Luanda - Considerações geraisA política faz se com pensamentos e aqui o autor Iko Carreira apresentamos neste artigo, aquilo que o autor considerava, como pensamento estratégico do primeiro presidente de Angola, Dr. Agostinho Neto, com a escassez de pensamentos políticos na nossa praça política actual, entendemos ser utilidade pública parafrasear e publicar este autor, com intuito de realocar o debate politico em torno de Pensamentos, Programas e Agendas nacionais e não em torno de nomes de indivíduos e Partidos Políticos. Parafraseamos o autor de ponto 1 a 16 sem intervirmos nas ideias do autor, escutamos Iko Carreira:
Fonte: Club-k.net
1- ...”O Povo Angolano era (era e é, quer queiramos, quer não), formado por vários grupos étnicos, que falam línguas diferentes, entre os quais se encontra quatro grandes grupos, os ovimbundo, os Kimbundu, os kikongo, os tshokwe e em menor dimensão os tshikuanhama, sem esquecer de maneira nenhuma, os cabinda. E é sobre este fio étnico que gira toda a política angolana, sendo necessária uma verdadeira capacidade de dança política para ser-se líder de Angola”...
2- ...”Neto era marxista e como tal só razões objetivas justificavam os actos e os factos. Acreditava e praticava a luta de classes. A sua luta não era contra os indivíduos com outra cor de pele. Era contra todos os que representavam e defendiam o «colonialismo português». Este era overdadeiro inimigo. E ele devia aliar-se ou lutar conjuntamente com aqueles que combatiam o mesmo inimigo, sem importar a cor da sua pele. Não era entre indivíduos de cor diferente que tinha encontrado alguns dos melhores combatentes contra o colonialismo?”...
3- ... “Mas fora do quadro da luta de libertação, aquilo que melhor o define e classifica, é facto de, embora tudo tivesse para sê-lo, Neto não ser «racista». Este estado, não o conseguiu por ser casado com uma portuguesa de cor branca, mas por razões objectivas ligadas intrinsecamente à sua sólida formação intelectual”...
4- ... “ Durante a visita às instalações do Partido, compreendeu que quem tivesse o controlo das Finanças, podia dirigir a Organização. Assim, a primeira medida que tomou foi no sentido de «controlar» as «finanças» do MPLA.... Numa reunião do Comité Director, Neto propôs que as «finanças» fossem entregues a Eduardo Santos, o único dirigente que não tinha problemas financeiros. Eduardo Santos, médico, trabalhava então numa clínica privada no Congo Léopoldville-hoje Kinshasa, ...
5- “O Comité Director saído dessa Primeira Conferência Nacional, era ainda constituído por Lúcio Lara responsável pela Organização; Manuel Lima para o Departamento de Defesa; Disidério Costa nas Finanças; Mário de Andre nas Relações Exteriores; Deolinda Rodrigues para os Assuntos Sociais; Aníbal de Melo na Informação e eu Iko Carreira, na Segurança”....
6- ... “A sua presença à frente da organização dava confiança e era garantia para os quadros, fosse qual fosse a sua raça. Os luandenses, sobretudo os quadros, viam o MPLA como uma organização oriunda de Luanda, onde militavam filhos e parentes. E Luanda, a capital, sempre foi muito importante para a luta de libertação. Neto tinha consciência disso e nunca entregou, fosse a quem fosse, a direcção da luta de Luanda, que foi sempre da sua responsabilidade”...
7- ...”Segundo Neto, a organização devia concentrar esforços em programas de educação política, na acção militar, e nas greves nas cidades, em vez de acção politica no exílio”...
8- “Os acontecimentos que se verificaram pouco depois em Angola vieram confirmar o que Mário de Andrade anunciara em Londres. Na Baixa de Cassange, em Janeiro de 1961, os produtores africanos de algodão nas entraram em greve. Eram obrigados a cultivar algodão nas suas terras, não lhes sobrando espaço para as suas culturas tradicionais”...”Seguidamente veio o 15 de Março, que marcou o início da revolta de todos os angolanos oriundos do Norte. Nesse levantamento foram mortos trabalhadores angolanos oriundos do Sul, mestiços e brancos, e ainda todos os que aparentemente pareciam colaborar com o colonialismo português. O 15 de Março ficou tristemente célebre pelo seu radicalismo que ceifou vidas inocentes, pelo simples facto de trabalharem para o usurpador, ou pertencerem a outra raça”...
9- “A unidade que Neto buscava então era, porém, mais étnica do que política. Só um conhecimento profundo das etnias maioritárias em Angola podia levar Neto a uma tal atitude”....”O PDA era uma organização que congregava angolanos muzombos, oriundos ou descendentes de angolanos idos da área de Maquela do Zombo, e prósperos negociantes no Congo-Léo. A gente de Maquela do Zombo é conhecida e famosa pela sua tendência e capacidade para comércio”...
