Luanda - Haveria maior consenso no debate da fome que vem se tornando deprimente. A pobreza tem sido apontada por especialistas em matéria de fome como causa primeira da fome o que pode servir de ponto conciliador entre a vanguarda que confirma em própria pele a experiência nas comunidades e o gabinete que se mostra reticente sobre a falta de comida nas famílias.

Fonte: Club-k.net

Há referências sobre o aumento da produção nacional de alimentos o que pode impedir na compreensão de que há falta de comida nas famílias. Ao digerir a situação de pobreza das famílias, será fácil sentir que elas não têm acesso aos alimentos por mais que sua produção tenha aumentado a nível nacional.


A questão da fome virá a ser mesmo relativa, de facto, quando forem citadas simplesmente as suas causas secundárias. Assim, se a seca for indicada como a causa da fome, então a fome será um problema restritivo do sul do país, das regiões do Cunene e proximidades; se for a guerra, então não há mesmo fome porque ela cessou há cerca de 20 anos; se for o terrorismo, então isso não tem tanta relação directa com o país…


Ora, a seca, a guerra, o terrorismo, as doenças são agentes declarados de pobreza. Indubitavelmente, é preciso reduzir o índice de pobreza das famílias, considerar de forma séria os seus factores. A seca causa pobreza e é endémica em certas partes do país. A guerra e o terrorismo causam pobreza e esses males têm a mesma proporção dos crimes violentos nos centros urbanos do país e não só, há registos de crimes em zonas rurais contra agricultores e pastores que têm de suspender a sua produção por insegurança e roubos. As doenças causam pobreza: as verbas que deveriam servir para o combate à pobreza são certamente alocadas para o combate e prevenção da Covid-19; o país é citado entre os mais fustigados pela Sida, como tendo mais crianças e adolescentes seropositivas; 95% dos casos de malária dão-se na África Subsariana, de que Angola tem porção. Por cima de tudo: crise financeira, desemprego, estagnação salarial, agravamento de impostos, inflação

Greve aqui e acolá!


Portanto, há maior coerência considerar a pobreza como causa primeira da fome ao incluir na lista dos que passam fome aquelas pessoas (que não trabalham em empresas agrícolas e) que não têm possibilidades de fazer biscates, já que se refere que somos um país de biscateiros. Assim, se quem varre as ruas na cidade de Luanda ganhar somente um salário mínimo, quase 50 USD, ele ficará pobre e padecerá de fome. Por mais que a produção de melões aumentar ele continuará a passar fome. O produtor não vai oferecer de graça a sua produção. Dará a quem paga e quando não houver mais consumidor a nível local preferirá ou exportar seu produto ou destruí-lo e descontinuar a produção.


Se o médico, o trabalhador, reclama melhorias salariais, sente que está a ficar pobre e prevê que por mais um período terá até dificuldades de ser “sócia de galinha”; fome. O que está em jogo pode ser o seu salário vital e nem estará ainda em questão do salário justo, como se pode pensar. Se se perdeu o poder de compra então há pobreza e…


Nesse contexto haverá mais pobres: a lavadeira, a babá, o barbeiro, o vendedor, o engraxador, o taxista, o mecânico, o pedreiro, o pintor, o jardineiro, todos vão para a pobreza sem clientes que solicitem seus serviços. Directamente, não vão morrer de fome, mas terão de se alimentar de forma modesta e às vezes ficarão vulneráveis a apanhar enfermidades, optar pela automedicação etc. etc.


Se o número de desempregados for maior então há pobreza na mesma proporção. Se alguém ou um grupo revela que está pobre ou a empobrecer, então está a deixar de satisfazer as suas necessidades elementares de sobrevivência e a fome será o ponto fulminante da situação. Por essa razão, o combate à pobreza (e à fome) deve ser julgado sobretudo na dimensão da problemática da saúde pública e da estabilidade política e social.

Sérgio Sabalo

25/12/2021