Luanda - Dr. Junior Mawete, é o nosso convidado para abordar as enumeras estratégias de segurança marítima e os seus benefícios para o desenvolvimento de uma economia Azul na região marítima do Golfo da Guiné.

Fonte: Revista Negocios 

É IMPRESCINDÍVEL UMA ABORDAGEM INTERSETORIAL E INTEGRADA

Dr. Junior Mawete é Administrador Executivo da empresa Francesa OCEA Shipyard estudou a segurança Marítima e entendeu muito bem a grande importância dos mares, o seu conceito de poder marítimo foi bastante influente e baseou-se na ideia de que os países com maior poder naval teriam um maior impacto mundial. Esta foi uma das razões pelas quais se assistiu á ampliação das marinhas de vários países.

 

Como é que avalia a actual situação geoestratégica das marinhas sedeadas no Golfo da Guiné?

O Golfo da Guiné é uma das regiões mais dinâmicas no sector energético global e é de importância crítica para o desenvolvimento económico de grande parte da costa atlântica africana.


Os rendimentos derivados dos hidrocarbonetos dão aos Estados africanos da região uma forte base financeira para investir em iniciativas de desenvolvimento. Igualmente, muitas das rotas comerciais que ligam a África ao resto do mundo passam pelo Golfo da Guiné. Noutras palavras, a segurança marítima “offshore” está intimamente ligada ao desenvolvimento e à segurança em terra firme.


Nos últimos dois anos, o Estados da África Ocidental e Central demonstraram o seu compromisso em apoiar e proteger o desenvolvimento da economia azul no Golfo da Guiné.

 

África e o mundo de uma maneira geral, ainda vivem uma situação de insegurança marítima. Como mudar este quadro?

A segurança marítima tornou-se uma questão muito mais ampla do que o controlo por parte das marinhas (controlo naval). A marinha holandesa descreve a segurança marítima da seguinte forma: a segurança marítima implica a proteção contra (surpresa!) ações inimigas, sabotagem, actividade subversiva, terrorismo e crimes organizados.

Esta segurança (integral) cobre três áreas: pessoal, física e da informação. Operar no domínio marítimo significa que, alem das medidas de segurança habituais, um comandante que é responsável por uma determinada operação deve também estar atento às ameaças e vulnerabilidades específicas que possam surgir neste domínio.

Actualmente, a segurança marítima engloba um conjunto complexo de questões, tanto de actividades públicas como de actividades privadas, e às vezes com interesses opostos.

 

Que avaliação faz das ameaças que o sector marítimo e petrolífero enfrenta nos dias de hoje, com a pirataria, o contrabando e fundamentalmente o terrorismo, uma vez que Angola não está ausente deste prisma?

O domínio marítimo enfrenta ameaças por parte de nações, de terroristas, de pesca não regulamentada, da ruptura natural e ambiental, da migração em massa e das actividades criminosas organizadas, como contrabando e pirataria.

Nos últimos tempos, a segurança marítima tornou-se uma questão muito mais ampla do que o controlo por parte das marinhas também sensibilizar a comunidade internacional sobre a necessidade de uma maior coordenação sobre a segurança marítima, que tem afectado particularmente a região do Golfo da Guiné, com acções criminosas prejudicam a economia petrolífera.

“Daí a importância de se tratar o tema nas duas vertentes, segurança marítima e energética, porque há um bom número de países produtores de petróleo na costa ocidental do continente africano, particularmente no Golfo da Guiné e isso, por si só, dá a importância deste tema e, sobretudo, a realização deste evento em Angola”.

 


Quais são os grandes riscos que os países do Golfo da Guiné enfrentam, uma vez que existem leis que protegem a segurança no domínio marítimo e que politicas devem ser adoptadas para suprir os riscos que assistimos?


Há necessidade de se alargar o corredor da costa ocidental do oceano Atlântico, desde o sul até ao norte da Guiné-Bissau, melhorando assim a coordenação dos Estados sobre a matéria de segurança marítima na região do Golfo da Guiné, que ainda se limita a oito países, e tem sofrido particularmente com o fenómeno da pirataria.

Além da segurança marítima e energética, também existem aspectos relacionados com a pesca, particularmente a invasão de navios em águas territoriais de outros países para a pesca ilegal, imigração ilegal, nomeadamente o estudo deste fenómeno e a feitura de uma maior regulamentação para a circulação na região do Golfo da Guiné, e o ambiente, no que se refere à questão da poluição marítima, como derrames de petróleo.

Gostaria também de observar que nem sempre é o poder militar a fornecer ou a negar a segurança no domínio marítimo. A natureza recorda-nos que ainda controla parte da nossa segurança marítima.

Infelizmente, tsunamis desencadeados por terramotos e tufões com chuvas fortes também fazem parte das nossas vidas. Não podemos evita-los, mas podemos tentar mitigar os riscos estando devidamente preparados, educados e treinados para lidar efectivamente com as consequências desses desastres.

