Luanda - João Manuel Gonçalves Lourenço, devia pedir perdão, primeiro, em nome do MPLA por se tratar de crimes e de vítimas de um conflito interno do MPLA ocorrido durante a vigência do Estado de partido único, em 1977. Jlo é chefe do Estado de direito, da II República, cujos fundamentos são diferentes. Os três dirigentes da UNITA, que haviam saído do Huambo para vir negociar a paz pós eleitoral em Luanda, não tombaram “em combate". Foram traiçoeiramente assassinados em 1992, já depois de assinados os Acordos de Paz e declarada uma amnistia geral e igual para ambas as partes do conflito. Nada tem a ver com o 27 de Maio. Isto reduziu o impacto do objeto/ dimensão do política do acto e lançou dúvidas sobre a genuinidade, os fundamentos e o âmbito da intencionada reconciliação.

Fonte: Club-k.net

Naquela altura, 1977, havia práticas autoritárias e um sério conflito ideológico no seio do MPLA. As correntes de opinião eram consideradas “divisões” e seus promotores estavam sujeitos ao ostracismo, à expulsão ou mesmo à morte. O MPLA estava dividido em quatro alas, praticamente autónomas: uma liderada por Agostinho Neto, outra conhecida por Revolta do Leste e liderada por Daniel Chipenda e outra, a dos intelectuais, conhecida por Revolta Activa e liderada por Mário de Andrade. A outra por Nito Alves, dentro da ala de Neto, o presidente.


Alves Bernardo Batista (Nito Alves) fazia sérias acusações de desvios de linha e de corrupção contra a ala de Neto. A ala de Neto, por sua vez acusava os outros de “fraccionistas”. Nito Alves controlava as Forças Armadas, o poder popular nos Bairros de Luanda e a maioria dos militantes activistas daquele movimento. Agudizou-se o conflito que alguns caracterizam de “ideológico”. Nito Alves e José Van Dúnem foram expulsos do Comité Central do MPLA em 21 de Maio de 1977, quando já estava acordado para Dezembro daquele ano a realização do I Congresso daquele Partido. Uma ala acusava a outra de corrupção e desvio de linha. A outra acusava os contestatários de “fraccionistas”.


O certo é que, em 27 de Maio, alguma centenas de pessoas saíram à rua, em Luanda, poucos sabiam de concreto o que se estava a passar, a emissão da Rádio Nacional de Angola foi interrompida por algumas horas e alguns “presos políticos” do mesmo Partido foram libertados das cadeias. Para uns terá havido uma “manifestação” para uns ou uma tentativa de “golpe de estado”.

O que a memória colectiva dos angolanos regista é que a ala de Neto torturou massacrou e assassinou mais de 30000 angolanos, a grande maioria quadros negros, os intelectuais da altura. Em rigor, se o objetivo é construir o futuro, construir a Nação, e ñão fazer aproveitamento eleitoral perante certo eleitorado, o PR agiu com pequenez, e não esteve à altura da dimensão do desafio. Depois desta tragédia sem precedentes, Angola ficou mais pobre em capital humano e a identidade política e ideológica do MPLA ficou ainda mais confusa.


Aspectos negativos da cerimónia de Jlo:

1- Manteve como razão dos massacres a tese de “tentativa frustrada de golpe de Estado”, que é fortemente contestada pelos sobreviventes e pelos historiadores.

2- Ignorou o MPLA. Ignorou os algozes. Nada disse sobre uma eventual responsabilização dos algozes ou uma eventual reparação das vitimas. Ou fazia em nome do MPLA, como presidente do MPLA, ou fazia em nome de todos, como presidente de todos e assumia os erros de todos, criando uma comissão de VERDADE, PERDÃO E RECONCILIAÇÃO e pedindo a todos q se perdoem mutuamente.

3-Confundiu intencionalmente as mortes resultantes do conflito ideológico intrapartidário do MPLA-Estado com as mortes resultantes da guerra entre o Governo e a UNITA da qual já se firmaram Acordos de Paz que incluem amnistia geral para os crimes cometidos no contexto da guerra por ambas as Partes.

4- Ao tentar politizar o evento para fins eleitorais ou outros Sua Excelência o Presidente da República perturbou de certo modo a solenidade do momento e reduziu a percepção de genuidade do pedido de perdão às vítimas do 27 de Maio, numa data específica, o 27 de Maio, quando, no final, exortou a UNITA, despropositadamente, a pedir desculpas às vítimas do conflito armado, esquecendo-se que a UNITA já o fez por várias vezes e há muito tempo.

5- O Presidente esqueceu-se que o processo de reconciliação nacional negociado em Bicesse e em Lusaka e ainda não materializado, nada tem a ver com a repressão e os assassinatos inerentes ao processo 27 de Maio. O âmbito e o conteúdo da reconciliação negociada entre o Governo e a UNITA por via dos Acordos de Paz Para Angola e seus Anexos, em 1991, 1994 e 2002, não incluem a necessidade de reconciliação intrapartidária do Partido político MPLA nem as reparações e medidas corretivas que o Estado deve fazer às respectivas vítimas.