Alemanha - Em meados de dezembro, o arcebispo emérito do Lubango, Zacarias Kamwenho, fez duras críticas ao Governo angolano e ao Presidente da República. O prémio Sakharov acusou Lourenço de fazer de Angola o "seu colégio privado".

Fonte: DW

Em Angola, o arcebispo emérito do Lubango, Zacarias Kamwenho, fez recentemente duras críticas ao Governo e ao Presidente da República. Dirigindo-se a João Lourenço disse, entre outras coisas, que "Angola está cansada de ser um colégio privado do seu partido".


Mas também Kamwenho aproveitou os 20 anos do seu prémio Sakharov, através de uma comunicação, para pedir mudanças. O prémio para liberdade de pensamento é atribuído anualmente pelo Parlamento Europeu aos que se destacam na defesa dos direitos humanos. O líder religioso teve um papel de destaque na luta pela paz e reconciliação em Angola, no contexto da guerra civil.


Em entrevista à DW África, o analista político José Gama considera que tais pronuciamentos não representam rutura entre os bispos e o MPLA embora estajamos "numa fase em que muitos dirigentes do MPLA têm estado a fazer pronunciamentos de ostilização ou de rejeição à chamada de atenção que a igreja católica tem feito".


DW África: Em jeito de resumo, em que consistiu o pronunciamento do arcebispo Zacarias Kamwenho?
José Gama (JG): Ele faz alusão à mudança de Presidente em Angola. Mostra que acreditava que, com a chegada de João Lourenço, teriamos o fim da corrupção mas dá a entender que, pelo contrário, a corrupção continua.

No segundo ponto faz menção do pronunciamento das autoridades angolanas face a crimes cometidos contra dirigentes da UNITA em 1992, em que as autoridades reconheceram ter sido um erro político. Nota que foi um gesto bom, mas ao mesmo tempo incompleto porque não traduz necessariamente uma reconciliação completa. Estes gestos das autoridades angolanas não trazem explicação por que é que as pessoas morreram. Apenas pedem desculpa e entregam as ossadas dessas pessoas que já partiram.

O terceiro ponto que ele faz notar é sobre o Congresso do MPLA. O bispo repete aquilo que muitos já têm dito: que esse congresso do MPLP foi o início da descaraterização do partido no poder e aquilo que podemos também chamar de "o declínio" do MPLA. Descaracterização porque o MPLA perdeu a essência se compararmos os boreau ou comité centrais de partidos irmãos ou partidos nos quais se inspiram e que têm um comité central mais reduzido. O MPLA neste congresso traz um comité central com cerca de 700 membros numa estrutura irracional. O bispo chama igualmente a atenção para o facto de o Angola


DW África: A igreja católica, de forma geral, foi vista sempre como sendo próxima do MPLA. O pronunciamento de dom Zacarias Kamwenho é um sinal rutura ou deve ser visto como simples posicionamento de descontentamento individual?
JG: A mensagem do bispo é uma prova de que a igreja católica - e ele no plano pessoal - sente que houve recuos em Angola durante estes 20 anos mas também durante a governação do Presidente João Lorenço. O bispo sai, como uma autoridade moral, para mostrar o seu descontentamento, para fazer uma chamada de atenção lembrando que, a direção do MPLA, deve se comprometer com as suas promessas eleitorais e também respeitar o que diz a constituição angolana quanto aos deveres dos governantes.


DW África: A comunicação de uma referência como Kamwenho é a prova de que a "água já transbordou do copo" em Angola?
JG: Não diria que é uma rutura entre os bispos e o MPLA mas estamos numa fase em que muitos dirigentes do MPLA têm estado a fazer pronunciamentos de hostilização ou de rejeição à chamada de atenção que a igreja católica tem feito. E o que o bispo fez foi juntar a sua voz, prestando solidaridade na implementação de um Estado de direito e democrático, e mostrar que toda a igreja católica está unida em prol do povo angolano.