Luanda - No dia 29 de Janeiro de 2020, a UNITA avançou com uma providência não especificada de suspenção da eficácia de acto administrativo da decisão do, Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ), que designa o candidato Manuel Pereira da Silva “Manico” para ocupar o cargo de presidente da, comissão nacional eleitotal (CNE). O Tribunal Supremo respondeu por via de uma despacho alegando que a UNITA não tem legitimidade para interceder nos processos de designação do Presidente da CNE. Face a isso o Club-K, pede-me para analisar a resposta do “despacho”  do Presidente do  Tribunal Supremo, Joel Leonardo  que a partido declaramos ser “ilegal”.

Fonte: Club-k.net 


Existem definitivamente interesses inconfessos que animam os membros do TS que integram o Conselho Superior da Magistratura Judicial e que estão envolvidos no processo relativo à designação do Presidente da CNE.

 

A lei estabelece que o cidadão em causa, Dr. Manuel Pereira da Silva “Manico”, não pode tomar posse perante o Plenário da Assembleia Nacional enquanto não forem decididas as reclamações (e recursos) legítimas que pendem sobre a matéria junto dos órgãos competentes. 


Depois de a UNITA ter interposto junto da Câmara do Cível do Tribunal Supremo uma providência cautelar a solicitar a suspensão da eficácia do acto decisório do CSMJ, não há registo de que os juízes daquela Câmara tenham reunido para decidir sobre a questão e emitido o respectivo Acórdão.


A UNITA, por sua vez, não foi notificada de qualquer Acórdão. Não recebeu nenhum Ofício do Presidente do Tribunal Supremo sobre qualquer decisão tomada. 

Todavia, surgiram relatos segundo os quais certas entidades interessadas na ilegalidade e na corrupção dos órgãos judiciais teriam informado o Senhor Presidente da Assembleia Nacional que todas as providências cautelares e outras reclamações já foram respondidas. Ao mesmo tempo, alguém do Tribunal Supremo, ou em seu nome, terá telefonado para a Secretaria Geral da UNITA, no decurso da semana, informando que já havia decisão do corpo de juízes do Tribunal e que deviam mandar alguém para “ir buscar”. 


Foi entregue ao estafeta que lá foi um “Despacho”, não assinado, sem o timbre do Tribunal, sem Número, sem Referência, sem um Ofício assinado e sem a respectiva Notificação. Este documento apócrifo, que se anexa, tem manuscritas as datas de 10 e 11 de Fevereiro de 2020 e faz referência a um “Proc. N.º 135/2020”.

 

O texto de duas páginas termina assim: “Assim sendo, o Partido Político UNITA, aqui Requerente, é parte ilegítima na presente Providência, situação que tem como consequência o indeferimento liminar do Requerimento inicial. Nestes termos, não resta outra alternativa a este Tribunal, senão, a de indeferir liminarmente a presente Providência de Suspensão de Eficácia de Acto Administrativo, ao abrigo do disposto na parte final da al. b) do n.º 1 do art.º 474.º do CPC, aplicável ex vi ao Contencioso Administrativo por via do n.º 2 do art.º 1.º do Decreto-Lei n.º 4-A/96, de 5 de Abril (Regulamento do Processo Contencioso Administrativo) ”.

Pouca vergonha!


Vamos assumir por um instante que se trata de uma posição legítima, do próprio Tribunal, que o documento é autêntico mas que as forças de bloqueio à mudança de paradigma no País não tiveram a coragem de o assumir ou que, quiçá, não constitui ainda o documento final. Escapou….!  Assumamos isso por um instante.


Então a UNITA, força constituinte da República de Angola, não tem “legitimidade” para defender o interesse público, participar na vida política e contribuir para a protecção das liberdades fundamentais e dos direitos da pessoa humana? 


Então a UNITA, que compõe, constitui e integra o Plenário do órgão de soberania Assembleia Nacional, diante de quem o candidato escolhido deverá tomar posse, não é parte legitimamente interessada?


Sendo a UNITA uma força representativa do soberano cujos direitos o CSMJ já ofendeu e o candidato pode vir a ofender, por falta de idoneidade, como pode ela não ser parte legítima para defender os direitos constitucionalmente protegidos dos cidadãos? Se a UNITA não é parte legítima, quem tem tal legitimidade? 


