Luanda - Sumário: Pretende o Executivo por via do Decreto Presidencial n.º 11/22, que actualiza as Medidas de Prevenção e Controlo da Propagação do Corana Vírus, feito ao abrigo da alínea m) do artigo n.º 120.º e do n.º 4 do artigo 125 da CRA, constituir a obrigatoriedade dos estudantes com idade igual ou superior a 12 anos de exibirem certificado de vacinação ou equiparado, sob pena de não acederem ao seu estabelecimento de ensino, vid. alínea h) do artigo 8.º do sobredito diploma.

Fonte: Club-k.net


O conteúdo normativo do artigo em causa é totalmente INCONSTITUCIONAL, desde logo por optar por sancionar os filhos “crianças” (não entrada ao seu estabelecimento académico) devido a uma decisão dos pais, “encarregados de educação,” em não os submeter a vacinação contra a Covid-19.


Mais relevante, a referida norma proibitiva (não entrada na sala de aulas sem o certificado de vacina ou documento equiparado) viola vários direitos fundamentais da criança com dignidade constitucional, historicamente objectivados em vários instrumentos internacionais, a saber: o acesso ao ensino e o direito ao desenvolvimento integral e intelectual da personalidade, entre outros.


Nesta senda das inconstitucionalidades, a referida norma viola, igualmente, o dever constitucional prioritário do Estado de proteger os menores.


Ademais, também é absolutamente notório que pela via do mencionado Diploma, o Presidente da República limita um direito fundamental (o direito da criança ao ensino, vid. art.º 80.º da CRA) por Decreto, contrariamente ao estabelecido na Lei fundamental, uma vez que tais matérias são de exclusiva competência da Assembleia Nacional, vid. art.º 58.º da CRA.


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Eis de forma sucinta os fundamentos que justificam a INCONSTITUCIONALIDADE da referida norma proibitiva:


1. Sem necessidade de um exercício hermenêutico apurado, dos vários instrumentos jurídicos vigentes no nosso ordenamento relacionado com os direitos das crianças, (Constituição da República da Angola (CRA), art.º 80.º, entre outros; Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), que visa à proteção de crianças e adolescentes, ratificada por Angola em 1990; Declaração dos Direitos da Criança, proclamada pela Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas n.º 1386 (XIV), de 20 de Novembro de 1959, art.º 7.º, entre outros; Lei sobre a Protecção e Desenvolvimento Integral da Criança (Lei nº 25/12), entre outros, afigura-se inequívoco de que o acesso ao ensino é um direito fundamental da criança e com dignidade constitucional, impondo ao Estado, e não só, o dever prioritário de o promover e de o proteger.

2. Dito de outro modo, é um bem jurídico de elevadíssimo valor constitucional, cuja tutela deve ser o princípio norteador das decisões das entidades públicas, da sociedade, encarregados de educação, entre outros;
Ora,

3. Se de um lado é de reconhecer o esforço empreendido pelo Executivo angolano no sentido de proporcionar o direito à saúde (art.º 77.º da CRA), diante desta situação pandémica, por outro, as soluções implementadas pelo Estado obedecem ao princípio da constitucionalidade, de intangibilidade do núcleo fundamental dos direitos fundamentais e da legalidade;


4. No caso in concreto, é imediatamente perceptível de que o Executivo como meio de persuasão aos encarregados de educação para submeterem os filhos à “polémica” vacinação contra o Covid -19, decidiu sacrificar o direito da criança ao ensino, o que é de todo inadmissível e deve ser imediatamente corrigido.

5. O Executivo, na prática, sanciona os filhos pela decisão dos seus pais de não os vacinarem, ou seja, utiliza de forma prejudicial as crianças “impedindo-as de assistirem as aulas presencialmente “como meio para forçar os adultos à decidirem pela sua “vacinação”.


6. As crianças não devem ser vistas como meios para atingir os pais, pelo contrário, são os seres humanos que devem ser prioritariamente protegidos. Como refere Kant, a pessoa é um fim em si mesmo, e, por isso, não se pode utilizar o outro (criança ou adulto) como meio.


7. Impedir que o menor não vacinado tenha acesso presencial à sua sala de aulas, não é protegê-lo, mas sim castigá-lo;

8. E mais, as crianças em causa estão a ser sancionadas por uma decisão que não é sua, pois, os menores não tem capacidade de exercício para decidirem serem vacinados. De igual modo e por incrível que pareça, o Executivo decidiu sancionar um inimputável.

9. Sancionar um ser humano por acto de outrem e com o agravante de ser uma criança (sem capacidade de culpa) é um gravíssimo atentado aos pressupostos do direito sancionatório vigente em qualquer Estado de Direito e Democrático.

10. Até ao momento não vimos em nenhum país, o Executivo a trilhar este caminho absolutamente inconstitucional e consequentemente reprovável.

11. Por exemplo, no ordenamento jurídico brasileiro, obriga as escolas a pedir a caderneta de vacinação de alunos de até 18 anos, se os pais ou responsáveis se recusarem a apresentar o certificado de vacina, o Conselho Tutelar deve ser acionado. Mas isso não impede que crianças continuem a frequentar a sua escola. É solução que temos vistos em vários países, que declaram a vacinação obrigatória.

Isto dito e em jeito de conclusão, a norma que proíbe o acesso à escola aos menores por falta de vacina contra o covid ou documento equiparado é inconstitucional, sem sermos taxativos, pelos seguintes motivos:


1. Viola os pressupostos do nosso direito sancionatório, porquanto responsabiliza terceiro pelo acto de outrem, de igual modo, sanciona um inimputável sem quaisquer fundamentos juridicamente convincentes;


2. Viola o direito das crianças ao acesso ao Ensino;


3. Viola o dever prioritário do Estado de proteger as Criancas;


4. Viola o princípio da reserva da lei para limitar direitos fundamentais (art.º 58.º da CRA)

“Passar uma mensagem clara e directa para população de que a vacina salva vidas, é importante, é o melhor caminho para o sucesso da vacinação”