Luanda - A reconciliação nacional não será feita entre partidos políticos mas sim entre angolanos.  Vivi anos seguidos, com o branco sul africano, nos anos oitenta, até á saída destes do Sudoeste africano-Namibia, em 1989. Sempre lidei com a nata dos boers, nas forças armadas, com oficiais. O mínimo eram tenentes, pre-universitarios e universitários, que cumpriam o serviço militar obrigatório.

Fonte: Club-k.net

O máximo eram generais, naquele tempo. Conversamos muito e longamente sobre o dilema do apartheid. Eles percebiam que a situação política mudaria algum dia mas, enquanto existissem comunistas nas redondezas, eles lutariam, até sacrificando as suas vidas. Separavam as águas e enumeravam as suas inquietações: as questões militares, das políticas segregacionistas internas e das dificuldades da diplomacia, que era muito frágil pela natureza do sistema político da altura, segregacionista, mas, acreditavam que chegaria o dia em que teriam de se reconciliar com os negros, mestiços, indianos, numa única plataforma social de vida, em que teriam uma Constituição que protegesse os interesses das classes e grupos sociais diferentes. A aproximação entre raças, não seria fácil, depois de todo o estrago infligido aos negros mas, ninguém até aquela altura esperava pelo que o homem que foi guardado, a sete chaves, numa prisão, faria para a reconciliação de todos.


Os sul africanos são responsáveis, directos, pela libertação deles mesmos, do jugo do apartheid, com um De Klerk e um Mandela, do mesmo modo que foi preciso um soviético, para dar início ao desmantelamento da URSS, um Gorbatchev.


Tudo se complicou para a libertação do SW africano - Namíbia, quando chegaram os cubanos, em 1975 e tudo foi resolvido com a saída dos cubanos, em 1988/89.


Só os néscios e limitados no saber e que não entendem isso. Era preciso fazer parte do sistema para alterar o curso da história. Mas era preciso mais do que vontade.


Amadureceram todos perante as dificuldades dos anos de luta e discriminação. Eles mesmos, tiraram as lições das suas fraquezas e debilidades, para constituírem força para a renascida de uma nação que se buscava e não se encontrava na irracionalidade do pensamento humano, mas sim, existia, na procura incansável de um país que fosse para todos e não de um país que sofresse segregação política, social e humana.


São os homens de almas grandes que são capazes, de envoltos no amor, transporem as barreiras criadas na diferença e no relacionamento humano.


Na nossa terra, para desespero das nossas esperanças, a reconciliação é submissão de alguns para com outros, num espírito mais cobarde que o apartheid que era anátema contra o pan-africanista e o nacionalista e, foram os próprios vizinhos da África do sul que atrasaram a destruição do apartheid, quando importaram o modus vivendi comunista para as fronteiras desse país sofredor, e com os soviéticos se relacionaram, augurando atingir o cabo da boa esperança, através da trincheira firme da revolução em África.


O que existe hoje nesse país irmão, é fruto da luta de Oliver Thambo, Albert Luthuli, Walter Sisulu, Wilton Mkwai, Joe Slovo, Raymond Mhalaba, Thabo Mbeki, Andrew Mlangeni, Steve Biko, e do espírito humano de Madiba; o problema era o sistema.


Participaram africanos de Moçambique, Tanzânia, Zâmbia, Zimbábue, Angola e até de anónimos, que pela sua entrega directa e influente na compreensão do fenômeno racial, criou crispação com os que se auto-imolam, e insistem na exclusividade da participação nessa luta. Foi uma luta em que todos participaram e o tempo mostrou, hoje, que nacionais sul africanos amam a sua terra, na sua paz, e no se amor recíproco e comum. Não sonham com o alheio. Nem buscam a felicidade alheia. Cooptam para o bem dos sul africanos. Todos eles, com as suas diferenças mas, inexoráveis.


A África do sul peca, essencialmente, pelo atraso no fim da segregação, pois, a Europa, o Estados Unidos da América e o Reino Unido, oficializaram o fim multifacetado desse modo de se relacionar, em meados do século passado, com um preço imenso, pago pela insistência dos extremistas do status quo, da altura.
Até hoje a luta contra a discriminação, não só racial, mas sim multifacetada, continua em todo o mundo.


