Lisboa - Há uns anos, fui entrevistado para um jornal. Respondendo a várias perguntas, afirmei que em Angola, no lugar do homem novo que a revolução prometera criar, surgiu, com muitos defeitos e poucas virtudes, o famigerado homem mau. Lembro-me de essa afirmação ter sido citada muitas vezes e que, como é natural, não agradou à gente que sempre apoiou o rumo desgovernado escolhido para o destino do país. Costumo ser coerente com as minhas ideias e quem me acompanha lembrar-se-á que fui defendendo João Lourenço e a sua tese reformista sempre que me foi possível, e desde que há quatro anos foi eleito Presidente da República. Tal como senti amargamente o logro da antiquada ideia do homem novo, sinto agora o desencanto do evidente falhanço da prometida transformação gradual da nossa sociedade, fosse ela na legislação como nas instituições. Foram animadoras esperanças anunciadas por aquele que se tornara para mim, um forte símbolo de mudança. Na conversão esperada integrava-se necessariamente o dito homem novo, ou pelo menos, pessoa renovada.

Fonte: Club-k.net

E sonhei com os bons exemplos vindos de cima, de quem governasse, dos jovens a quem eram dadas oportunidades jamais sonhadas, passíveis de os fazerem entrar na história do país. Infelizmente, por razões conhecidas, grande parte dos auxiliares do Executivo liderado pelo Presidente João Lourenço vêm defraudando de modo perturbante as nossas expectativas, facto que me obriga a dar relevância neste texto a uma dessas personagens. Trata-se do Ministro Marcy Lopes que é – certamente que os leitores já deram conta disso – responsável por uma (logo a seguir à Saúde e à Educação) das mais complexas e difíceis pastas de gerir no actual contexto em que Angola vive. Basta recordar o polémico projecto de divisão administrativa do país, o próximo pleito eleitoral e o manancial de problemas políticos e administrativos que o envolvem, entre muitos outros assuntos delicados. Por tudo isso, e a exemplo do que já fizeram vários articulistas, falarei do Ministro angolano da Administração do Território, destacando o indivíduo que carrega aos ombros carga pesada de responsabilidades públicas, que não pode nem deve (mandam as regras) falar em público sem que esteja preparado, técnica e politicamente. Para defender a causa que tem em mãos, ou seja, o governo que representa e sobretudo a reputação do país, que não é sua propriedade, é de milhões de cidadãos (às vezes os efebos esquecem-se disso). O jovem dirigente, fez absurdamente o contrário. Teve comportamento negativo exposto em impensáveis e ridículas apresentações no exterior do país, onde fez afirmações levianas que não lembrariam ao diabo, perante grandes plateias, ávidas de deslizes governamentais. Se feitas em país diferente do nosso, não duvido que levassem à sua imediata exoneração. Admira-me, ou talvez não, que ainda esteja em funções, quando por males menores ou nenhuns, outros dirigentes foram exonerados, numa típica e inquietante mostragem de que o nosso Executivo é recordista em África, quiçá no mundo, em matéria de exonerações marcadas pelo ónus da justeza ou da falta dela.


Dito isto, acrescento ao meu desencanto a triste actuação do governante e o apoio de uma falange dos tais homens maus que eu abomino. Como é possível defendê-lo, na base de argumentos tão balofos? Sem noção de patriotismo, proferiu palavras que ficarão gravadas vergonhosamente, nos anais da governação angolana. O jovem ministro, no seu destemperado e muito mal elaborado discurso ofendeu os seus compatriotas e deu azo a que fosse ruidosamente criticado, sujeitando-se agora a pagar as consequências do seu acto, se não diante de outro, pelo menos, na frente do Tribunal Popular, onde, por direito próprio, todos somos juízes e magistrados. Dizem os que o conhecem, que o jovem que chegou a Ministro foi sempre impetuoso, desde menino. Carácter forte, bem vincado pela sua génese, cristalizou à medida que foi crescendo. Arrogante, vaidoso, ambicioso, sempre a querer ser um homem diferente dos outros. Ninguém o pode condenar por isso nem por se tratar de um daqueles indivíduos com a marca visível no rosto do homem ganancioso, que luta por objectivos. Pessoas assim, são normalmente espertas, mas fornecedoras da estúpida ilusão de serem inteligentes. É possível que Marcy Lopes tenha um objectivo em mente, como por exemplo, ser alguém notável na política ou nos negócios. Como já chegou a ministro, quem sabe se mais tarde não subirá a um posto mais elevado?!


Infelizmente e para mal dos seus pecados, as imagens estão aí a correr mundo, não podem ser apagadas. Não há como negar mais um erro tremendo praticado em nome do Governo de Angola. Ganha mais força o meu receio. Acredito que se instalou entre nós, o temido homem mau. A menos que outras reformas sigam para melhorar as actuais, manterei firme esta ideia. Assim, mantê-lo numa pasta com ligações próximas às questões eleitorais que já fervilham de suspeições, é indubitavelmente um perigo para o Executivo e para o MPLA. Resumindo, é um óptimo candidato para o despedimento, para a exoneração que se impõe.


Convido os que o defendem a reflectirem sobre esta “barraca” protagonizada pelo ministro, uma vez que a Nação tem que estar à frente dos interesses pessoais ou dos de pequenos grupos que só pensam “naquilo”.


Até domingo à hora do matabicho.

Lisboa, 30 de Outubro de 2021