Maputo - A quando dos "assassinatos de Junho de 2009", que no passado dia 5 completou 12 anos, o Serviço de Informação do Estado na Guiné-Bissau (SIE) era  dirigido por um DG, o então Coronel Antero João Correia que era muito ligado a Nino Vieira. Serviu-lhe em sucessivos governos como Chefe da segurança, Consul em Paris e comandante geral da Polícia. A semana que antecedeu aos assassinatos do dia 4, o Coronel Correia estava em Lisboa. A sua ausência do país foi aproveitada para "penetração" dos seus colaboradores. Telefonei-o e desconhecia sobre preparativos de golpe de Estado que se estava a imputar.

Fonte: Club-k.net

No dia do crime (4 de Junho), Antero Correia recusou assinar um comunicado (do governo de Carlos Gomes Jr e Zamora Induta) que atribuía tentativa de golpe de Estado por parte do ex- candidato presidencial, major Baciro Dabó. Correia acabou detido. Por volta das 09h36 da manha do mesmo dia, o documento seria assinado por um adjunto, o falecido Coronel Samba Dialó.

 

O então candidato presidencial, Baciro Dabó acabaria executado em casa denotando debilidades do SIE (já com o coronel Samba Dialo no comando) quanto a sua gestão. Seria o SIE - com o seu DG detido, Presidente da República e Primeiro Ministro ausente do país - a anunciar a alegada tentativa de golpe de Estado em Bissau.

 

O comunicado do SIE, imitido sem o consentimento do poder executivo, era sinal da existência de um poder “paralelo” que terá ordenado as ordens das execuções e a divulgação do documento para coincidir com um outro comunicado emitido pelo comandante José Zamora Induta. Ambos comunicados contradiziam -se. O SIE dizia que solicitou apoio da “polícia militar”, já Zamora Induta dizia que o SIE pediu reforços as suas tropas.

 


O comportamento das vítimas (Hélder Proença e Baciro Dabó) não denunciava atitude de tentativa de golpe de Estado razão pela qual a própria população recusava a versão das autoridades. Hélder Proença e Baciro Dabó não estavam no activo. Baciró não gozava de simpatia das forças militares (tratava-no por Major da polícia), não tinha como mobilizar uma insurgência.

O Comunicado do SIE dizia que nas horas a seguir ao alegado golpe, o grupo de Baciró e Hélder Proença iriam indicar um Primeiro-ministro do “Governo de transição” para propor a um chamado “alto comando das forças revolucionárias”, a composição do novo governo. Este dado em si, contrariava com a agenda que as vítimas teriam no dia seguinte.


O candidato Baciro Dabó tinha na agenda, para sábado, a orientação de uma parte do grupo da campanha que iria deslocar, a Bafatar, zona leste do país na qual procederiam o lançamento da mesma. Ultimamente mantinham reuniões que se estendia até mais tardar. Horas antes do seu assassinato esteve reunido com Lamine Djata, o director da sua campanha, para discutir o programa do dia seguinte. Acabaram por converter a reunião em convívio estendendo-se até tarde. Presentes neste, dia em sua casa estavam dois altos dirigentes do MPLA, em passagem, Paulo Teixeira Jorge e João Martins "Jú".

 

Baciro que era também cantor, tocou guitarra com os convidados e assaram carne de cabra a moda local. As 2h10, da manha Lamine Djata se retirou da casa de Baciró. Por volta das 3h, um grupo de 30 elementos armados invadiu a casa de Baciró, neutralizou a sua guarda pessoal, confiscou os telemoveis dos vizinhos e dirigiu-se ao seu quarto onde seria assassinado. Para além de terem-nos encontrado já em retiro (dormir), estes dados contrariam mais uma vez com a versão apresentada no comunicado do SIE que falava em troca de tiroteios. A casa de Baciró não mostrava sinais de tiroteios. Apanhou dois tiros do estômago e um na cabeça. O seu irmão mais velho, Yaya Dabó, também já falecido, falava em 11 tiros.

 

Hélder Proença, o ex-ministro da Defesa que vivia temporariamente em Dakar, deslocava-se a Bissau naquela noite dos assassinatos. Logo após a guarda fronteiriça ter avisado aos mentores dos assassinatos, estes ordenaram que o deixassem atravessar de jangada “em paz”. Foi perseguido até ao troço que dava para a ponte João Landim, a 15 de minutos de Bissau, onde seria executado por volta das 9h da noite. Hélder Proença, iria passar a noite no Aparthotel Ruby (de uma amiga Dina Adão) a poucos perímetros do edifício das Nações Unidas em Bissau. Hélder era um reconhecido empresário. Uma das características de golpe de Estado é que são dados por militares que reclamam problemas financeiros invocando abuso a constituição. Não era este o caso de Proença.

 

Um músico conhecido por Domingos que ultimamente encontrava-se em situação de penúria, foi neste dia visitar o ex Primeiro-ministro Faustino Imbali, que o acolheu para uma refeição. Precisamente na hora em que este comia, um grupo de militares atacou a residência do ex PM. Ambos foram espancados. O ex-Primeiro Faustino foi citado por Zamora Induta como estando detido nas mãos do SIE. A esposa desafiava que o apresentassem.


O SIE, no seu comunicado de então citava que os supostos golpistas queriam matar Zamora Induta e Carlos Gomes Jr, . O facto de estas duas entidades terem sido apresentadas constantemente como vitimas revelava cobertura de algo. Ambos estavam com as imagens desgastadas, por efeito, da cumplicidade que ultimamente emitiam . A sociedade guineense revelava-se desiludida pela submissão de Carlos Jr ao chefe militar interino e ao mesmo tempo desapontada com a postura benevolente de Zamora Induta.

 

A ideia de incutir na população a ocorrência de um acto de “golpe de Estado” foi amadurecida duas semanas antes do crime por Zamora Induta que insistentemente aparecia a imprensa a dizer que certos políticos estavam a instigar os militares para uma subversão.


De acordo com leituras apropriadas, a insistência das denúncias do comandante Zamora Induta indicava ter sido uma medida estimada a propiciar e justificar mais a frente que os militares andavam mesmo a ser instigados.


Não obstante as detenções sumarias que tiveram lugar naquele dia, havia informações de que os detidos estavam a ser torturados para serem forçados a confessar que a tentativa de golpe de estado era real.

Os assassinatos do dia 4 de Junho de 2019 mostrou ser um fabricado “golpe de estado” provocado por militares a favor de uma linha do PAIGV como medida previa para sua manutenção no poder. Foi um ajuste de conta destinado a amortecer o poder de figuras pro-Nino dentro do partido no poder.