Como é possível que a entidade que tem o direito e os poderes para designar, nos termos da Constituição e da Lei, tanto os juízes que integram o TS como os comissários que integram a CNE, não seja parte legítima para intervir num processo corrompido, eivado de ilegalidades cometidas por juízes para agredir a soberania nacional e sufocar o interesse público? 


Esse “Despacho” é ilegal, ou melhor, é inválido, é nulo, à partida, porque viola a Constituição e a Lei.


Já existe jurisprudência (Lei) do Tribunal Supremo que reconhece a UNITA como parte legítima para interceder nos processos de designação do Presidente da CNE. 


Em primeiro lugar, existe o Acórdão exarado sobre a Providência Cautelar interposta sobre a decisão do CSMJ que designou ilegalmente a Dra. Suzana Inglês e à qual o CSMJ havia reagido negativamente em parte com o mesmo argumento da “ilegitimidade da UNITA” - Processo N.º 57/2012 – O TS decretou: “…Resulta do art. 12 da Lei n.º 2/94, de 14 de Janeiro, que o recurso contencioso deve ser obrigatoriamente precedido de reclamação ou de recurso hierárquico. No entanto, em respeito ao princípio do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva (art. 29.º, n.º 1 da CRA) é jurisprudência já assente neste Tribunal que, todo aquele que se sinta lesado nos seus direitos ou interesses legalmente protegidos pode recorrer contenciosamente. Assim sendo não procede o ora alegado”.


Em segundo lugar, por via de Acórdão exarado sobre o Processo n.º 291/2012 – relativo à acção principal sobre o mesmo assunto, a Câmara do Cível do Tribunal Supremo, em nome do povo, decretou o seguinte:


“…Resulta do n.º 1 do artigo 102.º do D/L nº 16-A/95, de 15 de Dezembro que “Têm legitimidade para reclamar ou recorrer os titulares de direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos que se considerem lesados pelo acto administrativo”. Em face da posição em que se encontram os recorrentes podemos afirmar que estes têm um interesse legalmente protegido ao abrigo do artigo 17.º da Constituição da República de Angola e, como tal, têm legitimidade para intentar o presente recurso”.


Sendo o “Despacho uma decisão individual e sendo o “Acórdão” uma decisão colectiva, como pode agora um “Despacho” pretender anular um “Acórdão”? O Tribunal deve apreciar o mérito da causa e obrigar o CSMJ a explicar ao País as razões que o levaram a:

Integrar no grupo de juízes que serviu de júri do processo um presidente que não era na altura membro do CSMJ, e, portanto, este sim, não tinha legitimidade para integrar o Júri.

Admitir como válidas duas candidaturas cujos proponentes estão impedidos por lei de prover o cargo de Presidente da CNE, por já serem comissários eleitorais em exercício de funções e já terem atingido o limite de mandatos estabelecido por lei. 

Não proceder à avaliação das candidaturas com base nos critérios “idoneidade moral”, “idoneidade cívica” e “probidade”, que são aqueles que a lei estabelece para orientar a designação dos membros da Comissão Nacional Eleitoral, a todos os níveis (Artigos 7.º, 21.º, 34.º e 37.º da Lei n.º 12/12). 

Por seu turno, a ser verdadeiro o “Despacho”, o Tribunal Supremo deve explicar ao País porque é que pretende encobrir a corrupção do CSMJ que se verificou na escolha de uma entidade cuja idoneidade é amplamente contestada para dirigir um órgão que deve ser incorruptível. Porque não manda simplesmente anular o processo corrompido? Que interesses pretende defender?


Nem o Tribunal Supremo deve alimentar a convicção de alguns de que o combate à corrupção não abrange os actos que impactam a lisura e a transparência na organização e condução dos processos eleitorais, nem a Assembleia Nacional deve permitir-se servir de palco para se exprimir uma violação grosseira à Constituição e à Lei, um acto de traição à “vontade soberana do povo” de combater decididamente a corrupção para ter processos eleitorais livres, justos, transparentes e credíveis. 


A seleção de uma entidade não idónea para dirigir a CNE é o primeiro passo para lhe serem “ditados” os resultados eleitorais na forma de “ordens superiores”.


Por último, importa referir que, se o autor do Despacho for o presidente do TS, Dr. Joel Leonardo, torna-se mais preocupante porque esta entidade actou como juri do processo em sede do CSMJ, estando por isso impedido de participar em qq fase do processo de reclamação.

Mihaela Webba

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