10-A declaração de Mário de Andrade, na altura o mais conhecido e prestigiado nacionalista angolano, envenenou sempre as relações com Neto. Se as relações entre esses dois insignes filhos de Angola tivessem sido outras, a história da guerra de libertação de Angola e particularmente do MPLA, teria sido diferente. Na sequência do estado dessas relações, Mario de Andrade chegou a fazer, muitos anos mais tarde, parte duma revolta contra a liderança de Neto: a «Revolta Activa» ....
11-“Os bakongos, tradicionalmente comerciantes, não sendo permitida tal prática no seu país, emigravam para o norte, onde procuravam exercer a prática de que eram dotados”...”Tudo quanto fosse considerado pelos seus corregionários como uma vitória diplomática, era visto por Neto com um certo desencanto. Ele nunca deu muita importância à luta diplomática. A curta experiência que tinha da actividade diplomática era considerada quando correspondesse a uma real implantação no terreno ou a alguma actividade prática relevante”....”Para Neto eram duas as “linhas mestras” da actividade diplomática do MPLA: a primeira consistia em ganhar a luta pelo reconhecimento do MPLA no mundo, como o único, o maior e melhor Organismo de Libertação do Povo Angolano”...” Neto que decidirá falar em nome da FDLA, acabada de ser criada de ser criada e que englobava o MPLA, não foi autorizado a tomar a palavra, pois aquela organização ainda não era conhecida pela OUA. Em contrapartida permitiram a Viriato da Cruz, que nessa altura se encontrava fora do MPLA, falar em nome deste. Foi uma decisão do presidente da Comissão, um nigeriano. A comissão recomendou o reconhecimento da FNLA e do seu GRAE. Felizmente, o presidente do Congo o Abade Fulbert Youlou não reconheceu o GRAE e convocou uma reunião de todos os movimentos de libertação, na qual falou Neto, conseguindo assim contrapor-se à recomendação da Comissão da OUA”...
12-“Jonas Savimbi, que hoje lidera a UNITA – União Nacional para a independência Total de Angola secretário-geral da UPA, que formou a FNLA e o GRAE. Savimbi foi também ministro dos Negócios Estrangeiros desse dito governo. E foi nessa qualidade que no Cairo, em Conferência de Imprensa, denunciou Holden Roberto e a FNLA, renunciando a todos os cargos que então ocupava”...”Depois do 25 de Abril apresentaram-se às negociações, devidamente reconhecidas pelas autoridades portuguesas, três organizações: o MPLA, a FNLA e a UNITA”.... “Eles reconheciam em Neto o seu grande espírito de revolta, a sua capacidade organizativa, o seu esquerdismo e o seu desejo de governar com seu partido”.....
13-...”A manobra de Spínola ao encontrar-se com Mobutu e Holden Roberto na ilha cabo-verdiana do Sal, sem o conhecimento dos membros da Junta de Salvação Nacional portuguesa, alertou a todos e a condenação desse acto foi uma das razões que levaram Spínola a demitir-se de presidente da República. Outros actos de Spínola, contrário ao espírito democrático que devia presidir, levaram à perda de confiança que nele haviam depositado os jovens oficiais. Estes, habituados a combater com armas na mão o MPLA, não percebiam porque se tentava afastá-lo”...”O chefe do Estado-Maior era João Luís Neto (Xyetu), respeito por todos os guerrilheiros do MPLA”...”A organização clássica regular deveu-se a um acordo entre os angolanos, os soviéticos e os cubanos. Não havia nada escrito, havia um acordo tácito”...”Os soviéticas primavam pela competência, pelo valor das armas, pelos bolseiros angolanos e não percebiam as indecisões que os cubanos mostravam em determinantes situações”...
14-...”Na verdade, a África do Sul, branca e indigna por aplicar o apartheid, era vista pelos países mais ricos do planeta, e em particular pelos Estados Unidos, como potência regional, situada numa das pontas dum dos eixos, a África Austral. E estava fora de questão a existência dum contrapoder em Angola- único produtor de petróleo na área, que pela sua riqueza potencial, estava condenada ou a fazer face à África do Sul, ou a ser sua aliada”...
15-“Raul Diaz Arguelles chegou a Luanda como coronel á frente de um grupo enviado pelo Ministério do Interior de Cuba para instruir angolanos na arte da guerra. Chegou a Luanda num antigo avião Britânia da Companhia aérea «Cubana de Aviacion», seguido de um outro, com intervalo de trinta minutos. Aterraram no aeroporto de Luanda graças à intervenção pessoal Xyetu, na altura chefe de Estado Maior das FAPLA, junto das autoridades portuguesas e porque não traziam armas, Arguleles o seu grupo foram para Kifangondo integrar e reforçar a defesa da capital que Rui de Matos na altura dirigia, bem como assegurava o comando das operações da IX Brigada.”
16-...”O processo e as suas técnicas e tecnologias estão nas mãos da humanidade branca e da humanidade amarela. A humanidade negra, em geral, está desprovida das ferramentas do processo do progresso material. Estamos em véspera de acontecimentos que irão pôr em causa a ordem internacional”...
Fim de citação.
Fonte: Iko Carreira, o Pensamento Estratégico de Agostinho Neto, Lisboa 1969
