Luanda - As sociedades modernas que são felizes são aquelas que são aptas de progredir, dando passos qualitativos em frente, sem recuar no tempo e no espaço. As sociedades infortunadas são aquelas que são inaptas, incapazes de progredir, limitadas a fazer passos lentos, reversivos e rotativos, como faz o camaleão. Figurativamente, o camaleão é uma pessoa volúvel que muda constantemente de aparência a fim de disfarçar-se no meio ambiente e alcançar os intentos malévolos. Este comportamento instável, de carácter egocêntrico, contraria o espirito da solidariedade, que busca o bem comum, que é essencial para a vida humana. Pois, a Vida é inviolável e é o bem supremo, consagrada na Constituição.

Fonte: Club-k.net

Portanto, os valores e os princípios consagrados na Constituição, em forma de leis, são de cumprimento obrigatório. A sua revisão ou alteração deve passar por trâmites legais, previamente estabelecidas. Somente na vigência do absolutismo em que as leis eram sujeitas à vontade pessoal do rei, do imperador ou do czar. Naquela altura o soberano (o ditador) se colocava acima das leis, e as leis serviam apenas os interesses da nobreza. O povo era oprimido e explorado, sujeito à ditadura da classe dominante. O sistema absolutista era caracterizado pela «arbitrariedade». As leis feitas pela classe dominante eram impostas ao povo e não eram aplicadas e respeitadas pela classe opressora.


O agravamento da injustiça e da arbitrariedade despertava a consciência das classes oprimidas que vinham tendo o fôlego de enfrentar decididamente as ditaduras absolutistas e estabelecer a nova ordem social e política. Esta Revolução Popular de libertar-se do jugo da tirania passou por várias etapas cruciais de resistência titânica até a derrocada do esclavagismo e do feudalismo, que culminou com as duas Guerras Mundiais, que terminaram em 1945. Seguida pela Proclamação Solene da Declaração Universal dos Direitos do Homem, em 10 de Dezembro de 1948. A partir daquela data todos os Estados-Membros das Nações Unidas eram obrigados a respeitar os Direitos Fundamentais do Homem e submeter- se ao Estado de Direito, como forma de governação.


Porém, os Estados Socialistas assente na Doutrina Marxista-Leninista, do Partido Único, não respeitaram os princípios democráticos do Estado de Direito. As leis mantiveram-se intactas como antes, serviram apenas os interesses da nomenclatura partidária, com objectivo primário de sustentar o Poder Político. O bem-estar do povo era ignorado, servindo-se apenas de objeto de retórica ideológica para ocultar a ditadura e distrair a opinião pública. No final da Guerra Fria, em 1989, muitos Países Socialistas foram forçados a alterar o quadro constitucional no sentido de integrar-se no mercado internacional assente na economia de mercado. Só que a alteração da Constituição não alterou igualmente a Doutrina. Os Conceitos do exercício do poder político mantiveram-se intactos. Ou seja, a Teoria não coincidia com a Práctica. Os modos de operar e de fazer as coisas foram mantidos inalterados. O sistema político assumira uma postura ambivalente, tornando-se um paradoxo, sem saber se tratava da democracia capitalista ou do capitalismo do Estado.


No caso específico da China, de partida, definiu o tipo do capitalismo a adoptar. Manteve intacto o sistema do Partido Único, que ficou plasmado na Constituição. Por outro lado, adoptou a economia do mercado, abriu-se aos investimentos estrangeiros, liberalizou uma parte da economia, mas deixou os sectores estratégicos sob o controlo do Partido-Estado. Nestes moldes tem sido fácil lidar com este país, porque o seu jogo está aberto e a «linha divisória» entre o Estado de Direito e o Estado Autoritário é explícita.


No caso particular de Angola, esta linha divisória é oculta, não se sabe se trata do Estado de Direito ou do Estado-Partido. Porque, a Constituição Diz uma Coisa, mas a Práctica do Executivo é Contrária à Constituição. Tomemos o caso concreto em que, a Constituição consagra a pluralidade política, o multipartidarismo e a «liberdade da constituição do partido político». Este Direito Constitucional está consagrado no Artigo 17o da CRA, e no Artigo 4o da Lei no 2/05, de Julho. O Artigo 4o da Lei dos Partidos Políticos dispõe o seguinte: “A constituição dos Partidos Políticos é livre, não dependendo de qualquer autorização, sem prejuízo do disposto nos artigos 5o e 6o da presente lei.”


Infelizmente, na práctica não é isso que acontece. A autorização da constituição de um Partido Político em Angola passa obrigatoriamente pelo «CRIVO» do Bureau Politico do MPLA, sob a orientação expressa do seu Presidente, que é Titular do Poder Executivo. O Tribunal Constitucional ou o Tribunal Supremo são meros instrumentos políticos, que executam as decisões políticas do Partido no Poder. O caso concreto é o do PRA – JÁ, SERVIR ANGOLA, do Abel Epalanga Chivukuvuku. Apesar de ter reunido todos os requisitos legais, o Bureau Político do MPLA ordenou o Tribunal Constitucional para não reconhecer o PRA – JÁ, SERVIR ANGOLA. Mesmo sabendo bem que a credibilidade do Tribunal, das Administrações Municipais, do Notário e do Ministério da Administração do Território estariam em causa. Porque os requisitos legais dispostos nos artigos 5o e 6o, acima referidos, foram expressamente aprovados pelos Órgãos Competentes do Estado, atrás mencionados. Mas, a Ordem Superior, passou por cima de tudo isso. Muita gente sabe o que se passa, porque a informação vem dos círculos internos da própria Direcção do Partido no Poder.


