Ondjiva - á não há lágrimas entre os flagelados do Coroca, da Cahama e da zona agreste de Ombadja. São os ditames da seca severa, inclemente. Almas famintas, esqueléticas, rebanhos definhando diante de chimpakas evaporadas. A fome corroi os músculos e os espíritos em todos os territórios. Os soberanos locais estão de mãos atadas.

Fonte: Club-k.net

Perguntem aos guardiões da Ombala yo Mungo e aos súbditos da Ombala ya Nalaluheque, ambas no município de Ombadja. É importante consultar os restauradores do Reino de Okwanhama, liderados por Jerónimo Haleingue, antigo Vice-Governador Provincial do Cunene, considerado sucessor legítimo do Rei Mandume, depois de mais de 100 anos de vacatura no trono do lado de Angola. Na Namíbia, a coroa pertence, desde 2006, à soberana Marta Mwadinomo, nome de baptismo cristão da cidadã namibiana melhor posicionada na linha recta de sucessão de Mandume Ya Ndemufayo. Não se pode tentar combater a seca sem se conhecer a história. Dos povos e da terra.

 

Com o cacimbo em progressão, o sol quase fica resignado face ao frio penetrante. A carne, a banha e o tutano viraram proteínas com prazo de validade vencido. E já não há sábios endeusados para ordenhar as cadavéricas vacas leiteiras. As tetas também secaram.

 

Oh, doutos doutores, iluminados decisores de clarividente sapiência. Para que serve a ciência, as tecnologias da quinta geração e as conferências engravatadas com diplomas e títulos pomposos?

 

Ano após ano, repete-se a velha história e torram-se milhões. Sem glória. A chuva é sempre apontada como a causa do problema do Cunene. Na abundância, com enxurradas, gera enchentes e alagamentos diluvianos. A escassez, ou melhor, a ausência de chuvas regulares, provoca esta seca severa, responsável pela fome e a sede de humanos, bovinos e caprinos. Assim começou, faz tempo, a desumanização dos autóctones.

 

E qual a solução? A solução passa por seriedade, cientificidade, profissionalismo e patriotismo, acima de tudo. Basta um olhar atento ao pacato país vizinho do sul. Não tem sequer um rio, mas garante de qualidade para todos os cidadãos.

 

Não há fronteiras académicas visto que a ciência não tem pátria. É universal. Do lado de lá, o mesmo povo, as mesmas divindades, tradições milenares, agregando know how, sem complexos.

 

Oh, doutos doutores, das engenharias e dos cifrões, quais são as sete diferenças entre os duas faces da mesma moeda? No outro lado da fronteira, rigor é cultura, transparência é lei e não há modelo de gestão que não seja sustentado pelos alicerces da eficiência e da accountability, ou seja, a prestação de contas. Lá não há contratos opacos porque a massa crítica tem voz activa nos principais telejornais.

 

Do lado de cá, ainda se regista um desperdício monumental. Os caudais provenientes planalto central são simplesmente descartados no oceano Atlântico, por via da Foz do Cunene, aguardando os tais projectos milionários, para não variar. Enquanto isso, os rebanhos vão minguando ante a impotência dos criadores e as promessas dos decisores. Se não há nem uma gota de água milagrosa, alguém tem, pelo menos, um pingo de vergonha?

 

Já não há lágrimas, nem saliva suficiente para humedecer os lábios ressequidos e refrescar as gargantas insubmissas.

 

Mas qual a serventia do rio caudaloso que jorra milhões de metros cúbicos a partir do planalto central? E os aquíferos abundantes que fornecem água cristalina, grátis, aos reservatórios subterrâneos do visionário vizinho do sul? Em boa verdade, Cunene merece uma explicação. AGORA.