Ao longo dos anos, muitas leis, regras e regulamentos foram desenvolvidos para o domínio marítimo.

Cito os mais importantes: Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), varias leis nacionais e internacionais, a Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar (SOLAS), a Convenção Internacional sobre Busca e Salvamento Marítimo (SAR), a Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios (MARPOL), a Convenção para a Supressão de Actos Ilícitos (SUA), o Código Internacional para a Protecção dos Navios e das Instalações Portuárias (ISPS) e varias resoluções do Conselho de Segurança da ONU.

As regras estão definidas; infelizmente nem todos os países as ratificaram e nem toda a gente age de acordo com a lei.

 

Referiu que as regras estão definidas e que infelizmente nem todos os países as ratificam, até que ponto os países estão organizar-se para mudar este quadro?

No Ocidente, temos assistido a uma clara mudança de foco da região do Atlântico para a região do Pacifico e especialmente para o Sudeste Asiático. Os interesses marítimos de muitos países nesta área tornaram-se mais visíveis, impulsionados por um maior desenvolvimento e crescimento do comércio. As marinhas estão a expandir as suas frotas submarinas e de superfície, e a importância de uma guarda costeira bem organizada está a tornar-se cada vez mais clara. Enquanto a ameaça de pirataria e de assaltos perto do Corno de África parece ter sido reduzida, assistimos agora a um aumento destas actividades criminosas nas águas do Sudeste Asiático e nas águas próximas da África Ocidental, como o golfo da Guiné.

 

Defende que o poder naval e o controlo dos mares, são as chaves para o sucesso na política internacional?


Sim, a costa marítima de África, tanto do Atlântico quanto do Índico, continua a enfrentar grandes desafios de segurança, não obstante um número considerável de países do continente depender muito do mar, quer como sua principal via para levar produtos aos mercados regionais e internacionais, quer como espaço de actividade económica estratégica como a exploração petrolífera

A região do Golfo da Guiné é afectada por fenómenos de pirataria e de tráfico de droga, de armas e de seres humanos, sendo utilizada por grupos terroristas subsarianos que se misturam com imigrantes ilegais para alcançar a Europa, nomeadamente através do corredor da Líbia

 

Quais são os grandes objectivos da empresa OCEA?

Bem o objectivo da nossa empresa OCEA, é reforçar a capacidade das forças africanas e ajudar a contrapor a pirataria, com recurso a exercícios comuns que, por vezes, têm sido realizados para obter uma abordagem comum e garantir a segurança. “Um desses exemplos é o código de conduta que engloba as nações da região para que sejam alcançados objectivos preconizados”,


Como é que olha para a segurança marítima como factor estratégico de desenvolvimento em África?

No período pós “guerra-fria” a dinâmica evolutiva dos conflitos acompanhou a dinâmica da evolução dos Estados, tendo-se assistido a uma mudança radical da intensidade e principalmente da tipologia e da regionalização da conflitualidade. Estes conflitos trans-regionais transitaram para o interior dos Estados e mais recentemente para os mares internacionais e para as águas costeiras sob jurisdição nacional, caracterizando uma nova conflitualidade que, fazendo-se nos mares, tem impacto nas populações e na economia em terra.

Talvez por este motivo e desta forma, e muito por via da “globalização” da conflitualidade marítima regional, assistiu-se em África a uma fragilização da capacidade dos estados e das suas estruturas sociais, políticas e militares, com reflexos directos numa incapacidade estrutural em garantir a salvaguarda da sua soberania e em combater a marginalidade e o crime no mar. Cumulativamente, a permeabilidade das fronteiras marítimas e alguma fragilidade governativa resultou num aumento das dificuldades dos estados africanos em exercerem a soberania e o controlo das suas costas e especificamente da sua Zona Económica Exclusiva (ZEE) e das águas internacionais (incluindo as rotas marítimas) de sua directa jurisdição. Este aspecto causou uma perturbação crescente no Sistema Político Internacional, revelando-se uma permanente ameaça transnacional à segurança global, demonstrando que o factor “segurança no mar” é primordial na consolidação do “desenvolvimento em terra” e que ambos são actualmente elementos estratégicos no desenvolvimento sustentável no continente africano.

Neste contexto, a nova geopolítica dos conflitos em África, associada à fragilidade dos estados africanos, tem levado a Comunidade Internacional a intervir crescentemente neste continente, com vista a contribuir para a consolidação da paz e criando condições para melhorar a segurança e o desenvolvimento, sendo nas costas oceânicas da África subsariana que a sociedade internacional, por via maioritariamente das Nações Unidas, da União Europeia e da Organização do Tratado do Atlântico Norte tem vindo a intervir com maior frequência e intensidade.