Sem sombra de dúvida, em Angola, o princípio da separação dos poderes e da interdependência dos órgãos de soberania do Estado, que é o cerne do Estado de Direito, não tem a eficácia de lei, só existe no papel. Por conseguinte, na prática, as decisões importantes dos três Órgãos de Soberania de Estado emanam da Cidade Alta, que decide a seu arbítrio. Por ironia, constatou-se que, o antigo Presidente José Eduardo dos Santos era astuto e discreto, sabia ocultar as coisas, viciava o sistema eleitoral, deixava toda gente entrar no jogo político, e mantinha a hegemonia política por via administrativa. Ao passo que, o actual Inquilino da Cidade Alta distrai a opinião pública através da retórica política, uma mistura de sofisma, do populismo e da demagogia, tomando medidas ilegais para afastar previamente os potenciais concorrentes políticos. Sem ter em consideração as leis, a dignidade dos Magistrados e a credibilidade das Instituições do Estado.


A Cidade Alta deve entender que, a estabilidade do Estado depende da credibilidade das instituições. Infelizmente, há muito tempo este elemento deixou de existir como tal. Logo, esperava que seria uma prioridade ao actual Chefe de Estado prestar atenção especial a este elemento, no sentido de restaurar a credibilidade das instituições públicas, a todos os níveis. Infelizmente, está-se a fazer o contrário. Isso é gravíssimo, olhando para a conjuntura interna e externa, em que tudo aparece nebuloso.


Vejamos! A economia angolana está de rastos; a corrupção está intacta e florescente; a pobreza é vasta e extrema; a fome atingiu os níveis assustadores; o sistema de saúde está limitado e frágil; o descontentamento popular agravou-se; a delinquência está altíssima; o desemprego é total; o povo carece da água potável e da luz; as empresas estão falidas; os bancos estão na falência; as divisas sumiram-se; o comércio externo encalhou-se; a alteração climática agrava-se; o mercado petrolífero está na crise profunda; a economia mundial está em ruina. Acima de tudo, o Partido MPLA, que suporta o Governo, está em ruptura.


Obviamente, este quadro acima descrito não é animador para que a Cidade Alta não tivesse a cautela de evitar abrir muitas frentes opostas. Pelo contrário, teria sido o momento de tranquilizar a sociedade; congregar as pessoas; entabular o diálogo inclusivo; buscar os consensos; abrir a sociedade; aproximar as pessoas; apoiar as comunidades; consolidar as conquistas democráticas; investir no campo; estimular a agricultura; transformar o mercado informal; estruturar o comércio interno; e congregar todas as sinergias, para fazer face a este momento dificílimo do covid-19.


É triste quando somos incapazes de aprender com os erros do nosso passado recente. Não é realista manter a mesma mentalidade monolítica, de estar a pensar que, existe um grupinho de pessoas que é dono do país. Este país é de todos nós e só o povo deve ter o poder de decidir de quem deve governar e quando deve ser substituído, para que o país deia um passo qualitativo para frente e não esteja retido no movimento rotativo. Saibas que, nas democracias modernas os concorrentes não são escolhidos por aquele que esteja no poder, nem é admissível conspirar os outros partidos e os seus líderes, utilizando os poderes do Estado. O abuso do poder reside nisso. Como viu-se atrás, esta práctica caracterizava o sistema absolutista da Idade Média. Por detrás desta cultura tirânica escondia-se a incompetência, a corrupção, o egocentrismo, a volúpia e a arbitrariedade.


Se a Cidade Alta estivesse atenta teria descoberto que a classe média, as elites intelectuais, a sociedade civil e as comunidades locais estão desiludidas e revoltadas com tudo que está acontecer. É evidente que está-se diante o desrespeito dos direitos e das liberdades fundamentais (artigos 26o e 27o, CRA), tais como: o direito ao trabalho (artigo 76o, CRA); a liberdade de imprensa (artigo 44o, CRA); a liberdade de expressão e de informação (artigo 40o, CRA). Nesta lógica, a alínea (b) do artigo 21o da CRA, estipula o seguinte: “Constituem tarefas fundamentais do Estado Angolano assegurar os direitos, liberdades e garantias fundamentais.”


Logo, o que está acontecer na TV-ZIMBO é escandaloso. Porque, no Estado de Direito é inconcebível reprimir um Programa virado para a vida das comunidades, como aconteceu com FALA – ANGOLA. Tendo-se afastado os jornalistas deste Programa e ter negado o ingresso na TV-ZIMBO de um cidadão angolano. Só porque ele não pactua com as mentiras e com a má gestão da riqueza do país. Esses actos, de carácter antidemocráticos, deixaram cair o véu, do dito: «novo paradigma». Os procedimentos deste género, que estão acontecer agora indicam, por um lado: o nervosismo exacerbado e a perca do horizonte; por outro lado, a consolidação do sistema autoritário.


Luanda, 04 de Maio de 2020