Angola também luta!

O problema da discriminação no nosso país é sistêmico, é adjudicado as poder político e ao sistema de sociedade: a Constituição e o sistema de governo estão criados para o usufruto de uma estrutura social limitada, ao usufruto dos bens da política e da função unicelular, um extremis, do poder político.


A dinâmica criada pelos actuais, não novos, detentores do poder, vieram abrir brechas na falsidade que já todos sabiam, que Angola não era um Estado unitário forte. No que é mais profundo, este nosso país é plurinacional. Sem um concerto entre todas as sensibilidades nacionais, regionais e locais, Angola vai continuar a ser isso: não haverá presidente de todos os angolanos. Um país fragmentado, disfuncional e desequilibrado, económica, social, diplomaticamente, humanamente, politicamente; uma terra-prisão para os seus cidadãos. Senão vejamos, os amigos dos dirigentes são só deles: Coreia do Norte.


Quantos empresários são dos partidos da oposição? Trabalha-se somente para comer. Não há desenvolvimento nacional científico, saúde débil. O único local onde há diversidade de opiniões é onde existe maior disparidade e falta de consensos: A assembleia nacional, que em termos práticos, parece servir o sistema político. Ainda agora mandaram-lhes uma agenda de alteração simplificada da constituição, para esquecerem as eleições autárquicas.


Angola não está reconciliada! Ainda vive do perigo de ser portenta de uma unicidade dos valores partidários.


Angola é um estado prenhe de inconstâncias: ou é pobreza para quem não for do sistema, exílio para os ladroes e larápios; só sobrevive quem participar da integração. Quem se negar a si e aos seus valores e "integrar-se", no espírito dos anos setenta e oitenta.


Existe a exclusão funcional e sistêmica.


Angola viveu segregação colonial mas também teve, depois a loja do povo! A loja do dirigente! É neste espírito que muitos gostariam de governar agora.


Só, o povo, as Elites que têm sido inocentes úteis e os angolanos sofredores, querem, almejam o poder que não seja excludente.


Quem está no poder, pensa que é obrigatório amá-lo: por regra, quem fica no poder e não faz a diferença, deve sair e deixar o lugar de poder para outros mais capazes e menos exibicionistas.


O poder é para os problemas. Para arranjar soluções. O poder não é para fazer Banga.


Angola=angolanos; não há outra fórmula. Angola multirracial, multipartidária, multifuncional, multiétnica, Angola da conversa deve ser a nossa casa comum.


A exclusão não é de Angola que se deseja. Angola de um partido político não é Angola. Angola é do povo angolano. Angola soluciona os problemas dos angolanos; o único partido de todos angolanos chama-se Angola! Não é segregacionista, não exclui, ama, conversa, alimenta, nutre, protege, liberta, é querida e é de todos os angolanos.


Que haja o partido que suporte o governo mas que o governo exiba, seja executor de uma agenda nacional e inclusiva.
Angola é a história antes de sermos.


Angola é anterior a nós todos! Não é do século XIX, XX ou XXI. Angola é superior á nossa ignorância. É maior que todos nós presentes. Tem um passado que insiste no amor, na liberdade, na harmonização das diferenças; no asseguramento da existência e da participação de todos na vida do país.


Angola tem cadáveres insepultos! Os mortos, sofredores de um passado de exclusão, ainda esperam, pelas frases nobres, nas lápides das suas inexistentes campas.


Aguardam silenciosos mas acertam a marcha, com os vivos, para uma Angola de todos.


Eles exigem a sua presença na inclusão no panteão nacional e vivem na nossa memória; afinal foram eles antes de nós!

 

Não é o dinheiro do petróleo que faz Angola. Não é o diamante: são os seus povos! É o amor e sempre foi assim.

No fim, Angola sempre rejeitará os medíocres. Angola tem as soluções dos seus problemas cá dentro: soluções políticas, sociais, económicas.

Tem faltado é amor por esta terra sofredora.


Todo o fenômeno Angola, gravita á sua própria volta. O exterior do país é de jurisdição internacional.
Angola é cá dentro!

