EXMO. SENHOR
DIRECTOR DO INSTITUTO NACIONAL
DE DEFESA DO CONSUMIDOR –
LUANDA

Assunto: Reclamação por dupla cobrança para a emissão de Declaração Médica – Hospital Espírito Santo.

Queira aceitar, Exma. Senhora, os nossos melhores cumprimentos.

XXXXX (nome ocupado a pedido da remitente), cidadã angolana, paciente do Hospital do Espírito Santo, sito no bairro Vila Alice, rua da Liberdade, n.º 15, contribuinte n.º 5402115702, vem mui respeitosamente reclamar pelo seguinte:

QUESTÃO PRÉVIA

O presente documento é endereçado à Vossa Excelência pelo facto de as demais instituições contactadas terem, sistematicamente, denegado intervenção, reencaminhando-me umas para outras até chegar á entidade máxima responsável pela gestão do Sector da saúde em Angola. Assim, venho expor o seguinte:

I- ENQUADRAMENTO

1. Sou paciente e utente dos serviços médicos do Hospital Espírito Santo há cerca de 10 (dez) anos. Inicialmente somente na especialidade de Genecologia, mas, recentemente, também nas especialidades de neurologia e medicina interna.

2. Foi-me diagnosticada uma patologia de foro Ginecológico, cujo controle foi possível apenas até 2018, altura em que começou a ter crises, com perda de consciência e convulsões, estando hoje a viver um quadro de constante oscilação, dados os sinais de evolução da patologia ora diagnosticada (conferir anexo 1).

3. Desesperada, solicitei a intervenção da ginecologista (a quem reconheço bastante competência) que, por sua vez, informou que o tipo de intervenção recomendável para a patologia concreta ainda não é executado em Angola.

4. Acto contínuo, iniciei imediatamente esforços junto do Consulado da República de Portugal, no sentido da obtenção de um visto para tratamento médico (dado já ter antecedentes naquele país, onde realizei uma cirurgia torácica á um Timoma em 2018).

II. DOS FACTOS


5. Na luta pela reunião dos relatórios médicos solicitados pelo Consulado de Portugal, tendo obtido os documentos por parte do hospital em Lisboa (conferir anexo 2) com muita celeridade, solicitei igualmente, à minha Ginecologista um Relatório/Declaração, que atestasse o diagnóstico referido no ponto 4., confirmando a impossibilidade de tratamento em território nacional. Esta, prontamente se disponibilizou em emitir o solicitado documento.

6. Assim, no dia 14 de Janeiro do corrente ano, pelas quatorze horas, fui ao encontro da médica Ginecologista que, impossibilitada de extrair o relatório automaticamente, via sistema informático, por razões técnicas, fê-lo manuscrito e remeteu à secretária do hospital para a digitalização.

7. Por volta das 16h, a médica Ginecologista informou-me que a sua intervenção já estava concluída, e faltava apenas o visto da Directora da Clínica.

8. Surpreendentemente, após alguns instantes fui interpelada, por uma colaboradora do hospital em questão (parecia ser a secretária) que, com o Documento solicitado empunhado em mãos, informa que este custava KZ 10.000,00 (Dez Mil Kwanzas).

9. Prontamente, questionei onde isto se encontrava escrito/previsto, ao que a referida colaboradora informou que não sabia, “só sabia que o relatório tinha um custo de KZ 10.000,00 (Dez Mil Kwanzas)”.

10. Sentindo-me diante de uma situação de extorsão, comecei uma conversa inútil com esta colaboradora que se recusou, inclusive, a colocar-me em contacto com os seus superiores ou qualquer outro colaborador da administração do Hospital, alegando não estar mais ninguém.

11. Desafiando-a, ousei adentrar aos serviços administrativos onde pude conversar com outro colaborador da contabilidade, apesar de este se mostrar totalmente hesitante. Visivelmente aflito com a situação e face aos argumentos que apresentei, após ter segredado alguns segundos com o colega da Cabine ao lado, o mesmo colaborador avançou algumas justificativas estapafúrdias para a extorsão (já que este valor já se encontra computado no valor das consultas – Relatório de diagnostico e Receituário) e informou-me que, por estar assegurada pela Advance Care (ENSA), merecia um desconto que reduziria o aludido montante para KZ 7.812,00. Ao que assumiu que a sua colega se tinha enganado no preço.

12. Ciente dos meus direitos enquanto cidadã, utente de serviços e paciente de um hospital “privado”, imediatamente solicitei o Livro de Reclamações que preenchi e, não tendo alternativa de momento, paguei aquele valor que, agora, venho reclamar a devolução (conferir Doc 2).

