Lisboa – As audiências que o Presidente da República, João Manuel Gonçalves Lourenço concedeu a personalidades angolanas (Isaías Samakuva, Bispo Dom Filomeno Vieiras Dias, Isaias Kalunga), logo após aos acontecimento do passado sábado (24) teve como abordagem a prestação de esclarecimento sobre o recurso a violência policial contra os jovens que reivindicam empregos e realização de eleições autárquicas, em Angola.

Fonte: Club-k.net

“A estratégia  dos manifestantes era  tornar o país ingovernável”

De acordo com consultas, todos os interlocutores que foram recebidos na audiência retiveram a percepção de que a reação de João Manuel Gonçalves Lourenço terá sido baseada em alguma informação que lhe foi prestada sugerindo que os jovens pretendia realizar uma espécie de “golpe de Estado” deixando o país numa situação de ingovernabilidade para depois forçar negociações entre as partes envolvidas.

 

O antigo Presidente da UNITA, Isaías Samakuva, que foi o primeiro a ser recebido aconselhou João Lourenço a libertar os jovens porque no seu ponto de vista não pode haver dialogo mantendo os promotores da marcha na prisão.

 

Três dias depois de ter abordado as referidas personalidades, João Manuel Gonçalves Lourenço levou o assunto a mesa de uma reunião do Comitê Central do MPLA, declarando que “A estratégia de tornar o país ingovernável para forçar negociações bilaterais no actual contexto político, em que as instituições democraticamente constituídas funcionam em pleno, não é concretizável. Perante a probabilidade de réplica do que se passou em Luanda pelo país fora, as autoridades competentes vão continuar atentas e cumprir com o seu papel de manutenção da ordem pública e fazer cumprir as medidas tomadas no quadro do Estado de Calamidade Pública”.


Diante aos seus camaradas de partido, o líder do MPLA, foi mais longe imputando responsabilidades a UNITA sobre o suposto “Golpe de Estado” que seria desencadeado pelos jovens. “O envolvimento directo da UNITA e seus deputados à Assembleia Nacional devidamente identificados é reprovável e deve merecer o mais veemente repúdio da sociedade angolana, que não pode permitir que partidos políticos com assento parlamentar, incitem os jovens e a população para a desobediência civil”, lê-se na comunicação de João Lourenço.

 

Segundo constatações, um dia antes da aludida manifestação, os seus promotores geralmente ligados ao chamado Movimento Revolucionário tiveram um encontro com o comando da Polícia Nacional para tratar de questões de segurança do evento. Na noite do mesmo dia, a Presidência Angolana fez sair um decreto justificado como contendo medidas de contenção a propagação do Covid-19, na qual impedia, para as próximas horas, a concentração nas ruas, de mais de cinco pessoas. Apesar de especialistas terem alertado que um decreto deve entrar em vigor depois de 72 horas, o documento presidencial em causa foi encarado como um instrumento impeditivo a manifestação.

 

Fernando Guelengue, um jornalista que presenciou a manifestação falou a uma televisão estrangeira (STV Moçambique) explicando como a Polícia provocou caos para se imputar responsabilidades e acusações de supostas arruaças aos jovens manifestantes.

 

Num artigo intitulado “Luto e lágrimas na manifestação de 24 de Outubro”, Guelengue revela ainda como a Polícia infiltrou agentes de baixa visibilidade no seio dos manifestantes lançando gás lacrimogêneo contra o povo.

 

“No meio do grupo dos manifestantes haviam vários infiltrados e, um dos que estava trajado com roupa normal, acabou por largar gás lacrimogéneo no meio dos manifestantes que estavam em protestos. Até ao momento, tivemos acesso da informação da morte da jovem Marcelina, assassinada durante a manifestação de sábado último, conforme informações de responsáveis dos protestos. Os feridos são tantos que ainda não conseguimos obter um número exacto. Mas as detenções, segundo relatos de manifestantes, são contabilizados 104 participantes devidamente identificados”, lê-se no depoimento do profissional da comunicação social.

 

Segundo o mesmo “Das várias manifestações que fiz a cobertura jornalística, esta foi a mais intensa e com mais disparos de arma de fogo. Mas também foi a que mais resposta houve da parte dos manifestantes com queimas de pneus, movimentação de contentores, barramento da via pública, panfletos e folhetos bem escritos, participação de estudantes, zungueiras, taxistas, motoqueiros e várias individualidades que sempre fizeram parte dos principais protestos já realizados no País”

 

“A lição que sai deste protesto é que o número de cidadãos que estão a compreender os modelos de exigir os seus direitos tem estado a aumentar. E a repressão policial tem estado a se transformar num combustível de saturação para mais pessoas se juntarem de forma solidárias aos protestos”, escreveu.


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