Quando o presidente João Lourenço, assumiu publicamente reverter o estado calamitoso social, económico e político do país, para um destino de justiça social e engajamento económico, para uma economia do desenvolvimento, foi com incredulidade que foi ouvido e reflectido. Mas criou ânimo no ambiente político nacional. No entanto, quando, se classificou de Deng Xiaoping, as esperanças crescentes, murcharam de imediato: A natureza política e social Chinesa, é excludente; uma faca de dois gumes!


Deng só teve bons resultados por manter o controle do Estado com o partido comunista. O que Deng criou foi uma situação exclusiva e oportunista de politização da economia para o sustentáculo do partido comunista. Esta variação, visava essencialmente o crescimento económico para o combate continuado e sistemático contra o ocidente imperialista e capitalista. Os instrumentos do capitalismo eram usados para a corrida ao alcance da hegemonia económica internacional, onde falhou a União Soviética, eles teriam o braço de ferro comunista sobre o sistema econômico capitalista. O partido não estaria nunca em xeque, pois, seria o sustentáculo político e ideológico da nação.


Com Angola, onde o máximo que existe de concertação social e política é a assembleia nacional, onde para questões de fundo que afligem o país, é raro o consenso entre os partidos que aí se representam, nenhum Deng consegue alguma coisa. Mas já, o presidente da maioria de um terço, consegue.


Depois de incontida exultação, como era de esperar, surge a bifurcação: o presidente e o povo ou o presidente e o partido. E como a história é só verdade, agora a realidade política do país e do famoso povo, tornou-se inconforme com um projecto de mudança sistêmico.


A realidade da vida do povo angolano sempre foi de dor! O povo angolano nunca foi feliz, é histórico: até 1974, era a colonização. De novembro de 1975 era o partido único e concomitantemente a guerrilha contra o sistema. De 1992 a 2002, um ambiente de guerra, como consequência das primeiras eleições presidenciais e legislativas. Até 2017, roubalheira desenfreada dos bens públicos e enriquecimento selvagem e institucional, empobrecimento propositado e sistemático de todo um Estado. A criação na mente das pessoas de um Estado indestrutível e exemplar mundialmente, enquanto debaixo de ininterrupta festa, se movia para o estrangeiro o dinheiro e outros activos que distingam a economia. 2017 até á data uma indefinição nas políticas nacionais e nos caminhos a serem percorridos para a renascida do Estado político, económico, social e humano, vexado, envergonhado.


O dilema SARS-COV2, é outra conversa.


Então, surgem situações como as de Kafunfo! Uma localidade em Angola, fora do sistema administrativo, ao menos foi o que disse o activista social que lá esteve: nem é município, comuna, distrito, aldeamento, nada... Não tem nomenclatura! E como é que um Estado de direito, soberano, permitiu a existência, por longos anos, de indefinição legal, de uma localidade, com a natureza económica de Kafunfo? E mais, como foi possível até á data das mortes em Kafunfo, o Estado, portador de instrumentos de regulação administrativas, políticas e sociais, não tivesse resolvido ou determinado atempadamente a inconstitucionalidade do grupo político extemporâneo, que clama por uma verdade jurídica inadequada?


O Estado passou, segundo soube-se pelos mass média, aquela área á pente fino, numa operação denominada, operação brilhante, onde os estrangeiros ilegais, foram deportados para os seus países de origem. Donde é que saíram estes, os que se rebelaram junto aos nacionais? Quão voláteis são as fronteiras de Angola?
Se houvesse vontade política, este é o momento para conversa franca e aberta; para o embate do intelecto, pois, ainda há reclamações de que acordos da Zâmbia, Lusaka, não foram cumpridos. Cada partido tem o seu entendimento da história nacional. Os heróis são dos partidos políticos. Do mesmo modo que a roubalheira foi de grupo, as regalias advindas das riquezas nacionais, não são abrangentes ao mosaico nacional.


Os assuntos da reconciliação nacional, são profundos: nacionais, regionais, locais, sociais, jurídicos, humanos, tocam em tudo que afecta a vida do angolano.
Enquanto o partido político for superior a terra, ao homem angolano, á Grei, viveremos empolados na limitação das nossas possibilidades, como Estado e como Nação.

Kate Hama
Cientista Social
140321