Luanda - Tomámos conhecimento que no âmbito do Concurso Público n.º 05/2021 o Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE) elaborou um relatório preliminar da negociação em que considera como vencedora para a privatização da gestão e exploração da rede composta por 12 hipermercados e supermercados Kero a proposta apresentada pela empresa Anseba, Lda.

Fonte: Club-k.net

O Carrefour foi o outro candidato admitido com actividade retalhista internacional há mais de 60 anos, presente em 33 países, 10 dos quais africanos, com mais de 13 mil lojas e de 320 mil trabalhadores.


A Anseba apenas tem um supermercado conhecido em Angola.


A surpreendente e inesperada decisão da Comissão de Avaliação fundamentou-se essencialmente, na pontuação atribuída a um dos itens da Componente Financeira: a Componente variável – Percentagem de Indexação do Pagamento Sobre as Receitas (22,8 vs 15,2). Não se percebendo o que fundamentou uma avaliação tão díspar entre as propostas.


A Anseba foi melhor avaliada na experiência comprovada da equipa de gestão em apenas mais 0,1.

Não se percebendo o racional desta nota quando a equipa de gestão do Carrefour é também composta com experientes especialistas nacionais e internacionais franceses e brasileiros que já trabalharam em vários países, com mais de 30 anos de experiência pessoal e profissional.


Nos 7 itens definidos no Concurso Público a proposta apresentada pela empresa Carrefour foi considerada pela Comissão de Avaliação do IGAPE a melhor em 5!


Foi, ainda, considerada a melhor em 2 dos 3 critérios estabelecidos - Componente Corporativa e Componente Técnica.

A própria Comissão de Avaliação considerou positivo e realçou a importância da candidatura de uma empresa líder de mercado no sector da distribuição alimentar e não alimentar de retalho a nível mundial. Referindo, mesmo, que é uma situação que representa um claro “valor acrescentado”.

A introdução da rede de franchising do Carrefour em Angola é considerado unanimemente como um factor de valorização extraordinário de todos os activos que integram a Rede de Supermercados Kero, desta marca e uma garantia adicional de qualidade dos produtos comercializados.


Sendo simultaneamente, visto a nível internacional como um factor de credibilização, estabilidade e segurança do mercado angolano. Melhorando, assim, a imagem externa do país e do Executivo.


A presença de uma rede internacional com a dimensão e capacidade financeira da Carrefour é sinónimo de boas práticas de gestão, transparência, e de produtos de elevada qualidade a menor preço para venda aos consumidores. A Carrefour encontra-se presente em 4 continentes e em 10 países em África.


Acontece que, essas referências não tiveram o devido reflexo na pontuação atribuída ao Carrefour, ficando a clara percepção de que a Comissão esteve sempre mais preocupada em não deixar cair a proposta da Anseba.


Não se percebendo, por isso, que no critério respeitante à Componente Corporativa (experiência e perfil geral da empresa, nível de faturação do retalho, número médio de lojas, mercados em que se encontra presente, quota média de mercado de retalho) a diferença de avaliação foi de apenas 0,6 a favor do Carrefour, quando os dados estatísticos de retalho apresentados não têm qualquer comparação possível entre os candidatos.


As boas práticas na avaliação de uma proposta apresentada num concurso público aconselham sempre que sejam devidamente esclarecidos, pelos avaliadores/júris, quaisquer valores que sejam anormalmente altos / díspares entre as várias candidaturas apresentadas e os valores médios praticados no mercado nacional ou em caso de ausência de referências nacionais nas melhores práticas internacionais.


No caso concreto isso não aconteceu.


Sendo também estranho que a proposta considerada como vencedora seja aquela que menos pretende investir no desenvolvimento do negócio, logo na criação de riqueza, pagamento de impostos, desenvolvimento da economia formal, na oferta de produtos de qualidade ao consumidor angolano, nem aposte no desenvolvimento dos produtores e fornecedores nacionais.


Outra situação anormal que nos foi reportada foi o facto de a Anseba ter percebido que bastava preocupar-se com um único item para poder ganhar o concurso, sem ser necessário apresentar uma proposta devidamente equilibrada, trabalhada visando efectivamente o desenvolvimento do negócio e do mercado retalhista alimentar.


No lançamento deste concurso público foram colocados a circular diversos rumores nas redes sociais primeiro que a Carrefour iria apresentar uma candidatura, pouco tempo depois isso já não era verdade, que não tinham interesse em investir em Angola, posteriormente, a vencedora do concurso seria a Carrefour. Tudo isto não passou de uma manobra de desinformação do público e de descredibilização da marca e de um candidato.


A preferência dada pelo IGAPE à Anseba é, ainda, mais estranha pelo facto de esta empresa já ter estado envolvida desde 2013 em várias situações ilegais, designadamente, por comercialização nas suas instalações de 17 toneladas de farinha de milho branco de marca própria que se encontrava deteriorada, imprópria para consumo humano e que foi apreendida pelo INADEC.


Há referência de, pelo menos, outra apreensão de grandes dimensões, cerca de 1.670 sacos de farinha da marca Anseba fora do prazo de validade e impróprios para consumo.