Senão, vejamos:

III. DA RECLAMAÇÃO POR DUPLA COBRANÇA/EXTORSÃO

13. A cobrança em questão não tem qualquer fundamento, uma vez que, a obtenção de Relatórios médicos constitui um direito do paciente, a partir do momento em que passa ser acompanhado um médico, cuja especialidade e competência é validada pelo Hospital que o contrata.

14. Conforme se constata do sistema informático existente no Hospital, e decorre da lógica natural de qualquer relação médico/paciente, os diagnósticos devem ser, caso necessário, vertidos a escrito, assim como o são os receituários. Isto decorre do facto de tratar-se de uma relação formal, onde o contratante dos serviços (paciente) deve ser munido de toda a informação que necessitar, sem necessidade de pagamentos adicionais, já que se bastasse somente conversa com o médico, provavelmente deixaríamos de precisar de hospitais (existem pseudo-médicos na cidade de Luanda).

15. Ora, no caso concreto, como se pode ver no documento, de 8 linhas, a paciente precisava, apenas, da confirmação escrita da necessidade procurar tratamento médico fora do pais (porque aqui não existe tratamento possível)!

Exma. Sra. Ministra;

16. O documento, de 8 linhas, que me foi vendido vale a minha vida e é mais caro do que um exame de Gota Espessa no mesmo hospital! Será admissível que um hospital “privado” se aproveite da situação acima narrada para extorquir a paciente pelo facto de encontrar-se fragilizada/desamparada/doente e sem qualquer alternativa?

17. Questiono, Sra Ministra: trata-se mesmo de um hospital? Pois não se coíbem em massacrar/violentar patrimonial e moralmente pessoas doentes sempre que têm uma oportunidade. E mais!...

18. Será que a busca pelo lucro, especialmente no caso dos hospitais, não tem limite? Não existem Códigos de Ética e Deontologia Profissional para profissionais da saúde? Onde está a fiscalização?

19. Por outro lado, para onde vai tanto dinheiro quando o hospital/Clinica em questão não tem sequer uma cabine de desinfeção a entrada? Faltam toalhas para limpar as mãos após a lavagem e não há gel desinfetante para substituir…

20. A minha indignação é maior pelo facto de no início de 2016 ter sido consultada nas urgências pela Dra. Adalgisa, que, com uma simples receita, e sem exames prévios, mandou-me para casa com a minha dor no peito. Dor esta que depois de bem avaliada em Lisboa apontou para a existência do tumor que foi operado (conferir ponto 4. da presente reclamação). No entanto atenuei/perdoei por entender que somos todos humanos e falhamos, podia ser da pressão das urgências.

21. Todavia, devo realçar que, os documentos do hospital de Lisboa chegaram a Angola em questão de horas e não custaram mais do que o envio de um email. É por este motivo que não posso aceitar ser tratada desta maneira no meu próprio país! A paciência deve terminar onde começam os abusos!

22. Exma. Sra. Ministra: estou cansada de viver, ver abusos e consenti-los, sempre perdoando o imperdoável! Uma vez que não considero recomendável o recurso á justiça por mãos próprias e o País tem instituições vocacionadas para tal, venho reclamar pela vossa douta intervenção, em coordenação com as demais instituições eventualmente envolvidas, para solicitar o seguinte:

m) Que me seja devolvido, pelo Hospital, o montante dupla e indevidamente cobrado pela emissão da Declaração Médica;

n) Que seja inspeccionado o Hospital Espírito Santo, uma vez que as condições de sanidade encontram-se muito a quem do desejado para uma instituição hospitalar em período de pandemia;


o) Que o hospital seja instado a publicar os preços dos actos médicos, já que, isto protege os utentes de possíveis expeculações/enganos por parte dos trabalhadores;

p) Que sejam tomadas medidas efectivas de fiscalização periódica daquele hospital, na medida em que doentes não conseguem lutar, não têm condições de resistência e por isso apenas podem contar com a força do Estado, fazendo cumprir as Leis e administrando a justiça.

Finalmente referir que consenti a situação por estar frágil e a precisar de apoio médico urgente. Mas precisarei do meu dinheiro para o tratamento, pelo que, rogo que mo seja devolvido. Adicionalmente, e a título de contribuição, faço esta exposição inicial também para colaborar com o Estado a colocar os comerciantes no se lugar (mercado) e verdadeiros médicos nos hospitais, que sejam capazes de perceber que a saúde é um serviço social e pela sua natureza não pode ser vendável!


Certa de poder contar com o vosso apoio e protecção, coloco-me à disposição para os esclarecimentos adicionais que julgarem pertinentes.


Atenciosamente,

Luanda, 18 de Janeiro de 2021

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C/C.
INSPENCÇÃO GERAL DA SAÚDE
ORDEM DOS MÉDICOS