Luanda - Republicanos vs Democratas: Como O Resultado Destas Eleições Poderá Afetar A República de Angola?

Fonte: Club-k.net

As eleições Presidenciais dos EUA agendadas para o dia 3 de Novembro de 2020 são aguardadas com grandes expectativas pelos cidadãos norte-americanos e pela comunidade internacional. Pode- se observar que os EUA vivem um momento de turbulência e instabilidade social, o que cria dúvidas sobre à reeleição do Presidente Donald J. Trump. Existem algumas interpretações de académicos sobre a Política Externa do Presidente Trump que consideram ser um modelo de Isolacionismo. Uma vez que os EUA é a maior superpotência, o resultado das eleições presidenciais direta ou indiretamente tem impacto no rumo da política e economia mundial. No caso da República de Angola historicamente houve períodos em que as relações bilaterais entre os estados eram praticamente inexistentes e hostis, mas desde o período das lutas de Independência que a Política Externa dos EUA tem um grande impacto na Política Angolana e na Região da África Austral.

Caos Social:


O caos social nos EUA tem sido marcado pela pandemia do Covid-19, e pelos problemas de caracter socioeconómico, político e racial. Nos EUA o Covid-19 atingiu o marco de quase 7,000,000 de casos positivos, e fazem parte das estatísticas cerca 200,000 mortos. Críticos do Presidente o acusam de ser responsável por esta situação, pois Trump ignorou os alertas de especialistas e inclusive dos órgãos de Defesa e Segurança. Durante a administração do seu antecessor, Presidente Barack Obama, o Conselho Nacional de Segurança elaborou um documento composto por 69 páginas de estratégias para a luta contra pandemias e ameaças biológicas, métodos de rastreamento à proliferação de vírus, testagens e armazenamento de medicamentos para evitar escassezes. De acordo com o US Federal Government, o Presidente Trump foi informado que os cortes aos fundos de prevenção e controle de pandemias poderiam colocar os EUA em risco, o que não alterou o comportamento do Chefe de Estado que apenas tomou medidas quando a situação já se encontra fora de controlo. Foram implementadas quarentenas institucionais pelos Governadores Estaduais, que foram protestadas por alguns cidadãos norte-americanos que defendem que o Estado não tem autoridade sob as suas liberdades, nem de os obrigar a cumprirem com métodos de prevenção obrigatórios como usar mascaras em espaços públicos. No mesmo período os EUA se depararam com outro grave problema: protestos e atos de violência em várias cidades após o assassinato de um cidadão afro-americano, George Floyd, nas mãos de um polícia.


Racismo Institucionalizado

Podemos testemunhar em vídeos partilhados nas redes sociais atos de violência e abuso de poder perpetuados por polícias nos EUA. Tais atos não são recentes e refletem o racismo institucionalizado que vigora na sociedade americana desde o fim da escravatura. As minorias protestam a vários anos sobre as suas condições socioeconómicas, racismo institucionalizado e acesso a educação. A era Jim Crow terminou a quase 7 décadas após o Civil Right Movement, mas estudos feitos por académicos como Michelle Alexander em The New Jim Crow: Mass Incarceration In the Age of Colorblindness, retratam como a Polícia e Tribunais servem para oprimir e violar os direitos das minorias. Membros destas comunidades acabam condenados a penas muito severas, mesmo quando não são apresentadas provas suficientes que vinculem réus a crimes, como no caso do jovem Kalief Browder. Uma realidade que cria entraves na ascensão profissional e económica dos mesmos, tornando o crime a solução mais viável para muitos. O surgimento de movimentos como o Black Lives Matter e o caos criado após a morte de George Floyd é apenas o topo do iceberg dos problemas que ambos Republicanos e Democratas têm sido ineficazes em encontrar soluções definitivas. Nos últimos anos membros influentes destas comunidades como o rapper e músico Kanye West e a ativista política Candace Owens, defendem que as administrações Democratas beneficiam dos seus votos e nada têm feito para resolver os seus problemas. Candace Owens criou um movimento conhecido como BLEXIT, que urge afroamericanos abandonarem o partido democrata e abraçarem os valores conservadores dos EUA.

