Luanda - A corrupção é o maior obstáculo às relações comerciais entre Angola e os Estados Unidos, defende o presidente da Câmara de Comércio Americana em Angola, considerando que a visita do chefe da diplomacia norte-americana vem aproximar os dois países.

Fonte: Lusa

Em entrevista à Lusa, antecipando a curta visita do secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, a Luanda na segunda-feira, Pedro Godinho Domingos, considerou que além dos problemas económicos "que resultam da crise financeira que o país atravessa", a corrupção é o maior obstáculo à atração de empresas norte-americanas.

Acredita, por isso, que a visita de Pompeo vai focar-se em aspetos como o combate à corrupção, transparência e 'compliance' (conformidade com a lei), pois foi devido à falta de adesão de Angola a esses princípios que o país foi perdendo acesso à banca e aos mercados internacionais o que "afetou catastroficamente a economia", aumentando as dificuldades para fazer pagamentos no exterior.

O presidente da Câmara de Comércio (AmCham) lembrou que o combate às más práticas é também fundamental para o Governo norte-americano, que criou uma lei federal anti-corrupção FCPA (Foreign Corrupt Practices Act), prevendo sanções para as empresas envolvidas em atos de corrupção em atividades internacionais.

"No passado, o sistema em Angola era fortemente corrupto (...). Naturalmente, num ambiente como este as empresas não tinham como competir com as de outras latitudes que não olhavam [a corrupção] como um obstáculo nas relações comerciais", o que levou ao afastamento do mercado angolano.

"O desenvolvimento futuro de Angola passa por uma aproximação mais forte aos Estados Unidos e a presença de Mike Pompeo vai trazer vantagens para o relacionamento internacional", destacou o presidente da AmCham.

Angola é um dos parceiros estratégicos dos Estados Unidos em África, a par da África do Sul e Nigéria, e para Pedro Domingos Godinho a vinda de Pompeo surge como "uma confirmação" do interesse dos Estados Unidos por este mercado.

É também "uma forma direta e indireta de anunciar ao mercado angolano e ao mundo que os EUA têm Angola como um ponto de chegada", sinalizando o interesse em reforçar as relações comerciais, políticas e estratégicas com o país.

O empresário vê também na visita do secretário de Estado "um sinal de apoio e solidariedade com a luta heroica que o Presidente João Lourenço está a desenvolver" contra a corrupção e que exige "muita coragem".

"Estamos todos a pagar o preço da corrupção", reforçou, indicando que esse preço se traduz no encerramento de empresas, "famílias desestruturadas, crianças a sair do sistema de ensino e cidadãos que vão para cama sem fazer uma refeição".

Mike Pompeo deverá ter também em agenda a discussão de questões relacionadas com diferendos comerciais entre Angola e Estados Unidos que estão a decorrer em tribunais norte-americanos.

"Onde quer que esteja um representante do Governo americano, há de defender sempre os interesses dos seus cidadãos e os das suas empresas (..) Não me admira que, em carteira, constem dossiês ligados a essas empresas e esses processos", disse.

Pedro Domingos defende a criação de uma parceria institucional entre os Estados Unidos e Angola focada nas políticas de corrupção, transparência e 'compliance' e espera que a visita se traduza numa aproximação entre os dois governos, sugerindo que um encontro entre o chefe de Estado angolano, João Lourenço, e o seu homólogo norte-americano, Donald Trump, ajudaria o Presidente dos EUA "a conhecer melhor as mudanças que estão a ocorrer em Angola".

Esta aproximação institucional enviaria também "uma mensagem ao tecido empresarial americano" de que Angola "está a viver uma nova era e constitui um mercado para investir".

Atualmente, Angola conta com cerca de 60 empresas norte-americanas, com predominância para os setores de petróleo e gás, "o setor tradicional que sempre atraiu os norte-americanos a esta parte do mundo".

O ponto mais alto das relações económicas entre os dois países registou-se em 2008 quando as trocas comerciais atingiram os 20,9 mil milhões de dólares (19,3 mil milhões de euros), dos quais 18 mil milhões (16,6 mil milhões de euros) correspondentes a produtos vendidos para os Estados Unidos.

Dez anos depois, o montante não ia além dois 3,8 mil milhões de dólares (3,5 mil milhões de euros), com Angola a exportar 2,1 mil milhões de dólares (1,9 mil milhões de euros).

"Houve um declínio exponencial nas trocas comerciais porque os Estados Unidos deixaram de absorver o petróleo produzido em Angola", comentou.

Para o responsável da AmCham, o ambiente de negócios "está a melhorar a cada dia que passa", com um acesso mais facilitado às instituições que representam o Estado e respostas mais rápidas às solicitações.

Mas "a mentalidade não muda da noite para o dia e é necessário que haja um engajamento em torno da necessidade de haver essa mudança", sublinhou, acrescentando que para atrair investimentos é preciso "desenvolver o sentimento patriótico".

Mike Pompeo viaja para Luanda a 17 de fevereiro para um encontro com o Presidente de Angola, João Lourenço.

O Departamento de Estado norte-americano indicou, numa nota, que os objetivos da visita visam discutir "os esforços de anticorrupção e democratização", assim como relações económicas bilaterais com Angola, num encontro onde também vai estar presente o ministro dos Negócios Estrangeiros angolano, Manuel Augusto.

Mike Pompeo deverá também "encontrar-se com agentes económicos e a comunidade empresarial para discutir a luta contra a corrupção e os crescentes comércio bilateral e oportunidades de investimento".

Este ano será o 27.º de relações bilaterais, sendo Angola o terceiro maior parceiro comercial dos Estados Unidos da América (EUA) na África subsariana.

A visita de Mike Pompeo a Angola acontece um mês depois de o Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação ter revelado 715 mil ficheiros, sob o nome de 'Luanda Leaks', que detalham esquemas financeiros da filha do ex-Presidente, Isabel dos Santos, e do marido, Sindika Dokolo, que terão permitido retirar dinheiro do erário público angolano, utilizando paraísos fiscais.