Luanda - Os 16 deputados do ainda maior partido da oposição, a UNITA, se furtaram a participar desse acto histórico, demonstrando que a sua alegada vocação “democrática” não passa de um embuste.


Fonte:  África 21

Um dia histórico

No passado dia 21 de Janeiro deste ano, Angola viveu a sua segunda data mais importante: a proclamação da independência constitucional do país. Com efeito, ao adoptarem uma Constituição que corresponde, em geral, aos mais altos desígnios partilhados por todos os angolanos, não se limitando a ser uma mera réplica de modelos externos e tendo, além disso, sido elaborada exclusivamente por juristas nacionais, os deputados constituintes protagonizaram um momento ímpar da história de Angola, apenas comparável ao dia da independência política.


Cento e oitenta e seis dos 220 deputados que compõem a Assembleia Constituinte, representando três dos cinco partidos com assento no parlamento – MPLA, PRS e Nova Democracia -, votaram favoravelmente a esse documento fundamental. Registaram-se duas abstenções, dos representantes da FNA, enquanto os 16 deputados do ainda maior partido da oposição, a UNITA, se furtaram a participar desse acto histórico, demonstrando que a sua alegada vocação “democrática” não passa de um embuste. Estiveram ausentes justificadamente seis deputados.


Como se vê, a Constituição foi adoptada por um consenso quase total, na sequência do resultado alcançado durante as discussões no seio da Comissão Constitucional, onde 94 por cento do texto submetido à Assembleia Constituinte foi aprovado unanimemente.


Apenas dezanove do total de 244 artigos da Constituição tiveram de ser votados, tendo sido aprovados com os votos do MPLA e da Nova Democracia, que representam 85 por cento dos deputados, as abstenções do PRS e da FNLA e a ausência da UNITA.


De notar que, durante a plenária, o PRS, apesar de se ter abstido em relação a esses artigos, quer na Comissão Constitucional quer na votação na especialidade, aprovou a Constituição na generalidade, numa atitude patriótica e responsável digna de nota.


Recorde-se que, e embora o consenso seja sempre desejável, o que é usual, em todo o mundo, é que as constituições têm de ser aprovadas por maioria qualificada (regra geral, dois terços). A verdade é que nem sempre o consenso é possível, sobretudo em aspectos como a organização política do Estado ou o sistema de governo, onde as opções podem ser radicalmente diferentes. Nesses casos, tem de valer, obviamente, o princípio da maioria. O que é obrigatório é que a opção adoptada seja democrática.


Uma leitura honesta, abrangente e serena da Constituição aprovada na quinta-feira da semana passada permite afirmar que a mesma constitui um aprofundamento da democracia angolana como um todo. A UNITA e a restante oposição radical – incluindo partidos extintos pelo Tribunal Constitucional, por falta de representatividade – insistem em afirmar que, supostamente, se trata de uma Constituição ilegal, por “violar” os limites materiais definidos no artigo 159º da actual Lei Constitucional, nomeadamente a eleição directa do presidente da República. Isso é redondamente falso.


Com efeito, diz o referido artigo, na sua alínea d), que as alterações à Lei Constitucional e a aprovação da Constituição de Angola têm de respeitar “o sufrágio universal, directo, secreto e periódico na designação dos órgãos de soberania e do poder local”. Ou seja, esse limite abrange quer a escolha dos titulares dos órgãos de soberania (deputados e presidente da República) quer os membros do poder local (autarquias).


Ora, todos os partidos, incluindo a UNITA, propuseram desde o princípio um sistema eleitoral para os órgãos do poder local baseado nos cabeças de lista, o que foi aceite consensualmente. Assim, o artigo 220º, número 2, da nova Constituição diz que as autarquias são compostas “por representantes locais, eleitos por sufrágio universal, igual, livre, directo, secreto e periódico”. No número 4 do mesmo artigo, estabelece-se:-“O presidente do órgão executivo da autarquia é o cabeça da lista mais votada para a assembleia”.


A forma de eleição do presidente da República é a mesma, sem tirar nem pôr. É, pois, de perguntar: como é que o mesmo modelo é considerado uma eleição directa, se aplicado aos titulares dos órgãos do poder local, mas deixa de sê-lo, quando aplicado ao presidente da República? Que estranho mistério será esse?


Trata-se de uma solução inédita? Sim. Mas, qual é o problema? Acaso os modelos conhecidos até agora existem desde o princípio do mundo? O facto é que, no momento histórico em que cada um deles foi criado – respondendo às necessidades dos países onde nasceram -, todos eles constituíam uma novidade.


Sem ufanismos balofos, o presidencialismo-parlamentar é um modelo novo, inventado pelos angolanos, na base do estrito respeito pelos princípios e valores universais (uma coisa são os princípios e valores e, outra, os formatos e os modelos). A sua escolha obedeceu estritamente à necessidade de preservar a estabilidade, depois de 27 anos de guerra no país, uma vez que esse sistema garante, à partida, a coincidência entre o presidente da República e a maioria parlamentar (mesmo relativa).


Repito: no dia 21 de Janeiro de 2010, Angola proclamou a sua independência constitucional.