Luanda - O meu sonho foi interrompido, às 4h00 da manhã ao sentir fortes e insistentes batidas do meu portão. Questionei-me: “o que será”? Do outro lado, ouvi uma voz familiar. Era o MM, iniciais de Maurício Makemba, o nosso fotógrafo. Abri a porta e indaguei: “o que se está a passar”? De repente respondeu-me que não havia tempo a perder. “Time is money” (tempo é dinheiro).

Fonte: JA

De uma forma peremptória e altiva, como se estivesse a dar uma ordem, atirou-me o seguinte: “lava a cara e as axilas porque vamos para uma missão de serviço no Moxico. Da morte de Jonas Savimbi nem uma palavra. Ele fechou-se em copas. Esta situação, como é óbvio, gerou em mim uma certa expectativa. Estamos no terminal da Força Aérea, minutos depois, embarcámos num avião YAK-40 e rumámos em direcção ao Luena. Depois de mais de uma hora de voo, a aeronave fez-se à pista. Pasme-se! Só no Luena tive conhecimento da morte de Jonas Savimbi.

 

Partimos num helicóptero MI-8 para Lucusse, o teatro de guerra. Senti-me como um peixe na água, por razões óbvias. Aterrámos no Lucusse. O quadro era deprimente e desolador. Deparámo-nos com o homem de Muangai prostado, mórbido e inerte. Era um cenário patético. O velho maquisar estendido numa tarimba onde geralmente as populações nativas estendem o peixe caqueia, uma espécie do rio muito conhecida naquelas paragens. Estava crivado de balas, sem beira nem eira.

 

Apesar do acontecimento, o ambiente era distendido. No local, estavam figuras de proa do meio castrense angolano. Aqui e ali os militares trocavam impressões, de orelha em orelha. Num certo perímetro, as tropas garantiam segurança da área. Era preciso esfriar os ânimos e o entusiasmo. Do meu baú de recordações, busco intensa movimentação de jornalistas. Uns com as esferográficas e blocos de notas, outros com gravadores em riste. Entre muitos, recordo-me do Alves Fernandes e do Madeira. No local, também estava uma legião de jornalistas estrangeiros, todos ansiosos por obterem informações mais detalhadas sobre a situação.

 

O oficial Carlitos Wala nem teve mãos a medir, para descrever minuciosamente o desenrolar dos acontecimentos. Carlitos Wala, tido como o estratega da missão, esteve na perseguição de Savimbi. Disse que não foram favas contadas. Ele e a tropa palmilharam vários quilómetros e desbravaram caminhos, “varrendo” vários bastiões de resistência até atingir o último reduto.

 

Tenacidade, bravura, estoicismo e prontidão combativa foram os elementos-chave e decisivos para o êxito da missão. O ex-chefe do Estado Maior da Força Aérea, General Hanga, com serenidade, falou sobre a participação daquele ramo das Forças Armadas na missão militar. A poucos passos de onde jazia Jonas Savimbi, com vários objectos na cintura, um punhado de pessoas, maioritariamente mulheres, entoavam cânticos na língua local. Eram cerca de 11h00. O sol estava abrasador. No calor da refrega, o desfecho de uma página da epopeia que ditou a paz em Angola…