Luanda - Com a Covid-19 praticamente disseminada por toda Angola, a falta de recursos humanos é uma realidade que deixa a descoberto as debilidades do Sistema Nacional de Saúde Pública. A directora nacional de Saúde Pública, Helga Freitas, admitiu que, além de outras carências, a de recursos humanos capacitados é um desafio para as demais províncias no combate à pandemia, embora estejam formados 15 mil e 367 profissionais a nível nacional. “Este é um desafio para qualquer província, que se faz por municípios e nem todos têm capacidade, em termos de recursos humanos.

Fonte: JA
Não bastam os equipamentos e as infra-estruturas; temos de capacitar os técnicos para este novo desafio que é a Covid-19”, reconheceu Helga Freitas, em declarações ao Jornal de Angola. Garantiu que o Ministério da Saúde (MINSA) está focado na capacitação de técnicos de saúde em medidas de biossegurança.

 

Médica Helga Freitas avaliou que, diante da letalidade da SARS-CoV-2, deve ser observado o cumprimento rigoroso das medidas de distanciamento social, feita a lavagem das mãos e o uso da máscara. “A população, independentemente onde vive, se for educada a lavar frequentemente as mãos, a usar máscara e a ficar em casa, cada um cuidando da sua família, é possível evitar os contactos”.

 

Até ao dia 24 de Agosto, em Angola, apenas Luanda conhecia a transmissão comunitária da Covid-19. A taxa de letalidade estava muito acima de 90 por cento dos casos registados. Todos os municípios urbanos e grupos etários da capital estavam igualmente afectados. Setenta e nove profissionais de saúde não escaparam ao contágio.

 

Diante desta realidade, a directora nacional de Saúde Pública não tem dúvida de que a estratégia é a adopção das medidas constantes no Plano Nacional de Contingência do MINSA para o controlo da pandemia. “É fundamental que as estratégias estejam focadas para o acesso aos serviços médico-medicamentos, desde o nível primário até ao nível terciário de prestação de cuidados e na percepção das decisões das famílias, da comunidade e da população em geral, quanto ao risco de exposição ao vírus, de forma a reduzir a transmissão”, reforçou Helga Freitas.

No âmbito da comunicação e mobilização social, o MINSA pede à população para encarar a pandemia com mais responsabilidade, adoptando medidas de prevenção na sua rotina diária. “Prevê-se que vai levar mais algum tempo até termos disponível a vacina e o tratamento. Portanto, é importante que todos participem com responsabilidade e rigor”, solicitou a responsável pela Saúde Pública nacional.

Intensificar e descentralizar a vigilância epidemiológica, estendendo-a às comunidades com tarefas para cada nível, é outra pretensão da Direcção Nacional de Saúde Pública.

“A comunidade, através das comissões de moradores, agentes comunitários e outros actores, tais como as autoridades tradicionais e líderes religiosos, será chamada para apoiar, particularmente, na vigilância dos casos em isolamento e em quarentena domiciliar, que serão coordenados pelas administrações municipais”, especificou Helga Freitas.

Pacientes assintomáticos

As equipas locais de resposta rápida vão cuidar da implementação do isolamento domiciliar para os casos de pessoas assintomáticas e seus contactos. Será feita a prévia avaliação das condições da habitação e de saúde dos utentes, sem doenças de base, e que coabitem também com pessoas não consideradas de risco.

Feita esta inspecção, “após a assinatura do termo de responsabilidade padronizado, o utente está sujeito a sanções por incumprimento”, avisou Helga Freitas. Segundo a cartilha do MINSA, os casos assintomáticos deverão permanecer num quarto isolado (sem contacto com a família). Mas os restantes membros não poderão sair de casa, nem receber visitas durante o isolamento. As brigadas de vigilância comunitária vão prestar apoio às famílias confinadas.

“.... As equipas de resposta rápida vão avaliar diariamente o caso. Aliás, é um dos critérios para o isolamento domiciliar... As pessoas serão informadas sobre como fazer a monitorização do seu estado de saúde e serão orientadas a comunicar imediatamente, caso haja alterações de sintomas”, explicou a directora nacional de Saúde Pública.

No quadro da pandemia da Covid-19, surge a estigmatização de pessoas infectadas pela doença. A médica Helga Freitas recorda que isto acontece com todas as doenças virais. “O ser humano nem sempre se coloca no lugar do outro. A verdade é que esta doença pode afectar qualquer um de nós. Não tem que haver discriminação. Temos de ser solidários e não estigmatizar quem quer que seja”, aconselhou.

As pessoas que regressam ao país, por causa da Covid-19, estão a ser obrigadas a assinar um termo de responsabilidade. Seguidamente, recebem uma guia para fazer o teste à Covid-19. As equipas locais e membros das brigadas de vigilância comunitária farão o acompanhamento das pessoas nesta condição.

“Após quarentena e teste negativo, a pessoa recebe um título de alta epidemiológica passada pelas autoridades locais de saúde”, clarificou Helga Freitas.
A par do controlo à chegada, mantendo-se a cerca sanitária nacional, há a obrigatoriedade da apresentação de resultado de teste da Covid-19. “O preenchimento obrigatório da ficha de controlo sanitário à entrada e a monitorização dos sintomas de todas as pessoas que atravessam as fronteiras.

