CARTA ABERTA

ASSUNTO: PEDIDO DE ENTRADA EM LUANDA EM CARÁTER HUMANITÁRIO

Ás vossas excelências,

Pedro Sebastião, Coordenador da Comissão Multissetorial de Combate ao Covid-19 em Angola. E, Silvia Lutucuta, Porta-voz da Comissão Multissetorial de Combate ao Covid-19 em Angola.


Antes de mais queremos expressar o nosso reconhecimento do grande empenho e trabalho que a vossa excelência e a Comissão Multissetorial de Combate ao Covid-19 tem efetuado no sentido de combater esta pandemia que assola Angola e mundo.


Viemos por este meio, expressar a nossa frustração e reclamação no sentido de que a nossa situação mereça alguma atenção da vossa parte.


Não encontramos outro meio para fazer chegar direitamente à vossas excelências a nossa mensagem. Por isso fazemos por essa via.

Excelências, nos somos um grupo de cidadãos angolanos provenientes da república da Namíbia, mais especificamente da cidade de Windhoek, e que atualmente estamos quarentenados no centro de quarentena na Casa da Juventude na província do Cunene.

O nosso grupo é composto por estudantes, doentes e angolanos que se encontravam na república da Namíbia em visita por motivos diversos.

Tendo o primeiro Decreto de Estado de Emergência, decretado pelo Presidente da República João Lourenço, nos encontrado de surpresa dentro da Namíbia, muitos de nós, turistas e visitantes por motivos de saúde, nos vimos presos dentro daquele país, visto que, não tínhamos como entrar na República de Angola por força do decreto de presidencial.

Por esse motivo, recorremos à missão diplomática de Angola naquele país, que arranjou os meios possíveis para que voltássemos a Angola por via terrestre.


Muitos, cientes das condições que teriam que se submeter, neste caso a quarentena de 14 dias na província do Cunene, se negaram voltar para Angola.

Contudo, nós não tínhamos mais meios de subsistência para permanecer naquele país, porque estávamos lá temporariamente pelos motivos citados acima. Restou-nos apenas voltar para a nossa pátria, Angola.

Fomos informados que ficaríamos em quarentena na província do Cunene por 14 dias, cumprindo com o procedimento que a comissão estabeleceu para os cidadãos provenientes do estrangeiro. E que depois da quarentena, cada um de nós haveria de ser encaminhado ou enviado para as nossas províncias de domicílio.

Cumprimos livremente e de bom grado a quarentena, cientes de que era necessário para evitar a cadeia de propagação do vírus. Ao terminar os 14 dias fomos submetidos aos testes de Covid-19, e todos os testes tiveram resultado negativo.

Ficamos a saber dos resultados dos testes por via da televisão.


No dia seguinte uma representante oficial da Delegação oficial do Cunene, veio ate ao nosso local da quarentena nos informar do resultado negativo dos testes. Ou seja, que todos os cidadãos do nosso grupo que viemos da república da Namíbia, não estamos contaminados pelo coronavírus.

Oficialmente ficamos a saber dos resultados dos testes 5 dias depois da data em que supostamente deveríamos ser liberados da quarentena. Somando, já tínhamos 19 dias de quarentena institucional.

Depois de sermos informados sobre o resultado dos testes, foi-nos prometido que antes do dia 10 de maio, dia em que terminaria a 2.ª prorrogação do estado de emergência, teríamos alta e que nos levariam para Luanda, porque Luanda já teria confirmado a nossa recepção.

Passados cerca de 1 semana, continuávamos sem alta e sem notícias da nossa saída e ida para Luanda.

Um representante do governo provincial, veio ter conosco e disse que o pessoal com domicílio em Luanda já não podia ser liberado para viajar para Luanda, por causa da cerca sanitária em Luanda.

Isso criou um sentimento de tristeza e indignação, visto que quando saímos da república da Namíbia, nos informaram que cumpriríamos uma quarentena de apenas 14 dias. E não mais do isso.


Agora que vos escrevemos, completamos hoje (11 de maio de 2020), 29 dias de quarentena institucional, mesmo com os resultados dos nossos testes todos os negativos.

Todo o pessoal que vive em Luanda, esta aqui preso e sem saber quando sairemos de quarentena. Até agora ninguém oficialmente vem nos informar quando iremos ter alta e ser liberados.


A única alegação que nos deram é o motivo da cerca sanitária em Luanda.

Sabemos sim, que exite uma cerca sanitária em Luanda, mas também sabemos que o decreto presencial permite que Luanda receba voos humanitários. Ou seja, é possível entrar e sair de Luanda por motivos humanitários.

Por meio da televisão ficamos a saber que no dia 14 de maio a TAP, companhia aérea de Portugal vai fazer um voo, de Luanda para Lisboa levando portugueses que se encontram retidos em Luanda, devido ao estado de emergência.


Ficamos a saber também por meio da TPA, que no dia 15 de maio, Angola vai começar a receber cidadãos que se encontram retidos na República da Rússia.

A nossa indagação é a seguinte; nós que também somos cidadãos angolanos que estávamos em Windhoek, Namíbia, também não merecemos consideração para entrar em Luanda de maneira humanitária?

Diferente da Rússia ou Portugal, estamos a sair de um país que não tem casos de contaminação comunitária. Um país que não regista novos casos de Covid-19 a mais de 1 mês.


Cumprimos a quarentena, fomos testados com resultado negativo. Será que não podemos entrar em caráter humanitário para Luanda?

Estamos quarentenados por 29 dias, e com a 3.ª prorrogação do estado de emergência, não sabemos quando ao certo sairemos daqui, visto que pelo evoluir da doença é muito provável que o estado de emergência seja prorrogado mais vezes.


Ficamos a saber que teve uma mulher que faleceu em um dos centros de quarentena em Ondjiva. Não sabemos ao certo os motivos.

Ficamos também a saber de outra senhora que veio conosco no mesmo dia com duas crianças, uma das quais recém-nascida com apenas 2-3 meses. Que já cumpriu até agora, como nós, 29 dias de quarentena. Ela bebeu lixivia por estresse e depressão.

As pessoas estão a ficar frustradas e desesperadas. Porque ninguém consegue prestar uma informação concisa e oficial da nossa data de partida daqui. Já foi solicitado a presença de um psicologo aqui, porque tem pessoas a ameaçarem o suicido.

Não queremos que haja mais desastres desta natureza.

Viemos através desta, solicitar a V. Exas. e a Comissão Multissetorial de Combate ao Covid-19 que considere o nosso caso, e permita a nossa entrada em Luanda em caráter humanitário, uma vez que o nosso domicílio é Luanda, e é lá que temos as nossas casas e famílias.

A 3.ª prorrogação do estado de emergência permite os cidadãos trabalharem, mesmo com certas limitações. Muito de nos temos trabalho em Luanda e família para sustentar. Precisamos estar perto das nossas famílias.

Pedimos novamente e encarecidamente que a comissão considere a nossa situação, que nós de alta da quarentena e permita a nossa entrada em Luanda.


Certos que a nossa situação será tratada com a vossa especial atenção. Só nos resta agradecer.

 


Subscrevemos,

Cidadãos angolanos em Quarentena na casa da Juventude da Província do Cunene