Luanda - O analista político Belarmino Van-Dunem considerou hoje pouco provável uma candidatura da empresária Isabel dos Santos nas próximas presidenciais em Angola, em 2022, face à necessidade de recuperar a imagem, resolver questões judiciais e eventualmente criar um novo partido.

Fonte: Lusa

"Se (Isabel dos Santos) dos Santos estiver a pensar em 2022, creio ser uma miragem pouco realizável", pois a empresária precisaria de tempo para se preparar, defendeu o analista, em declarações à Lusa.

 

A empresária, filha do antigo Presidente José Eduardos dos Santos, cujas contas bancárias e participações em empresas angolanas foram recentemente arrestadas, admitiu na quarta-feira, numa entrevista à RTP, a possibilidade de ser candidata à presidência de Angola e queixou-se de estar a ser perseguida para ser neutralizada politicamente.

 

Para Van-Dunem, se a nível externo, a desmultiplicação de Isabel dos Santos em entrevistas e declarações através das redes sociais pode permitir alguns ganhos reputacionais, internamente "não será fácil obter um score político favorável", nos próximos tempos.

 

Além disso, segundo a Constituição da República de Angola, a filha do ex-Presidente teria de se candidatar como cabeça de lista de um partido ou coligação de partidos, já existente, ou criar um novo, "o que daria trabalho", considerou.

 

"Seria pouco realista, ainda para mais tendo em conta que tem de resolver os problemas que enfrenta com a justiça em Angola e que está fora do país há dois anos", disse o especialista, ressalvando que tudo vai depender "das dinâmicas" que se vão desenvolver "nos próximos tempos, sobretudo durante este ano".
Questionado se Isabel dos Santos conseguiria conquistar apoio no partido do seu pai, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), no poder desde a independência do país e liderado por João Lourenço, também Presidente angolano, mostrou dúvidas quanto à existência de fações internas no partido.

BELARMINO REJEITA A EXISTÊNCIA DE UMA FAÇÃO NO SEIO DO MPLA


"O que se ouve falar, de uma divisão no seio do MPLA, não é percetível na prática. Quem é de facto o rosto da outra fação? Não existe", disse o académico, sublinhando que, para fazer uma análise era preciso saber quem seria este grupo de pessoas que defendem uma alternativa à atual direção do partido e que estes se apresentassem com listas concorrentes num eventual congresso.

 

"Propala-se tanto esta divisão, mas não se conhece ninguém que publicamente não vá manifestando o seu apoio ao Presidente João Lourenço. Quando há uma iniciativa do MPLA acabam por estar lá todas as figuras, quer aquela figuras de proa do MPLA que durante muito tempo estiveram ao lado de José Eduardo dos Santos, quer a juventude que está a agora a ascender no partido. Até hoje ninguém se manifestou publicamente ou deu sinais de que estariam dispostos a integrar uma outra fação", notou.

 

Sugeriu, no entanto, que pode vir a ser criado um outro partido "de pessoas do MPLA que não estejam satisfeitas", mas se terá adesão de militantes destacados ou personalidades com alguma popularidade "só vendo na prática".

 

Para Van-Dúnem, a declaração de intenções de Isabel dos Santos surge num contexto de "contrabalanço" do processo que está a atravessar em Angola e em Portugal.

 

"É uma auto-defesa. É preciso criar um outro viés, de que este não é apenas um processo judicial", fazendo "manchetes" sobre outros assuntos, em vez de se falar do arresto de bens ou do enriquecimento supostamente ilícito, comentou.

 

Sobre se a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA, oposição) irá beneficiar das convulsões internas no MPLA, o analista afirmou que o principal desafio para as próximas eleições presidenciais será o novo eleitorado que se irá apresentar para votar, sobretudo jovens nascidos em 2002 ou 2003 e que não têm ligações com o passado nem memória histórica que os vincule ao partido do poder, o que pode refletir-se num eventual enfraquecimento do MPLA.

 

"Há uma mudança no eleitorado em Angola bastante profunda", salientou Van-Dúnem, acrescentando que são eleitores com "novas expectativas" e que exigem um novo "discurso", ao qual os partidos se têm adaptado.

 

Van-Dúnem considerou que o discurso anti-corrupção que João Lourenço tem adotado "agrada" ao eleitorado, mas notou as dificuldades em concretizar objetivos, numa altura em que o país está a tentar recuperar de uma profunda crise económica, beneficiando indiretamente os partidos da oposição face ao "desgaste" do MPLA.