Luanda - Os interesses do Estado angolano foram salvaguardados na nacionalização da participação da empresária angolana Isabel dos Santos na Efacec, disse hoje o procurador-geral da República (PGR) de Angola.

Fonte: Lusa

Segundo Helder Pitta Grós, na nacionalização aprovada na quinta-feira, pelo Conselho de Ministros português, "não há nenhum prejuízo para o Governo angolano".


"O Governo português decidiu pela sua nacionalização. É uma atitude soberana, não podemos colocar impedimento", declarou Pitta Grós à comunicação social, em Luanda, acrescentando que os interesses de Angola "estão salvaguardados pelo próprio Governo português nesse ato de nacionalização, pelo que não haverá nenhum perigo de Angola ficar prejudicada".

 

O Conselho de Ministros português aprovou a nacionalização de 71,73% do capital social da Efacec, pertencentes à empresária angolana, filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, que está a ser investigada pela justiça angolana e viu as suas participações sociais e contas bancárias serem alvo de arrestos judiciais nos dois países.

 

A nacionalização decorre da saída de Isabel do Santos do capital da Efacec, na sequência do envolvimento do seu nome no caso 'Luanda Leaks', no qual o Consórcio Internacional de Jornalismo de Investigação revelou, em 19 de janeiro, mais de 715 mil ficheiros que detalham alegados esquemas financeiros da empresária e do marido, Sindika Dokolo, que terão permitido retirar dinheiro do erário público angolano através de paraísos fiscais.

 

Helder Pitta Grós salientou que aquisição da participação de Isabel dos Santos foi feita através de um sindicato de bancos portugueses, que fizeram o financiamento da operação, pelo que não houve da parte do Governo angolano qualquer investimento.

 

"Há sim da parte da ENDE [empresa pública angolana de energia]", adiantou o PGR, reconhecendo que, neste aspeto, estavam "preocupados em defender que não havia qualquer prejuízo" para Angola, questão que foi "salvaguardada pelo Governo português".

 

Pitta Grós lembrou que a participação da ENDE "não foi um processo pacífico e não chegou ao fim porque havia perspetiva de um certo investimento num volume de ações", mas a ENDE não disponibilizou o valor que era necessário e "a participação foi inferior ao que deveria ter sido".

 

"Temos o ministério das Finanças através do IGAPE [Instituto de Gestão de Ativos e Participações do Estado] a tratar essa questão com as autoridades portuguesas", adiantou.

 

Isabel dos Santos entrou no capital da Efacec Power Solutions em 2015, após comprar a sua posição aos grupos portugueses José de Mello e Têxtil Manuel Gonçalves, que continuam ainda a ser acionistas da empresa, enfrentando atualmente o grupo sérias dificuldades de financiamento devido à crise acionista que atravessa.

 

Em agosto de 2018, o ministro da Energia e Águas angolano, João Baptista Borges, confirmou a decisão do Governo de Luanda de retirar a Empresa Nacional de Distribuição de Eletricidade (ENDE) da parceria que mantém com a portuguesa Efacec.

 

Na base da decisão, explicou na altura João Baptista Borges, esteve o facto de a parceria, com operações no domínio da engenharia e energia, ter como condição ser a empresa estatal angolana a procurar fundos públicos para suportar o negócio da Efacec, "sem que tivessem sido salvaguardadas as devidas contrapartidas".

 

Anteriormente, em declarações ao jornal angolano Valor Económico, já a empresária angolana tinha confirmado a ordem do Presidente João Lourenço para a saída da ENDE da Efacec, tendo garantido que, durante o tempo em que liderou a empresa estatal, nunca utilizou fundos públicos na compra de ações da Efacec.

 

A filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos afirmou também que a ENDE nunca chegou a pagar o valor total da sua participação, que desceu de 40% para 16%.

 

"A Efacec foi comprada por 195 milhões de euros e a ENDE custou 16 milhões de euros. Como é que o Estado [angolano] pagou?", questionou Isabel dos Santos, acrescentando que cada acionista teve de fazer a sua parte e pagar pelas suas ações e que adiantou dinheiro para a ENDE "entrar no negócio".

 

A Winterfell tinha uma quota de 66,07% das ações da Efacec, empresa que, em 2017, obteve um crescimento do lucro de 75%, atingindo os 7,5 milhões de euros.

 

As suspeitas de que foram envolvidos fundos públicos datam de agosto de 2015, depois de um decreto presidencial do então chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, autorizar a ENDE a comprar 40% das acções da Winterfell que, cerca de três meses depois, formalizou a compra da Efacec.

 

As dúvidas foram alimentadas pelo facto de o valor que a ENDE pagou pela compra não ter sido revelado.

 

Na altura, o parlamento português perguntou ao Governo de Lisboa para verificar se foram seguidos os procedimentos de combate à lavagem de capitais.

 

As relações da empresa, fundada em Portugal, com Angola, datam da década de 1960.