Luanda - A defesa de alguns dos 103 jovens detidos no sábado, 24 de outubro, durante uma manifestação em Luanda, recusa as acusações da PGR, que os indicia de crimes de desobediência às medidas restritivas de circulação face à pandemia da Covid-19 e danos patrimoniais voluntários.

Fonte: RFI

A Associação Mãos Livres, que defende alguns dos detidos, alega que os manifestantes são indiciados de desobediência ao decreto presidencial sobre as medidas restritivas à pandemia da Covid-19, quatro crimes de ofensas corporais voluntárias e dois crimes de danos voluntários sobre bens da Polícia Nacional.

A manifestação de 24 de outubro, convocada três semanas antes pela sociedade civil e que teve entre outros o apoio da UNITA, pretendia denunciar o adiamento das primeiras eleições autárquicas em Angola, inicialmente previstas para 2020 e reivindicar os 500 mil empregos prometidos pelo Presidente João Lourenço e a melhoria das condições de vida da população.

Os organizadores reuniram-se antecipadamente com o Comando Provincial da Polícia Nacional, com quem definiram a rota da manifestação, mas a 23 de outubro, um decreto presidencial impôs novas medidas de agravamento do estado de calamidade, proibindo ajuntamentos com mais de cinco pessoas e logo teoricamente, proibindo a manifestação.

Salvador Freire, um dos advogados de defesa dos manifestantes detidos, diz que o decreto presidencial não invalida um direito constitucional, por ser um diploma administrativo, que não impõe regra sobre manifestação.

“O decreto presidencial não invalida o que a constituição diz, por ser um decreto administrativo, que não impõe regra de que esse cidadão não possa se manifestar, portanto, o argumento não é válido, o direito de , embora reconheçamos que, de facto, todos nós precisamos ter saúde e viver em condições”, reconheceu o presidente da associação Mãos Livres.

O causídico resume que a manifestação é um direito que está ligado directamente às pessoas e não pode, de forma nenhuma, ser coartado, violando as garantias constitucionais, que permitem que os cidadãos realizem protestos.

Apesar de reconhecer os esforços no combate e controlo à crise sanitária, provocada pela pandemia da Covid-19, Salvador Freire acha que os esforços neste quesito, fora de tudo isso, não implicam que os cidadãos não exerçam os direitos consagrados na constituição.

Defesa quer que os arguidos respondam em liberdade


Além disso, a defesa garante que está a fazer diligências para que os detidos possam responder ao processo em liberdade, apesar de o juiz fazer ouvidos de mercador.

“Nós achamos que os jovens devem responder em liberdade, mas o juiz da causa assim não entendeu e nesta terça-feira, 28, vamos continuar com as discussões para encontramos um horizonte”, garantiu.

Depois da libertação de quatro jornalistas, o Tribunal Provincial de Luanda libertou duas senhoras grávidas e alguns menores que se encontravam à paisana quando decorria a manifestação.

Polícia volta a dispersar jovens frente ao tribunal

A polícia está a ser acusada de ter usado gás lacrimogéneo, para dispersar jovens que pretendiam realizar, na terça-feira, 27 de outubro, uma vigília para pedir a libertação dos manifestantes nas imediações do Tribunal de Luanda.

Willian Soneca, parente de um dos detidos, confirma que a polícia usou brutalidade, para reprimir e dispersar os jovens que tencionavam realizar uma vigília a favor dos manifestantes.

“Não podemos nos sentir reféns na terra que vivemos como pobres e escravos, o MPLA deve fazer reformas na sua política governativa”, aludiu o entrevistado.

Um outro interlocutor também condenou a postura da polícia, pois, segundo ele, "as forças da ordem não se podem deixar instrumentalizar pelo MPLA, caso queiram ser uma polícia republicana".

Atendendo o número de arguidos - inicialmente 103 - o Tribunal determinou ouvir vinte pessoas por dia, como medida de prevenção face ao novo coronavírus, já que no grupo de detidos, segundo o secretário do Estado para Saúde Pública, Franco Mufinda, um manifestante terá testado positivo à Covid-19.