Luanda - A forma de eleição do Presidente da República, consagrada na proposta C, está formulada da seguinte maneira: «É eleito Presidente da República o cabeça de lista do partido ou Coligação de Partidos mais votado no quadro das eleições gerais, realizadas ao abrigo do artigo 135.º e seguintes da presente Constituição».


Fonte: SA


Acontece, porém, que por força da alínea f) do artigo 159.º da Constituição provisória (Lei Constitucional), que reza que «a separação e interdependência dos órgãos de soberania e independência dos tribunais» constituem princípios que devem ser respeitados pela nova Constituição, o Presidente da República de Angola não pode ser eleito através da sobredita forma de eleição.


Aquela eleição é uma eleição legislativa, isto é, eleição para prover a composição da Assembleia Nacional, Parlamento, e constitui apenas um dos passos para a eleição do chefe do executivo (e também do Estado) no sistema de governo parlamentar. Neste sistema de governo num primeiro passo elegem-se os membros do Parlamento (Assembleia Nacional) e, num segundo passo, este órgão elege o chefe do executivo, que pode ser designado por presidente ou primeiro-ministro.


Ao estabelecerem «a separação dos órgãos de soberania», a alínea f), e «o sufrágio universal, directo secreto e periódico na designação dos titulares efectivos [electivos] dos órgãos de soberania e do poder local», a alínea d), ambas do artigo 159.º da Constituição provisória (Lei Constitucional), estas duas alíneas limitam os sistemas de governo e as formas de eleição dos titulares electivos dos órgãos de soberania a escolher pela Assembleia Constituinte, a assembleia que detém a capacidade de aprovar a nova Constituição. Dito de outra maneira, a actual Assembleia Constituinte não pode (não deve) consagrar nenhum sistema de governo que não respeite a separação de poderes e a eleição directa dos titulares electivos dos órgãos de soberania. Por exemplo, o sistema de governo parlamentar não acolhe a separação entre o executivo e o legislativo, e como tal, não pode (não deve) ser consagrado na nova Constituição da República de Angola. Ao contrário, o sistema de governo presidencial acolhe o princípio da separação entre o executivo e legislativo e como tal pode efectivamente ser consagrado na futura Constituição.

 

A eleição do Presidente da República, por este ser um titular electivo de um órgão de soberania e porque o artigo 159.º da Constituição provisória (Lei Constitucional) o impõe, deve ser feita de forma directa, isto é, pelo povo, sem a mediação de nenhum órgão, e também deve ser uma eleição autónoma, independente, da eleição dos titulares de qualquer outro órgão de soberania; no caso em análise, no momento constituinte que vivemos, tal significa que a eleição presidencial deve ser autónoma, independente em relação à eleição dos deputados, eleição legislativa, contrariamente ao consagrado na proposta C.


A eleição do Presidente da República, eleição presidencial, é (deve ser) formal e materialmente diferente da eleição legislativa, quando se assume o princípio da separação dos órgãos de soberania (o princípio da separação de poderes) como princípio orientador da organização do Estado – o que acontece em Angola, por força da alínea f) do artigo 159.º da Constituição provisória (Lei Constitucional) –. Formalmente, deve-se distinguir a eleição presidencial, usando-se um boletim de voto e uma urna diferentes do boletim de voto e da urna da eleição legislativa. Materialmente, não pode haver um candidato que seja ao mesmo tempo candidato a Presidente da República e candidato a deputado. Mais uma vez, facilmente, se percebe que a fórmula inventada pelo MPLA na proposta C viola a regra ora explicitada.

 

As eleições presidencial e legislativa podem até ocorrer no mesmo dia, mas devem ser separadas, quer dizer, devem existir dois boletins de voto e duas urnas para essas duas eleições. Um dos boletins de voto será usado para a eleição presidencial e um outro boletim de voto deverá ser usado para a eleição legislativa. E, de igual modo, deve-se ter duas urnas, uma urna para a eleição presidencial e uma urna para a eleição legislativa. Só desta maneira fica salvaguardado o respeito pelas alíneas d) e f) do artigo 159.º da Constituição provisória (Lei Constitucional), que de forma inequívoca estabelece os limites materiais do poder constituinte.

 

 A formulação da forma de eleição do Presidente da República de Angola ínsita na proposta C constitui um «nonsense», no plano lógico, e pior, uma grosseira violação do artigo 159.º. Contrariamente ao que vem apregoando, o MPLA, ao escolher essa forma de eleição do Presidente da República, não respeita os limites materiais que são impostos ao poder constituinte.