Luanda - Os meus negócios de petróleo no paraíso natural do Namibe vão de vento em popa, mas estou com dificuldades para encontrar um cubico onde alojar a Provedoria de Justiça, o que representa um fracasso nos meus negócios imobiliários. Quanto ao complexo da Barra do Dande, estou bem posicionado para ficar com a concessão durante cem anos, sem concurso público. Um sucesso! Estava eu a comemorar os ganhos nestes negócios quando encontrei o Boavida Neto, com uma corda ao pescoço, de joelhos, em frente à igreja da Sagrada Família.

Fonte: Club-k.net

De olhos postos no céu, ele implorava misericórdia ao Altíssimo. Depois espojava-se no chão e pedia perdão aos angolanos por todo o mal que lhes fez. Aproximei-me, disse-lhe umas palavras de conforto e dei-lhe 50 Kwanzas que ele guardou avidamente. Mais um deputado em estado de necessidade.


Em frente ao edifício da Assembleia Nacional encontrei o engenheiro Manuel Vicente, com ar de lorde inglês, mas sorridente como os meus manos do Catambor no dia em que o salário cai na conta bancária. Metade, vai logo para bebida. O banditismo mediático ao serviço do chefe dos polícias garantia-me que o antigo Vice-Presidente da República tinha fugido para o Dubai. Afinal, tudo mentira.


O senhor deputado tinha acabado de ser ouvido por um procurador, como declarante, no âmbito do processo que levou à prisão o empresário Carlos São Vicente. Bonito. A única pessoa que pode explicar à Justiça se o prisioneiro é criminoso ou não, se a Sonangol foi esbulhada ou não, só prestou declarações meses depois da detenção e quando a prisão preventiva foi prolongada por mais dois meses. Prenderam para investigar! Tanto quanto apurei, nem Mobutu fazia isso. Que susto!


O Presidente João Lourenço já não demitia ninguém há três dias. Fiquei preocupado porque me passou pela cabeça que sua excelência tinha sido atacada, pela COVID19. Hoje estava numa esplanada à beira-mar bebericando desalmadamente. Peguei numa cópia do Jornal de Angola, abandonada numa mesa ao lado, comecei a ler e foi um alívio. Lá estava uma lista de 500 demitidos e nomeados. Homens e algumas mulheres, de generais e almirantes para cima. Saúde, camarada Presidente!


Leonel Cosme morreu em Portugal. Ele e Garibaldino de Andrade foram os criadores da editora Publicações Imbondeiro, no Lubango. Naqueles anos de liberdade confiscada e Pátria ocupada, esses livrinhos foram uma pedrada no charco. Os dois prestaram um serviço inestimável ao fabuloso mosaico cultural angolano e particularmente à Literatura. Nos últimos anos da sua vida, Leonel Cosme colaborou regularmente com o jornal Cultura, que a administração da Empresa Edições Novembro encerrou alegando razões financeiras, quando custava menos por mês, do que um administrador não executivo. Por estas e por outras, fui para o negócio do petróleo.


O velho Cosme morreu. Fomos colegas na Emissora Oficial de Angola (RNA). Ele era o chefe dos serviços de produção do Rádio Clube da Huíla e eu chefe de redacção em Luanda. Quando as tropas sul-africanas invadiram Angola com o criminoso de guerra Jonas Savimbi às cavalitas, ele teve de fugir para não ser executado.


Em Portugal, foi o chefe da delegação da Rádio Difusão Portuguesa (RDP) no Porto, até se reformar. Nos Media portugueses, nem uma palavra sobre este jornalista de excepção. Em Angola, nada de nada. Eu fiz parte de uma rede que recebia os livros da Publicações Imbondeiro e os vendia nos círculos mais restritos dos amigos. Passou-me pela cabeça oferecer algumas dessas obras ao ministro da Cultura. Por exemplo, a poesia de Cochat Osório, um dos grandes poetas de Luanda. (O maior trovador da cidade foi Mário António). Desisti. Vou mandar-lhe um barril de petróleo do Namibe embrulhado numa pele de zebra, enquanto a zebras não desaparecerem afogadas em lamas petrolíferas. Que se lixe, primeiro o dinheiro!


O general da UNITA, Chilingutila, morreu. Dizem os seus companheiros que ele nunca foi derrotado. Teve um pequeno contratempo quando Savimbi o prendeu, por ser próximo de Tito Chingunji. Salvou-se da morte, por um triz. Voltou a ser preso pelo monstro, por ter oferecido a cidade do Huambo às Forças Armadas Angolanas. Nessa altura não foi derrotado, apenas teve uma atitude elegante e ofereceu aas chaves da cidade aos libertadores, comandados pelo general (de verdade) João de Matos.


Na qualidade de vencedor, Chilingutila acarretou lenha para as fogueiras onde o criminoso de guerra matou dezenas de mulheres e crianças. Grave. Mas mais grave foi a colaboração do general Paulo Lukamba Gato. Ele próprio conta que em 1976, no Bié, foi procurado por uma delegação de cidadãos que lhe entregou um pobre homem, acusado de feitiçaria.


O Gato diz que não acredita nessas coisas do feitiço e, por isso, não matou o desgraçado. No dia seguinte, os mesmos cidadãos apareceram com outro feiticeiro.


- Afinal o homem de ontem não era feiticeiro, este sim é o rei do feitiço. Matem-no!
O general de papelão também não o matou. Porque isso do feitiço não existe, diz ele. Pois. Mas na Jamba ele alimentou as fogueiras onde foram barbaramente assassinadas mulheres acusadas de feitiçaria. Portanto, sabia que estava a cometer um crime hediondo. Ainda o hei-de ver, à porta da igreja Sagrada Família, ao lado Boavida Neto e toda a direcção da UNITA, implorando misericórdia e pedindo perdão ao Povo Angolano. Não contem comigo. Desde que entrei no negócio do petróleo, não perdoo a ninguém.