Até que ponto a instabilidade e insegurança nos mares preocupa a vossa instituição?


No entanto, o aumento da intensidade das actividades no mar está a realizar-se num cenário de insegurança, onde as várias formas de tráfico ilegal, a acentuada degradação do ambiente marinho, a perda da biodiversidade e os consequentes efeitos agravados sobre as mudanças climáticas globais são cada vez mais uma realidade actual. Sabemos ainda que os oceanos e os mares estão interligados e a acção num mar ou numa determinada área económica tem um impacto directo ou indirecto noutro mar e pode ter efeitos positivos ou negativos sobre outros espaços geopolíticos marítimos contíguos. Da mesma forma, o uso cada vez mais intenso dos oceanos e mares por vários sectores, combinado com as alterações climáticas, o aumento da pressão sobre o ambiente marinho, tem conduzido a um incremento na poluição e na degradação desregulada dos recursos piscatórios e do meio ambiente marinho em geral.

 

Em termos gerais, quais sãos os grandes desafios da área marítima?

Os mares e os oceanos sempre constituíram, ao longo da História da humanidade, uma importante fonte de recursos e consequentemente de conflitos. São fundamentais para o desenvolvimento e para a segurança das sociedades, em especial para as comunidades ribeirinhas que dependem, direita ou indiretamente, quer seja na actividade económica diária de pesca de subsistência ou na indústria extractiva quer ainda como vector de comunicação e elemento gerador de recursos estratégicos, do mar como factor de identidade, subsistencia e motivo de constantes disputas e de conflitos.

Como factor geopolítico, mais recentemente, o mar veio transmitir um novo relevo às problemáticas da maritimidade, conferindo uma crescente importância geoestratégica aos mares e oceanos, pois grande parte do comércio e da economia mundial cruza estes espaços, tendo por esse motivo impacto na economia global e na segurança mundial. Assim, países e organizações passaram a definir sistemas e mecanismos nacionais de protecção e a articular (nas organizações onde estão inseridos) políticas, mecanismos de cooperação e a definirem estratégias consentâneas com os seus interesses de protecção e salvaguarda dos recursos hídricos e da afirmação da soberania sobre os seus espaços marítimos. Pois que, as ameaças e os riscos que incidem sobre os mares e os oceanos são agora mais evidentes, transnacionais e carecem de estratégias de maior alcance, só possíveis de desenvolver integrados em Organizações Regionais, Continentais (caso da UA) ou Internacionais, que funcionam, actualmente, como os principais responsáveis, na sua área de jurisdição conjuntural, pela protecção e salvaguarda dos recursos no mar e pela assunção das responsabilidades de exercer soberania de defesa e de desenvolvimento marítimo no seu “Domínio Marítimo”.

 

Na sua óptica qual é o papel da economia azul ou economia do mar e como é que os países do Golfo da Guiné podem tirar proveito?

Economia do Mar tem a ver com utilizar e explorar o Oceano, a economia do mar inclui as actividades tradicionais como a pesca, a aquicultura e as indústrias de processamento; a extracção de petróleo e gás offshore; o transporte marítimo de carga e de passageiros; as instalações portuárias e a logística; as infra-estruturas e obras marítimas; a construção naval e reparação; o fabrico de estruturas marítimas; o turismo de cruzeiros, o turismo costeiro, a náutica de recreio, o desporto e a cultura; e o ensino, formação e investigação científica. Inclui também as actividades emergentes como as energias renováveis do oceano (eólica, ondas e marés); a biotecnologia marinha (biocombustíveis, recursos genéticos, farmacêuticos); a mineração em águas profundas; a defesa das áreas marítimas, a segurança de pessoas e de bens, a vigilância marítima, entre outras.

Economia Azul tem a ver com utilizar e proteger o Oceano. A ‘nova’ Economia Azul adiciona sustentabilidade à ‘velha’ Economia do Mar. A Economia Azul junta o mar e os seus actuais e futuros usos, às regiões, à indústria e às pessoas, alinhando interesses e conciliando expectativas, contribuindo para o desenvolvimento sustentável das comunidades.

“Economia azul é uma economia do mar sustentável, resultante do equilíbrio entre a actividade económica e a capacidade de longo prazo dos ecossistemas oceânicos para suportar essa actividade, permanecendo resilientes e saudáveis.”

O futuro passa, inquestionavelmente, por perceber e aproveitar o Mar. Com sabedoria, respeito e proveito. Existe hoje um novo vocabulário azul, fundamental para descobrir e aproveitar as oportunidades. Conhecer, cuidar e utilizar de forma inteligente, são os pilares da relação que importa desenvolver com o oceano e os países do Golfo da Guiné devem aproveitar no máximo todos os recursos ao seu dispor para alavancar as suas economias pondo em marcha políticas que vão de acordo a economia azul.

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