As saídas autorizadas das cercas sanitárias provinciais estão condicionadas à realização prévia de testes”, esclareceu. Houve uma redução da capacidade de testar, o que tem dificultado a aferição de um maior número de infecções. É do domínio público que se espera pela chegada de novos testes.

O MINSA pretende assim aumentar a capacidade da rede de testagem com a descentralização do RT-PCR para diagnósticos e igualmente o aumento de testes serológicos para o rastreio entre a população. Isto vai permitir mapearmos melhor e ter maior percepção da epidemia no país”, defendeu a directora nacional de Saúde Pública.

Considerou ser mais importante testar grupos de risco e em áreas prioritárias, por exemplo, nas unidades sanitárias de primeiro nível de atenção, pessoas com doenças respiratórias e pessoas de risco, de um modo geral.

Transmissibilidade

A OMS define que o período de transmissibilidade da Covid-19 é de sete a 10 dias, após o início de sintomas. Estudos mostram que muitos indivíduos com infecção por SARS-CoV-2 permanecem assintomáticos por um período prolongado e a carga viral é semelhante à de pacientes sintomáticos. Estima-se que 16 por cento das pessoas infectadas não apresentam sintomas.

A transmissão do vírus por indivíduos assintomáticos é 25 por cento menor que a transmissão do vírus dos sintomáticos, que é de 75 por cento, de acordo com estudos da dinâmica de “disseminação viral” (isto é, quanto do vírus eles transmitem pela fala ou pela respiração), do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos(CDC).

Entretanto, entre nós, e de acordo com a directora nacional de Saúde Pública, o tempo mínimo de recuperação de um doente com Covid-19 é, normalmente, de 14 a 21 dias. “Mas depende muito. Há pessoas que passaram 40 dias. Nós tivemos casos de famílias que passaram 80 dias…”

Receio dos profissionais e aumento de mortes

A redução de serviços médicos, aliada ao receio de contágio, estará na base do aumento do número de mortes, especialmente de pessoas com doenças pré-existentes. Na óptica da directora nacional de Saúde Pública, a associação destes pressupostos faz todo o sentido, por isso admite: “temos de trabalhar no sentido de quebrar isto. As pessoas têm receio de ir às unidades sanitárias, porque têm medo da exposição ao vírus. O mais importante é resgatar a confiança das pessoas e dar-lhes a protecção necessária”, defendeu.

O receio dos profissionais de saúde também foi questionado, com o que Helga Freitas concordou. “Sim. Mas temos que continuar a trabalhar e fazer as normas. Quando surgiu a pandemia, há seis meses, as normas e o conhecimento sobre a Covid-19 eram diferentes. Hoje, há coisas novas. Por exemplo, sabe-se que um assintomático só transmite 20 por cento da doença e os sintomáticos transmitem 70 por cento…”, sustentou.

Nos últimos dias, correm notícias de pessoas que, padecendo de qualquer outra doença, são atestadas de morte pela Covid-19. Facto que tem causado um clima de suspeição entre a população. “É natural... Mas nós, nas unidades públicas, quando alguém morre, convocamos a família para testar. Quando as mortes ocorrem nas unidades privadas, fica mais complicado controlar...”, argumentou Helga Freitas.

A directora nacional de Saúde Pública alertou que este ano, por causa da Covid-19, “no total das doenças, vai haver um incremento de mortes. Mas, neste momento, mantêm-se as principais razões.

A malária ainda continua a ser a primeira causa de morte”, frisou. Com a previsão da retoma das consultas externas e outros serviços nas unidades hospitalares, a directora nacional de Saúde Pública anunciou que há novas directrizes e regulamentos sobre como as pessoas devem proceder dentro das unidades sanitárias.

As medidas são aplicadas tanto aos profissionais de saúde, quanto aos utentes. Por enquanto, as medidas gerais de prevenção e contenção da pandemia da Covid-19 mantêm-se e para as unidades sanitárias e profissionais de saúde acresce-se a obrigatoriedade de descontaminação diária das áreas e outras medidas de biossegurança.

Vacina

Porque a Covid-19 não tem um tratamento específico, Angola mantém o protocolo que adoptou para tratar as doenças de base que as pessoas infectadas pelo vírus apresentam. A administração de Cloroquina e Azitromicina está a cargo de uma equipa multidisciplinar. Enquanto isso, países finalizam as pesquisas e fazem testes em humanos para encontrar uma vacina que derrube a SARS-CoV-2.

Para a médica e directora nacional de Saúde Pública, a vacina representa a esperança de protecção para as pessoas. “A vacinação será a forma de protegermos a população.

Angola forma parte da iniciativa COVAX (GAVI, OMS, CEPI), uma aliança criada para garantir acesso equitativo de vacinas contra a Covid-19, inicialmente para 20 por cento da população de maior risco dos países de baixa e média renda, estando prevista a vacina para aproximadamente 12 milhões de pessoas de alto risco em Angola.

As restantes vão ser adquiridas com fundos do Governo”, informou Helga Freitas. Enquanto o mundo aguarda expectante pela vacina contra a SARS-CoV-2, a directora nacional de Saúde Pública apela à população a lavar frequentemente as mãos, usar máscara e ficar em casa, ­evitando contactos físicos.