Luanda - O Presidente da República, João Lourenço, defendeu, esta sexta-feira, uma industrialização do continente africano assente numa nova perspectiva de aceleração, ancorada no "Plano Marshall da Alemanha com a África".

Fonte: Angop

O Chefe de Estado angolano assumiu essa posição quando participava, por vídeo-conferência, na Terceira Edição da Cimeira Global de Manufacturação e Industrialização.


No evento promovido pela Agência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (ONUDI), o Presidente João Lourenço sublinhou que o desenvolvimento económico, industrial e tecnológico de África dependerá de uma aposta séria na formação massiva de quadros qualificados nos mais diferentes ramos do saber.

Segundo o Presidente angolano, a aposta na formação deve ser acompanhada da criação de políticas que motivem a permanência desses quadros nos respectivos países.

O Estadista fez notar que “África é um dos continentes com as maiores reservas mundiais de recursos naturais como a água dos rios e lagos, terras aráveis, florestas e abundantes recursos minerais, entre os quais alguns raros e estratégicos, mas que, apesar disso e paradoxalmente, é o continente menos desenvolvido do ponto de vista económico, industrial e tecnológico”.

João Lourenço considerou que “para a actual situação contribuiu negativamente a colonização a que o continente esteve submetido ao longo de séculos e as actuais relações entre África e o mundo industrializado, nas injustas trocas comerciais das matérias primas por nós produzidas e os bens de consumo manufacturados pelos mais desenvolvidos”.

O Presidente da República defendeu que é necessário, não só, que se criem em África “postos de trabalho, mas também que se invista em infra-estruturas como estradas, portos, caminhos-de-ferro, na produção e distribuição de água e de energia eléctrica, assim como nas telecomunicações e tecnologias de informação”.

Se a actual crise oferece uma oportunidade para repensar o desenvolvimento de África, João Lourenço respondeu afirmativamente. “Sim, oferece. Costuma-se dizer que as dificuldades aguçam o engenho porque quando aparentemente nos parece não haver soluções, eis que nasce a criatividade e nos leva a fazer a coisa certa”, afirmou.

No caso concreto de Angola, referiu, “entendemos ser importante criar o ambiente de negócios propício ao investimento privado, coisa que vimos fazendo desde 2018 com a actualização da legislação de protecção da propriedade privada e do investimento estrangeiro, a facilitação ou isenção dos vistos para os investidores e os turistas, assim como o combate acérrimo contra a corrupção e a impunidade, cujos efeitos benéficos na economia e na sociedade já se fazem sentir”.

Assinalou que o país está a melhorar e ampliar a rede de estradas nacionais de todas as categorias, continua a investir no aumento da oferta de água e energia para as indústrias e para as populações e em breve concluirá a montagem do Aproveitamento Hidroeléctrico de Laúca, que vai gerar 2.070 MW de energia para distribuir pelo centro, sul e leste do país.

Privatizações

O Chefe de Estado lembrou que está em curso o processo de privatizações de um número considerável de activos do Estado em praticamente todos os ramos da economia nacional, na agricultura, na indústria, nos petróleos, nos transportes e na banca, entre outros.

Destacou igualmente o concurso para a concessão da gestão do Porto de Luanda, que decorre neste momento, ao que se seguirá processo idêntico para a concessão do Porto do Lobito e do Caminho de Ferro de Benguela, que liga Angola às regiões mineiras do Katanga, na República Democrática do Congo (RDC), e do cobre, na República da Zâmbia.

“Sendo Angola um país rico em recursos minerais, para garantir maior transparência na concessão e exploração dos mesmos, finalmente, o Executivo angolano deu início ao processo de adesão à Iniciativa para a Transparência nas Indústrias Extractivas, o que pode dar maior garantia de investimento privado estrangeiro neste importante sector da nossa economia”, sublinhou.

Sobre a iniciativa das autoridades alemães, o Presidente João Lourenço considerou o “Plano Marshall para África como uma forma de cooperação efectiva para que o nosso continente possa avançar de modo firme e rápido no processo da sua industrialização. Ele pode contribuir para que se criem no nosso continente as condições necessárias para atrair o investimento privado, para conduzir ao crescimento económico e a criação de empregos”.

Na opinião do Chefe de Estado angolano, “este Plano deve focar-se na diversificação económica, no estabelecimento de mecanismos de produção em rede, com uma atenção muito especial na agricultura e nas micro, pequenas e médias empresas”.

A Europa pode ajudar neste domínio, prosseguiu o Presidente da República, dando maiores facilidades de acesso dos produtos africanos ao mercado da União Europeia e diminuindo ou eliminando as barreiras alfandegárias.

De acordo com João Lourenço, a ajuda europeia pode também focar-se no desenvolvimento e na modernização das infra-estruturas básicas como energia, água, vias de comunicação, telecomunicações, bem como reforçar a capacidade das nossas instituições.

“Da mesma forma que em 1948, ao tempo do Presidente Harry Truman, três anos após o fim da Segunda Guerra Mundial o general George Marshall, então Secretário de Estado norte-americano, considerava ser vital a ajuda americana aos países europeus para a sua reconstrução e estabilidade económica e social, tendo nascido o programa de ajuda que ficou conhecido como Plano Marshall, em sua homenagem, também hoje é de vital interesse para a Europa e o mundo ter uma África desenvolvida e com estabilidade económica e social”, defendeu João Lourenço.

Em detalhe, o Presidente João Lourenço explicou como gostaria de ver concretizada a iniciativa avançada pelas autoridades alemãs, ao notar que “o que África pretende é somente a necessidade de manter uma relação de cooperação que seja mais justa, igual e com reciprocidade de vantagens”.

Considerou que, “desta forma, o Plano Marshall para África deve estar assente na reconstrução dos países devastados pelas guerras, na remoção das barreiras ao comércio e na modernização das indústrias”.

Em síntese, referiu, “o sucesso do Plano deverá basear-se nos objectivos da Agenda África 2063, em que a União Europeia e África deverão cooperar a nível político, económico, social e cultural para assegurar o progresso do continente”.

Uso racional dos recursos financeiros

Relativamente à maneira como as organizações multilaterais e instituições financeiras de desenvolvimento devem ser aproveitadas para fomentar o progresso de África, o Presidente João Lourenço argumentou que “o Plano Marshall para África introduz uma dimensão de exigência na aplicação dos fundos dos parceiros”.

No plano foi introduzido o conceito de “parcerias reformistas”, isto é, o apoio dos parceiros bilaterais e multilaterais será tanto mais reforçado quanto mais metas da Agenda da União Africana 2063 sejam alcançadas pelos países africanos.

O Chefe de Estado explicou que “Angola defende que os doadores, as instituições financeiras de desenvolvimento e as organizações multilaterais devem introduzir maior flexibilidade na liquidação de empréstimos, criar novos fundos de resposta à crise e ser mais céleres na implementação das iniciativas”.

“Do nosso lado, fica o compromisso de canalizar os apoios obtidos para as áreas certas e garantir o melhor acompanhamento na execução dos diferentes programas”, garantiu, para referir, em conclusão, que “a fraca liderança dos projectos e a insuficiente articulação com os parceiros, pode ter conduzido no passado ao desperdício de recursos, que hoje mais do que nunca importa evitar”.

O dia de hoje, primeiro da Cimeira, foi reservado a um painel de alto nível, durante o qual se conheceram as ideias que vários Chefes de Estado africanos têm sobre o assunto.