The Grand Old Party


Na história mais recente o partido Republicano não tem adesão ou simpatia das massas afro e latinas, devido sua matriz conservadora que se opôs a reformas como o Civil Right Movement. O slogan da


campanha do Presidente Trump “Make America Great Again” por muitos é interpretado como a valorização de um período sombrio da história americana. Os discursos da campanha de Trump defendiam os valores conservadores, luta contras os interesses da China, fortificação da hegemonia Norte Americana e proteção das fronteiras contra imigração ilegal e potenciais atos de terrorismo. Para muitos a retorica dos seus discursos sobre imigração e segurança são populistas e incentivam a violência e xenofobia. Nos primeiros meses do mandato foi criada uma lista de países com alto potencial para atos de terrorismo, conhecido como o Travel Ban. Cidadãos dos países foram na lista foram proibidos de entrar nos EUA, até que tal medida foi bloqueada pelo Tribunal Supremo. Desta lista faziam parte países com populações maioritariamente muçulmanas. Cumprindo a sua agenda foram criadas políticas migratórias que tornariam mais difícil ou impossibilitariam a concessão de vistos e nacionalização de cidadãos destes países. Trump defendeu serem medidas de segurança mas surgiram algumas perguntas e controvérsias: Porque será que países como a Nigéria fazem parte dessa lista? De acordo com estudos feitos por várias instituições como a Rockefeller Foundation e a Migration Policy Institution, cidadãos americanos descendentes de imigrantes nigerianos são o grupo com mais sucesso económico e académico nos EUA. Nenhum estudo publicado pelas instituições de defesa e segurança indicam que a imigração de nigerianos apresenta altos riscos à segurança e estabilidade dos EUA, o que fortalece a tese dos críticos de Trump que o acusam de ser xenofóbico. O eleitorado conservador americano acredita que o EUA vive um momento crucial pois os seus valores morais, tradicionais e religiosos encontram-se em perigo devido ao crescimento das ideologias liberais e da Esquerda. O Senador Bernie Sanders chegou a ser um dos candidatos mais fortes nas últimas duas Eleições Primárias do Partido Democrata, o que seria quase impossível de acontecer no contexto antigo da Guerra Fria pois Sanders é defensor do Socialismo Democrata.


Política Externa da Administração Trump
Especialistas apontam que durante a campanha Trump conseguiu atrair a maioria dos votos da classe operária em estados como: Michigan, Ohio e Pennsylvania. Nos últimos anos a economia dos EUA tem sido afetada pelo número elevado de fábricas que se mudaram para a China, e as promessas de Trump de implementar tarifas as importações da China e trazer de volta fábricas aos EUA garantiram- lhe a vitoria. A Guerra Comercial tem sido um marco muito forte da Política Externa de Donald Trump, e são notórios alguns resultados positivos como aumento de atividades industriais e postos de trabalho. São também marcos da era Trump a saída dos EUA de acordos multilaterais como os Acordos de Paris, e a recente formalização do início do processo da saída dos EUA da OMS. Tais decisões políticas podem ser interpretadas como isolacionistas, que lembram a era anterior a do Presidente Roosevelt como a do Presidente Woodrow Wilson. O Presidente Roosevelt e o seu Vice e successor, Henry Truman, foram extremamente cruciais para o fim do Isolacionismo Americano e criaram os alicerces que levaram os EUA a se tornarem na maior superpotência. O Presidente Roosevelt teve um papel muito importante para o fim da II Guerra Mundial e criação da ONU, e Truman deu continuidade a expansão da Geopolítica Americana com as políticas da Truman Doctrine e o Marshall Plan. Num momento que o EUA observa a contestação da sua hegemonia pela emergência da China, a saída de acordos multilaterais pode enfraquecer a sua influência. A China se tornou no maior parceiro económico e estratégico no continente Africano, e com o BREXIT a Alemanha tem expandido a sua influência na política Europeia e consequentemente Mundial.