A Anseba teve a actividade do seu único estabelecimento comercial grossista suspensa no Mercado do Km 30, em Setembro de 2019, no decurso de uma operação de fiscalização do INADEC por especulação de preços de produtos da cesta básica.


A empresa estava a tentar lucrar ilegalmente com a venda de produtos acima do preço, aproveitando-se da grave crise económica que o país atravessava e das necessidades dos clientes em comprar produtos para aumentar os seus proveitos além do legalmente permitido.


Constatou-se, também, que existiam vários gatos que faziam as suas necessidades em cima de mercadoria que se encontrava armazenada/exposta, tornando-a imprópria para consumo.


Caso a Comissão de Avaliação tivesse realizado uma isenta apreciação à estrutura societária da Anseba teria notado que os cidadãos estrangeiros, naturais da Eritreia, Kalab Woldeselasse Berhe e Yemane Berhe Weldeslassie, proprietários daquela sociedade tiveram, aparentemente, como sócios fundadores na empresa entre 2016 e 2018, vários familiares (Yves Fernandes, João Fernandes e outros) do agora Ministro da Indústria e do Comércio, Victor Francisco dos Santos Fernandes, que há mais de 15 anos desempenha cargos de nomeação política. Note-se que o nome Anseba designa uma região da Eritreia que por sua vez deu o nome a um rio.


Esta relação próxima entre os sócios da Anseba e o Ministro da Indústria e Comércio poderá, eventualmente, ajudar a perceber a preferência pelo IGAPE em adjudicar a uma empresa sem grande experiência na distribuição alimentar a retalho a exploração de uma das maiores redes nacionais de hipermercados e supermercados. A Anseba é uma empresa que se dedica essencialmente à fabricação de detergentes, farinhas, fraldas e sumos, passando agora a deter o monopólio desde a produção dos produtos até à venda ao consumidor final.

 


Mais uma vez, o poder político angolano prefere alimentar as suas clientelas e favorecer aqueles que lhe são próximos e eventualmente oferecem avultadas contrapartidas pelas benesses que recebem em detrimento daqueles que possuem condições, know-how, capacidade financeira, recursos humanos para realmente desenvolverem os negócios, transacionarem produtos de qualidade a bom preço e tornarem competitivo o mercado angolano.


Continua o nepotismo, tráfico de influências e a corrupção no Governo de Angola.


Esta situação poderá será vista como mais uma má decisão por parte das entidades públicas angolanas responsáveis pela adjudicação de concessões a exemplo do que está a acontecer com a atribuição da concessão de comunicações electrónicas à sociedade libanesa Africell que não tem apostado nas empresas angolanas, no recrutamento e formação de cidadãos nacionais.


Os potenciais investidores, empresários nacionais e estrangeiros interessados na aquisição de empresas em processo de privatização ou na exploração de negócios não sentirão confiança, segurança, rigor e independência nos relatórios de avaliação e nas decisões de adjudicação visto que são valorizados itens de forma desgarrada, sem terem em consideração o desenvolvimento do negócio com um todo de forma sustentável e sem o devido rigor.


Preferindo o IGAPE hipotecar o futuro do mercado e do reforço do tecido empresarial em Angola em troca de uma incerta comissão que na realidade poderá ficar muito aquém do esperado por falta de visão estratégica de quem decide e executa.


A faturação de quem não pretende investir no desenvolvimento estruturado do negócio será sempre inferior à de quem investe e tem uma visão de futuro.


Esta situação irá apenas potenciar e monopolizar por parte da Anseba a venda de um conjunto de produtos acima do preço médio de mercado, visando com isso o lucro fácil e a cartelização do mercado da distribuição alimentar, em claro prejuízo das populações que terão o seu poder de compra bastante mais reduzido e terão ao seu dispor produtos de muito menor qualidade e em pequenas quantidades.

 

A acrescer a tudo isto o histórico existente de falta de transparência na definição dos preços dos produtos à venda, da baixa qualidade dos produtos, e das más práticas de gestão da Anseba que já são conhecidas.

 

Tudo isto em contraponto com a experiência demonstrada pela rede Carrefour na gestão de hipermercados e supermercados, o serviço prestado aos clientes com menos capacidades financeiras.


Mais uma vez as empresas que evidenciam possuir condições, know-how, capacidade financeira, boas práticas de gestão de acordo com os melhores padrões internacionais, recursos humanos para realmente desenvolverem os negócios, transacionarem produtos de qualidade a bom preço e tornarem competitivo o mercado angolano são preteridas.


Mais grave de tudo isto o facto de o IGAPE demonstrar não ter capacidade para exercer em plenitude e com profissionalismo todas as competências que lhe foram atribuídas pelo Governo, em vez de encontrar soluções, cria mais problemas e constrangimentos, não estabelecendo um critério claro, objectivo e racional para análise, nem uma metodologia de avaliação das propostas apresentadas pelos candidatos.


Conhecendo um pouco do circuito dos esquemas, dos favores e da gasosa pensamos que é altura de realmente pensarmos no Povo e em Angola, por isso imploramos que nos ajudem a evitar que os escolhidos continuem todos a ser da rede familiar dos membros do Governo e do MPLA.