Luanda - O anúncio da interpelação, pela Polícia, do cidadão Januário Catengo, em Benguela, proveniente de Luanda, na cabine de um camião de carga, a caminho do Namibe, onde é juiz, causou, naturalmente, estupefacção multipla ao angolano comum.

Fonte: JA

A revelação, feita, na capital, faz amanhã uma semana, pelo subcomissário da Polícia Nacional, na conferência de imprensa diária sobre o estado da pandemia no país, com transmissão radiofónica e televisiva directa, deixou de boca aberta quem a ouviu. Por ser um juiz , por ter passado pela cerca sanitária que isola Luanda das outras províncias e por se fazer transportar numa viatura pesada no lugar destinado ao ajudante de camionista. A juntar a tudo isto, ter sido em público, com o nome e funções profissionais do visado.


À admiração de quem ouviu a novidade seguiu-se a reacção. Uns, de contentamento, com manifestações como “desta vez é a sério, todos têm de participar, gostem ou não”. Na luta, acrescento, contra um inimigo sem rosto, que continua a matar no mundo inteiro. Outros, a torcer o nariz. Entre estes, os que evocam a lei, a interpretam - não estão incluídos os que somente agora se lembram ou descobrem poder aproveitar-se dela - e os leigos na matéria, a maioria, que facilmente deixa o coração tolher a frieza do raciocínio, algo que se impõe neste fase importantíssima da vida de todos nós, sejamos médicos, enfermeiros, qualquer actividade que desempenhemos na área da Saúde, barricada insubstituível no combate à pandemia. Como insubstituível é, igualmente, o sector da Segurança, cuja incumbência é impedir que a inconsciência seja outro vírus a comprometer o presente e o futuro angolano.


O caso do juiz interceptado, já em Benguela, proveniente de Luanda, num veículo pesado de transporte de mercadorias, no lugar destinado ao ajudante de camionista, a caminho do no Namibe, onde trabalha, levanta uma série questões. Especialmente de ordem ética, que vai além do consagrado na lei, principalmente em pleno Estado de Emergência, decretado, atempadamente, para tentar evitar repetições de cenários de dor, lágrimas e luto registados em países de vários latitudes melhor preparados do que nós, em termos humanos e instalações sanitárias.


À participação nesta etapa que Angola é forçada a viver, mais uma, estamos todos convocados, sem excepção e a maioria não tem olhado a sacrifícios de toda a ordem. O decreto presidencial não esqueceu casos excepcionais. Nesta situação, contam-se aqueles que, para exercerem as obrigações profissionais, estão autorizados a circular na via pública fora das horas interditas a outras pessoas, desde que na posse de documentos comprovativos da situação.


Por qual motivo o cidadão Januário Catengo tentou regressar ao Namibe naquela data, já com cerca sanitária a Luanda, sem um documento a explicar por que viajou numa viatura pesada de mercadorias, no lugar destinado ao ajudante de camionista? Foi ele, na capital, sujeito a testes de detecção da Codiv-19? Andou a espalhar a doença por onde passou e com quem esteve? São perguntas que o próprio e os que foram lestos a defendê-lo e condenar quem o criticou podem responder.


O coronavirus é mortal, de fácil contágio, não há, para já, medicamento que o aniquile, nem vacina que o evite. Desafiá-lo, seja em que circunstância for, é, no mínimo, um acto de inconsciência. Mais, este vírus já provou que não quer saber de estatutos sociais. Ataca Presidentes e Chefes de Governo, fidalgos e humildes, ricos e pobres, letrados e analfabetos, religiosos e ateus, criminosos e gente de bem.