Luanda - Intervenção na Assembleia Nacional do deputado Franco Marcolino Nhany por ocasião da discussão e votação na generalidade da proposta de lei que aprova a revisão do OGE 2020

Fonte: UNITA

Mais uma vez, Angola depara-se com a necessidade de retificar o seu orçamento pelas mesmas razões de sempre, a saber: Queda significativa da produção e do preço do petróleo, fraca produção interna, falta de liquidez no sistema financeiro interno, política monetária desalinhada com a política cambial, fraca qualidade da despesa pública e insustentabilidade das finanças públicas. Esta é a linguagem dos peritos que, traduzida para a linguagem do povo, significa que os programas e políticas do Executivo refletidos no OGE 2020 e sua proposta de Revisão, não resolvem os problemas dos angolanos.


O País continua amarrado ao petróleo, à OPEP e a uma política de despesas públicas irracional, que desvaloriza o interesse público para proteger as comissões, as avenças, os contratos forjados e outros interesses embutidos no preço final dos produtos importados, só para condicionar a política agrícola nacional e a verdadeira industrialização do País. Por outro lado, a descoordenação entre as políticas monetária e cambial tornaram a estrutura produtiva da economia cada vez mais débil, inibindo o ritmo de crescimento do consumo, da produção e do investimento. A dívida pública já se tornou insustentável, podendo atingir 123% do PIB no final do ano, como prevê o Executivo. Estamos a viver o período recessivo mais prolongado da história do país, fruto de opções erradas na execução de políticas económicas e sociais.


Senhores Deputados


Os angolanos exigem de nós uma nova postura para se alterar o quadro actual. Uma postura mais nacional e menos partidária. Mais política e menos económica. Mais fiscalizadora e nada subordinada.


Tal como a pandemia da Covide 19, a nossa economia exige medidas radicais de emergência para ser combatida e controlada, e não simples revisões orçamentais. Precisamos de aproveitar a pandemia para repensar o País. Repensar o segundo semestre de 2020, repensar os pressupostos e os objectivos do PDN, do OGE 2021 e da sua base de apoio, a Estratégia Nacional de Desenvolvimento de Longo Prazo “Angola 2025”.


Por exemplo: Até quando Angola vai continuar a manter uma economia de enclave, voltada para o exterior e dependente do exterior?


Em termos de objectivos: Estabilização macroeconómica, ou estabilização das barrigas? Vamos priorizar a estabilização macro ou a estabilização micro? Em tempos de crise, Angola deve salvaguardar a estabilidade dos rendimentos dos bancos e de outras grandes empresas, ou deve priorizar a estabilidade social? Deve priorizar apenas o combate à Covide, que mata 3 ou 5 pessoas por dia, ou deve incluir no combate a malária e a desnutrição, que matam mais de mil pessoas por dia?


Perante o alto custo das divisas, deve Angola continuar a priorizar o pagamento de uma dívida de integridade duvidosa ou deve salvar vidas em primeiro lugar? Vamos manter a matriz actual de bens e serviços importados ou vamos alterá-la drasticamente para permitir o desenvolvimento sustentável da indústria nacional com insumos nacionais?

Vamos privilegiar a segurança dos órgãos do Estado ou a segurança alimentar das pessoas?


Senhores deputados, Caros colegas:


Estas perguntas não são dirigidas aos dignos auxiliares do titular do poder Executivo, pois não têm legitimidade para respondê-las nem trazem uma perspectiva política de médio prazo.


Trazem um problema de tesouraria que pretendem resolver com o carimbo habitual do Parlamento. Não é esta a função do Parlamento. Nos termos da Constituição, cabe ao Parlamento apurar e exprimir aqui, de forma sustentável, a vontade soberana do povo em relação a estas questões estruturantes.


Recomendamos, por isso, uma abordagem mais profunda do que deverão ser os pressupostos e os objectivos do OGE para estes tempos de crise e para os pós Covide.


Recomendamos ainda que, no espírito do Decreto Presidencial nº 96/20 de 9 de Abril, todas as despesas consideradas não prioritárias sejam suspensas.


O Parlamento deve, igualmente, redefinir o papel dos municípios na reestruturação da economia e no combate à pandemia. O PIIM deveria fomentar, e não obstaculizar, a autonomia local. Deveria sustentar a descentralização, e não a desconcentração. Deveria empoderar as comunidades, e não os secretários de um Partido político. Os programas do PIIM deveriam ser definidos pelos órgãos eleitos do poder autárquico, e não pelo poder central. Que importa fazer edifícios pomposos para o povo se ele está a morrer de fome, de malária ou de doenças infeciosas agudas? Os recursos destinados aos municípios deveriam ser transferidos para os seus gestores eleitos para que estes elaborem e financiem os seus orçamentos e contribuam de facto para a satisfação das necessidades locais. Autarquias em todos os municípios, simultaneamente, é a receita apropriada para a satisfação das necessidades das populações.


Por fim, Senhores Deputado, o facto de Luanda estar infestada e ter-se tornado ingovernável implica uma reavaliação da política de harmonização nacional e de desenvolvimento territorial. Novos investimentos em Luanda deviam ser congelados. É caso para invocar, aqui e agora, a máxima do Dr Jonas Malheiro Savimbi segundo a qual “Priorizar o campo para beneficiar a cidade”.


Muito obrigado pela atenção!