Segundo o reú, realizou-se então uma segunda reunião em Londres, com o mesmo cenário de Lisboa, a que se seguiu outra em Luanda.

Contou que depois disso, o então ministro das Finanças, Archer Mangueira, elaborou um memorando, sugerindo ao Presidente República que tivesse cautela, pela falta de credibilidade e transparência dos aludidos credores.

De acordo com o despacho da acusação, lido na sessão, “a informação de Archer Mangueira enviada ao ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos, não soou bem entre os supostos negociadores, tendo sido substituído no processo pelo ex-governador do BNA, Valter Filipe, que viria a transferir os 500 milhões de USD para o banco londrino, em Junho de 2017.

Jorge Gaudens Sebastião avançou que “houve uma desorganização no BNA porque, a dada altura, perguntaram ao ex-governador do banco central se havia feito a transferência dos valores. Primeiro respondeu que não, mas depois confirmou que sim”.

“Como é possível ter-se dúvidas da transferência, ou não, de um valor tão avultado”, questionou-se, concluindo que do resto só se apercebeu depois que o governo angolano intentou uma acção nos tribunais de Londres para reaver os valores.

A sessão retoma quarta-feira (11) com audição de Zenu dos Santos.