Luanda - Tenho, frequentemente, observado órgãos do Ministério do Interior, especialmente a Polícia Nacional (PN) e o Serviço de Investigação Criminal (SIC), a mostrarem, em conferências de imprensa, rostos de supostos marginais e, desta observação, posso concluir que a PN e o SIC têm violado o princípio da presunção da inocência, consagrado no artigo 67.° da Constituição.

Fonte: Club-k.net

Entre milhares de casos de violação do princípio da presunção da inocência, o mais recente é a imagem exclusiva da detenção de Bento Kangamba (BK) que - não ainda se sabe por que razão - vazou nas redes sociais.

 

É pena que, infelizmente, eu não possa responsabilizar civil e criminalmente os agentes do Serviço de Investigação Criminal que terão vazado - sem fins inconfessos - as imagens exclusivas da detenção de Bento Kangamba (BK). Se eu tivesse poder para isso - confesso - os autores do vazamento dessas imagens já estariam em maus lençóis.

 

Não é possível que, em pleno estado democrático e de direito (vide artigo 2.° da Constituição), ainda haja no SIC sujeitos que não saibam que a presunção de inocência é uma garantia constitucional de um arguido e que ninguém está acima da lei, como diz o artigo 67.° da Constituição da República.

 

Ao vazar as imagens exclusivas da detenção de BK, os agentes do SIC, na minha humilde forma de pensar, não só tentaram passar a imagem de que estão acima da lei, assim como violaram uma garantia constitucional que a Lei coloca à disposição dos cidadãos. É por essa e outras que estou, com este artigo de opinião, a fazer uma denúncia internacional por violação dos direitos fundamentais.

 

A PN tem violado e abusado, de facto, o princípio da presunção da inocência. Há dias, por exemplo, um agente afecto à corporação filmou uma senhora que supostamente furtou o multicaixa do patrão dela, o ex-governador de Luanda, Bento Bento.

Depois de filmar, o vídeo vazou nas redes sociais. A publicação do vídeo constituiu, mais uma vez, uma clara violação do princípio da presunção da inocência. No vídeo, de um minuto e cinquenta e dois segundos, a senhora assume a autoria do crime. Apesar da alegada confissão, ela ainda goza da presunção de inocência. Logo, o agente não deveria ter partilhado o vídeo.

 

Por outro lado, em países cuja justiça é séria essa confissão não teria nenhum valor, simplesmente porque a "acusada" estava desacompanhada de um advogado. Confissão sem advogado, em países sérios, é anulada por cerceamento do direito de defesa!!! Aliás, boa parte dos agentes do SIC e da PN, no que ao esclarecimento de crimes diz respeito, são um desastre, já que só conseguem obter confissão de crimes através de torturas e outros tipos de tratamentos desumanos.

 

E saber que os mesmos estão/continuam impunes... Sabem como me sinto? Sinto-me como aquele recruta que, disciplinado, segue rigorosamente o seu comandante em direcção a um abismo para se suicidar.

 

A par da PN e do SIC, alguns órgãos de comunicação social, sobretudo a Televisão Pública de Angola (TPA) e o Jornal de Angola, também têm violado o princípio da presunção da inocência nas suas notícias e/ou reportagens atinentes a crimes ou casos de polícia.

 

Espanta-me, ainda, que a TPA já tenha exposto rostos de supostos meliantes que, depois de dois dias ou meses, foram soltos pelo Ministério Público por insuficiência de provas. Ora, sendo assim, resta perguntar e exigir uma resposta convincente: como fica a imagem dessa pessoa que, depois de exposta ao vivo e a cor, passou a ser vista como altamente perigoso, bandido ou gatuno? Onde fica a presunção garantida pela Constituição? Quem paga por isso?!

 

Precisamos, e é urgente, de pôr fim a esses abusos de parte de alguns agentes do SIC, PNA e de alguns órgãos de comunicação social.

Littera
04.03.2020