A era de Trump permitiu aos EUA fortalecer as suas relações bilaterais com países e antigos aliados como Israel. O apoio dos EUA foi crucial para a criação do Estado de Israel, criando uma relação estratégica e crucial para a geopolítica americana no Médio Oriente. Nas últimas décadas o EUA tem uma forte presença militar em conflitos na região, criando hostilidades com países vizinhos e inimigos de Israel como Irão. Recentemente as tensões entre os EUA e Irão cresceram, e uma operação militar americana resultou no assassinato do Major General Qasem Soleimani, Comandante das Forças Quds, uma divisão responsável de Operações Militares Extraterritoriais e Clandestinas das Forças Revolucionárias Islâmicas do Irão. Uma possível guerra com o Irão poderá criar mais instabilidade no mundo árabe, e alastrar as consequências para o Norte de África e Europa, agravando a crise dos refugiados que o mundo vive atualmente.
Recentemente os EUA mediaram um acordo diplomático e histórico entre Israel, Emirados Árabes Unidos e Bahrain. Foi assinado numa cerimônia na Casa branca um acordo que normaliza as relações entre os estados, contrariando a política dos estados árabes que recusam em estabelecer relações diplomáticas com Israel enquanto não houver uma solução definitiva para o conflito com a Palestina. Israel recentemente com o apoio dos EUA mudou para Jerusalém a sua capital política, violando os acordos com a Jordânia e a Palestina. Uma jogada política que desafia a vontade da ONU e alguns países Europeus aliados dos EUA, que defendem que só a diplomacia trará resultados definitivos.


As Relações Bilaterais entre EUA e Angola na era Trump
As relações bilaterais entre os EUA e a República de Angola foram formalizadas no ano de 1993 na administração do Presidente Clinton e do Presidente José Eduardo dos Santos. Durante a Guerra Civil Angolana os EUA deram suporte económico e militar aos seus aliados FNLA e UNITA. Com o fim da Guerra Fria e novo paradigma mundial ligado as ameaças de terrorismo, o Estado Angolano passou a ser um forte aliado e parceiro estratégico da Casa Branca. Relações estratégicas e também económicas, uma vez que várias empresas americanas do ramo de petrolífero aumentaram a sua presença em Angola após o fim da guerra.


No seu discurso de empossamento o Presidente João Lourenço afirmou que os EUA são um parceiro importante, e hoje observamos o apoio dos EUA para as atuais reformas do Executivo Angolano. Os EUA afirmam dar apoio ao combate a corrupção, branqueamento de capitais e ajudar o Estado Angolano a recuperar dinheiro do erário publico que foi transferido ilegalmente para o exterior do país. Tal compromisso foi afirmado mais uma vez durante a visita a Angola do Secretário do Estado norte- americano Mike Pompeo. No âmbito económico é notável o interesse de alguns empresários americanos de investirem em outras áreas para além da indústria petrolífera, como agricultura e outras áreas de produção. Facto que poderá apresentar oportunidades para os atuais esforços do Executivo Angolano de diversificar a economia nacional. A possível vitória de Joe Bidden não põe em causa o apoio dos EUA as reformas do Executivo Angolano, mas poderá não ser o melhor resultado para o atual quadro económico de Angola.


Joe Bidden: O Possível Melhor Candidato Para Os EUA Mas Não Para Angola

A campanha do candidato dos Democratas tem sido marcada por promessas de reformas institucionais, e uma maior participação dos EUA em questões de fórum global que historicamente os EUA vinham liderando. Diferente dos conceitos clássicos que definem a segurança como atividades ligadas as áreas militares e de inteligência, os académicos atualmente definem a segurança como um conceito transversal que engloba também as questões ambientais. Os problemas ambientais como os incêndios na Califórnia urgem os americanos a apostarem mais em indústrias renováveis, o que tem sido uma das bandeiras do partido de Joe Bidden. Membros históricos do Partido Republicano como o General Colin Powell apontam que os EUA estão em perigo sob a liderança de Trump e endossaram a campanha de Joe Bidden.

O lobbying da indústria petrolífera tem laços muito fortes com o Partido Republicano a várias décadas, e impõe restrições no crescimento das indústrias renováveis e políticas de proteção ambiental. Tais medidas poderão provocar uma maior desvalorização do Brent, o que é alarmante uma vez que o Covid-19 aprofundou ainda mais a crise que se vive em Angola nos últimos anos. Uma vez que a economia angolana ainda é extremamente dependente das receitas do petróleo, podemos antecipar que o quadro atual de crise pode se agravar caso prossiga o plano dos democratas. Realisticamente, a eleição de Joe Bidden pode vir a ser a melhor solução para os atuais problemas dos EUA a nível doméstico e externo, mas poderá não ser o melhor resultado mediático para os atuais problemas económicos vividos pela República de Angola.


Licenciado em Relações Internacionais pela Marymount Manhattan College, Nova York-EUA Pós-Graduação em Políticas Públicas de Segurança e Defesa, ISCTE & Instituto da Defesa Nacional de Portugal
Mestrado em Segurança e Justiça pela Universidade Lusíada de Lisboa
Prof. Assistente na Universidade Lusíada de Angola